O enterro de Joana da Paz, que combateu o tráfico de drogas na Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana, e levou à prisão de mais de 30 criminosos com registros que fazia do apartamento onde morava, foi para poucos – e bons amigos. Morta na quarta-feira de cinzas, em decorrência de um AVC, a alagoana de 97 anos foi sepultada na manhã deste domingo no cemitério do Campo Santo, em Salvador, onde vivia desde 2007, depois de entrar para o programa de proteção a testemunhas.
– Os porteiros do prédio e meus funcionários fizeram questão de ir. Ela tratava todo mundo com muito carinho. Perdê-la foi a maior tristeza da minha vida. Não fui criado pelos meus pais. Sempre que lembro, me emociono com o amor imenso que ela me deu – diz o empresário Paulo Bevilacqua, de 57 anos, filho adotivo de Joana.
Ele conta que guardará para sempre a última imagem de Joana, quando foi visitá-la, na terça de carnaval, no Hospital Geral do Estado (HGE), onde ela ficou internada por dez dias:
– Ela ela já não interagia mais, mas deixou cair uma lágrima quando me viu, sabia que ia acontecer – lembra Paulo, emocionado. – E, quando ela chegou ao hospital, no último dia 12, os médicos a perguntaram: “Você sabe quem é ele?” E ela disse: “É meu filho”.
O empresário também relata que, coincidentemente, a pessoa que foi enterrada na urna embaixo da dela se chamava Vitório da Paz : por 17 anos, Joana da Paz foi chamada de Dona Vitória, após entregar nas mãos da Polícia Civil fitas de vídeo com as imagens que levaram para a cadeia 34 criminosos (incluindo policiais militares acusados de receberem propina) e ter sua história relatada pelo jornalista Fábio Gusmão, então repórter do jornal Extra.
Paulo a conheceu em 2017, quando se mudou para o prédio onde ela morava, no bairro Dois de Julho, no Centro de Salvador. Logo, passou a receber de Jojô, como a chamava carinhosamente, pedaços de bolo e pacotes de biscoito. Foi na casa dela que encontrou abrigo e colo depois que se divorciou da então mulher, a esteticista Danielle Gomes.
– Ela foi a única pessoa que disse :”Meu filho, essa casa é sua, sinta-se em casa”. Minha relação com ela foi muito emblemática. Ela me fazia massagem quando eu chegava destruído do trabalho, sempre teve muito cuidado comigo. Foi embora um pedaço de mim.
Joana faria 98 anos no dia 15 de maio. Paulo lembra que ela vivia pedindo a ele para fazer as contas, já que havia nascido em 1925: por bem pouco, a alagoana não completou cem anos, como tanto desejava.
– Fiquei sentido por ela não ter conseguido realizar esse sonho. Mas fica o legado: ela me confessou que nunca tinha tido interesse em incriminar ninguém, mas se doía vendo crianças e jovens portando armas e usando drogas. Começou a fazer as gravações por indignação, as prisões foram uma consequência. Que a força e a coragem dela sirvam de exemplos – resume Paulo.
Fonte: Fonte: Jornal Extra