A maldição da convocação – 20/11/2023 – Sandro Macedo


Como o querido leitor e a querida leitora sabem, existem várias superstições, mandingas, pragas, maus-olhados e maldições no futebol brasileiro —e apenas umas dez delas não envolvem o Botafogo. Porém, uma delas, tão inexplicável quanto as outras, é pouco divulgada e ainda não foi alvo de mestrado ou pós-doutorado, quiçá de uma reportagem do Esporte Espetacular: a maldição da convocação para a seleção brasileira.

Reza a lenda que a tal maldição se propaga mais entre os brasileiros que atuam no país do que os que jogam no exterior. Pode perguntar para o seu pai ou sua avó, para o motorista de aplicativo ou para a pessoa da banca da feira, todo mundo tem uma história de um moço que jogava muito… até que foi convocado para a seleção.

Este escriba, que acredita em lendas urbanas, recorda de dois goleiros no fim dos anos 1980 que estavam entre os melhores do país na época: Acácio, do Vasco, e Zé Carlos, do Flamengo. Ambos de uma regularidade absurda, até que veio a convocação. Eles nem eram titulares, mas bastou usar a camisa da seleção e começaram a ocorrer um franguinho aqui, um peruzaço acolá, uma saída mal calculada aqui e acolá, e assim por diante. Coisinhas que, antes da convocação, nunca vi ou ouvi falar.

Na Copa de 1998, teve o conhecido caso do lateral são-paulino Zé Carlos, o único homem que cruzava bolas e imitava galos com a mesma desenvoltura. Zé Carlos explodiu para o futebol em menos de um ano e foi chamado para o Mundial. Chegou a ser titular contra a Holanda, na semifinal. Na volta, seu futebol subitamente caiu. Dizem que a imitação do galo também.

Na era Tite houve uma convocação para o goleiro Alex Muralha, à época, no Flamengo. Depois disso, teve gente que passou a chamá-lo apenas de Alex.

Agora, em plena era pré-Ancelotti-com-Diniz-do-Fluminense, temos Lucas Perri, do Botafogo (outro goleiro; seriam os goleiros mais suscetíveis à maldição?). Juntar goleiro + maldição + Botafogo é o que se chama no mundo pluvial acadêmico de tempestade perfeita, ou, no meio boleiro, zica braba.

Perri foi o melhor arqueiro do primeiro turno do Campeonato Brasileiro com folga. E, apesar de os torcedores se lembrarem mais dos gols de Pequeno Tico, muitas vitórias do Putfire de John Textor vieram graças às intervenções de Perri.

No entanto, foi só o professor Diniz convocá-lo e a maldição o encontrou. Seu crédito zerou. Depois da camisa da seleção, Perri errou no gol sofrido que decretou a derrota para o Cuiabá, tomou quatro gols do Palmeiras e mais quatro do Grêmio —quando foi vaiado pela torcida. Nas duas viradas, ele não falhou, mas as defesas incríveis de antes sumiram. E por que o Botafogo tomou tantos gols? Bem, não sabemos. Mas além de Perri, Diniz convocou um zagueiro do alvinegro, o intrépido Adryelson. Com um goleiro e um zagueiro convocados, obviamente algo daria errado. Não é matemática, é maldição.

E o Botafogo não foi a única vítima da maldição da convocação neste ano. Ainda no início de 2023, o professor Ramon convocou Yuri Alberto, do Corinthians. Vamos repetir: Yuri Alberto, do Corinthians, foi convocado para a seleção brasileira neste ano.

Também teve o atacante Rony, do Palmeiras, que antes fazia gol de bicicleta, triciclo e carreta. Depois da seleção, os gols minguaram e ele foi parar na reserva. E quando você vai para a reserva de um ataque que tem Breno Lopes como titular, significa.

Os palmeirenses supersticiosos agora devem ficar preocupados com a convocação de Endrick, principal nome da ressurreição alviverde no campeonato. No entanto, talvez a presença de Endrick na seleção seja o antídoto para Rony voltar a se destacar. Para se observar.

Um minuto de silêncio

Gostaríamos de pedir de antemão um minuto de silêncio pelo gramado do Maracanã, que terá três jogos em três dias: terça: Brasil x Argentina; quarta: Fluminense x São Paulo; quinta: Flamengo x Bragantino. Oremos.


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Folha de S.Paulo