Policiais presos por MP usavam informantes para armar flagrantes e cobrar propina de bandidos

Os policiais militares denunciados pelo Ministério Público do Rio e alvos da Operação Mercenários faziam uso de informantes para obter vantagens indevidas por meio de acertos de propina com criminosos, muitas vezes por flagrantes armados. De acordo com a denúncia do Ministério Público estadual, a organização extorquia dinheiro de traficantes e comerciantes, cometia homicídios e até torturas. Num dos diálogos, um integrante do grupo identificado como Thiaguinho explica o esquema: “Eu ligo para ele, o cara vem e entrega (as drogas). Aí a gente armou uma campana para ele aqui, foi e pegamos ele. Ele acabou de me entregar, aí saiu de moto. Aí os caras foram e agarraram ele, entendeu? Aí começou a desenrolar. Aí primeiro pintou três mil, aí depois chegou até os sete”, detalhou.

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Num outro momento, a denúncia cita mais um informante, chamado pelo grupo de Claudio Kalunga. Era dele a responsabilidade de fazer contato com militares do 24º BPM (Queimados), na Baixada Fluminense, combinando com eles de se dirigir a pontos de venda de drogas e se passar por usuário. Na sequência, Kalunga repassaria as informações aos policiais recebendo, em contrapartida, dinheiro, drogas e outros materiais apreendidos com os criminosos, como telefones celulares, por exemplo.

Além disso, foi constatado que, no 21º BPM (São João de Meriti), também na Baixada, quatro policiais denunciados recrutaram outros militares da ativa que, além de oferecem informações sobre os criminosos locais que poderiam ser vítimas do bando, também estimulavam os demais a praticarem os crimes de corrupção, extorsão, tortura e homicídio. Nesse grupo participavam os sargentos Adelmo da Silva Guerrini Fernandes; Mário Paiva Saraiva, o Marinho; Denilson de Araújo Sardinha, o Sardinha; e o subtenente Antônio Carlos dos Santos Alves, o Santinho.

Adelmo, que era considerado braço direito do ex-comandante do 21º BPM, tenente -coronel André Araújo Oliveira, teve uma conversa interceptada onde diz para outro colega de farda que o oficial “quer caixão”, o que é interpretado pelos promotores como um passe-livre para que os seus subordinados matem criminosos indiscriminadamente.

A denúncia traz ainda o momento em que o grupo busca um novo informante, um policial militar lotado no Comando de Polícia Ambiental (Cpam) e morador local de São João de Meriti. Coube a Sardinha ter a conversa com ele. O diálogo traz: “O moleque me passou uma porrada de parada. O moleque, além de morar na área ali do Parque Araruama, ele mora mais para o lado da Caixa D’água. Além dele morar ali, conhecer bem a área em relação a tráfico, ele conhece bem sobre quem está na sacanagem no Parque Analândia, Favelinha. O moleque tem várias direções para ir ali. Aí vai me passar tudo que ele tem que perde para eles, vai me passar tudo para a gente ir lá fazer uma visita, entendeu? (…) para mostrar as direções, onde pega, onde não pega. Tudo que ele conhece ele vai passar”.

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Até o fim da noite de quinta-feira, nove dos 11 policiais militares, cujos mandados de prisão foram expedidos pela Auditoria Militar, estavam detidos. Todos foram levados para o Batalhão Especial Prisional (BEP). O então comandante do 15º BPM, tenente-coronel André Araújo, foi exonerado do cargo. Ele e o capitão da P2 (serviço reservado) da unidade, Anderson dos Santos Orrico, foram alvos de mandados de busca e apreensão em suas casas e em seus gabinetes no quartel. Na residência e na sala de Orrico, o MP e a Corregedoria da Polícia Militar apreenderam cerca de R$ 135 mil. O oficial passou a noite de quinta-feira depondo na 1ª Delegacia de Polícia Judiciária da PM, no Méier.

Tenente-coronel André Araújo de Oliveira, comandante do 15º BPM (Duque de Caxias), é um dos alvos da operação
Tenente-coronel André Araújo de Oliveira, comandante do 15º BPM (Duque de Caxias), é um dos alvos da operação Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

De acordo com a corporação, Anderson Orrico foi preso pela corregedoria por conta dos valores em espécie encontrados no batalhão de Duque de Caxias.

A PM ainda não respondeu se os dois policiais foragidos foram presos.

Denúncia aponta propina de R$ 1 milhão

Em abril de 2020, segundo a denúncia, Adelmo mandou mensagem para um policial militar lotado na UPP do Chapéu Mangueira e Babilônia perguntando se ele saberia informar o nome do “dono” das comunidades Cantagalo-Pavão-Pavãozinho. O PM diz que sim e envia fotos do traficante. No dia seguinte, é perguntado a Adelmo se “deu bom” e ele diz que deu “bom demais”. Os promotores apontam que o grupo e policiais civis conseguiram a quantia de R$ 1 milhão, já que nessa ocasião Adelmo mandou, no aplicativo de mensagens, o número 1 seguido do desenho de um milho.

Policiais que tiveram prisão decretada na Operação Mercenários
Policiais que tiveram prisão decretada na Operação Mercenários Foto: Reprodução

Além de informantes, os policiais contavam com intermediários que faziam a arrecadação da propina junto a criminosos e comerciantes acharcados pela organização. As conversas aconteciam também num grupo de WhatsApp chamado de Mercenários — daí o nome da operação do Ministério Público.

Segundo o MP, nos endereços ligados aos denunciados foram apreendidos armas de fogo, carregadores, munições calibres 556 e 762, supressor de ruídos, granadas, canivete, camisas da Polícia Civil, balaclava, bloqueador de sinal, rádios transmissores, e comprimidos de entorpecente.

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Fonte: Fonte: Jornal Extra