Quadrilha de agiotas fez ameaças a 200 vítimas nos últimos meses por meio de ligações e visitas; ouça os áudios


Nos últimos meses cerca de 200 pessoas foram vítimas da maior quadrilha de agiotas do Estado do Rio. É o que mostra a investigação 76ª DP (Niterói) que resultou na Operação Ábaco, que prendeu 33 pessoas até o fim da manhã desta quinta-feira. Os investigadores descobriram também que muitas delas chegaram a receber a visita dos criminosos e, inclusive, foram agredidas fisicamente em suas casas. Além disso, os agentes identificaram que o bando chegava a ligar para parentes e vizinhos das vítimas fazendo ameaças e cobrando as dívidas. Em muitos dos casos, as pessoas já tinham pago todo o montante do empréstimo ou nem haviam pego um valor com o grupo.

— Um grupo emprestava o dinheiro. Esse bando chamava o suposto devedor em um escritório e tentava a cobrança de forma amigável. Caso não tivesse sucesso, eles passam a cobrança para terceiros. Esse grupo era extremamente violento, truculento e praticava todo tipo de violência física e moral para conseguir a dívida — conta o delegado Luiz Henrique Marques, titular da 76ª DP, que continua:

— Eles faziam de tudo para a vítima pagar. Uma vítima que pegava R$ 1 mil tinha que pagar R$ 5 mil. Quando a pessoa chegava e falava que já tinha pago eles diziam: “Se pagou, pagou para a pessoa errada. Vai ter que pagar de novo”. Eles cobravam e exigiam. Esse bando transformava a vida dessas pessoas em inferno — destaca Marques.

Em áudios obtidos através de escutas autorizadas pela Justiça, um acusado — que ainda não foi identificado — faz ameaças para uma vítima e para a mãe dela. Em uma das ligações ele diz:

“Cara, eu vou te dar a última oportunidade. Vou te dar até segunda-feira para você me dar o meu dinheiro. Você vai ter sábado e domingo. Chegando na segunda-feira e você falar que não vai estar com o meu dinheiro vou achar que você vai estar me tirando como babaca”.

Documentos e aparelhos celulares apreendidos durante a operação da Polícia Civil contra grupo de agiotas
Documentos e aparelhos celulares apreendidos durante a operação da Polícia Civil contra grupo de agiotas Foto: Reprodução

Em um segundo áudio, o mesmo homem avisa que irá até a casa da sogra da vítima após ele demorar a pagar a suposta dívida. Em uma outra ligação o acusado fala que irá atrás da mulher e do filho da vítima. O criminoso ainda liga para a mãe do devedor cobrando o pagamento e faz novas ameaças.

Segundo a investigação, para não serem identificados, os suspeitos se comunicam por redes sociais com codinomes e em sequência destroem os aparelhos celulares. Guilherme Andrade Aguiar, de 39 anos, que é apontado pela Polícia Civil como o líder da organização criminosa, foi preso em Belo Horizonte, em Minas Gerais, por agentes da 76ª DP. Conhecido como Macarrão, o homem é dono de um quiosque na Praia de Camboinhas, região nobre de Niterói, na Região Metropolitana do Rio. Ele, segundo a Civil, era o responsável por dar ordens e comandar as extorsões. Mesmo de dentro da cadeia, a polícia afirma que ele continuou à frente do esquema.

O inquérito aponta que a quadrilha era bastante estruturada. Eles usavam contas de laranjas para lavar o dinheiro. O grupo acabou se espalhando por várias regiões do país e, ao todo, foram abertos 70 escritórios em estados como Ceará, Santa Catarina, Espírito Santo e Minas Gerais para empréstimo de dinheiro com juros altíssimos.

— Muitas pessoas emprestavam as contas bancárias para guardar dinheiro desse bando. Inclusive, várias mulheres. Com base do Coaf (Controle de Atividades Financeiras) identificamos muitas movimentações atípicas. Em quatro anos eles movimentaram aproximadamente R$ 70 milhões — destacou o delegado.

Entre os presos de hoje, Ricardo Alexandre Inaco foi encontrado em Santa Catarina e Bruno da Silva Pinheiro foi preso em Juazeiro do Norte, no Ceará. Ambos fazem parte do grupo. Em Niterói, no estado do Rio, Marcelo Grola da Silva foi preso. Ele, segundo os investigadores, seria o operador do esquema.

A Operação Ábaco tem como objetivo cumprir 65 mandados de prisão e 63 de busca e apreensão.

Mais empréstimos durante a pandemia

Segundo o delegado Luiz Henrique Marques, titular da 76ª DP, em 2020 aumentou o número de pessoas que pegaram empréstimos a juros. Com isso, muitas delas caíram no golpe dos agiotas.

— Evidências apontam que na pandemia as pessoas tiveram dificuldades e pediram mais empréstimos para esse grupo. A investigação começou sem a presença de vítimas. Fizemos pesquisas de ROs (registros e ocorrência) e chamamos essas vítimas, que narraram histórico de terror. (Neste momento) A fase da investigação não alcançou os escritos de agiotagem. Nosso objetivo foi os cobradores. Esse grupo agia em toda a cidade do Rio e na Região Metropolitana.

O policial faz um alerta para quem precisa de dinheiro e contrata empresas de empréstimos:

— Você tem que observar se o escritório é legal, se a taxa de juros é acessível e o tipo de cobrança. A violência da cobrança e os juros abusivos são evidências de agiotagem.

Sobre as pessoas que emprestavam as contas, usadas no esquema para lavagem de dinheiro, o delegado destaca:

— As pessoas que cediam as contas eram elementos fundamentais para a organização existir. Por isso, eles vão responder pelos mesmos crimes e no julgamento o juiz vai ponderar suas penas.



Fonte: Fonte: Jornal Extra