PM que se destaca em operações é acusado de ajudar milícia de Magé


O soldado André Ribeiro Lopes do Nascimento é um dos policiais do batalhão de Magé, na Baixada Fluminense, mais atuantes em operações contra o tráfico. Morador da cidade e filho de um ex-vereador que também integrou a tropa, ele acumula prisões de traficantes, denúncias de truculência e uma série de mortes em incursões em favelas em seu currículo. Mas, segundo o Ministério Público do Rio (MPRJ), tamanha disposição não se deve a um forte senso de justiça: Lopes seria uma espécie de agente duplo, pois também estaria a serviço de uma milícia que tenta dominar comunidades.

Em um processo no qual o soldado é réu por suposta participação na milícia conhecida como Família Suruí, denunciantes apontam uma estreita relação entre ele e o chefe do grupo, André Cosme da Costa Franco, o Careca. Num depoimento à Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), um morador de Magé contou ter visto o PM ajudar o paramilitar a matar um traficante, em 2019.

Dominado: milícia influencia operações de batalhões da PM contra o tráfico em várias cidades do Rio

Segundo o relato da testemunha, que estava trabalhando na região e viu a cena, Lopes e Careca chegaram juntos ao local do crime. Na ocasião, o miliciano, que usava uma farda da PM, “abriu a porta do veículo, levantou sua toca ninja, mostrando o rosto” e executou a vítima com tiros de escopeta, segundo o depoimento. Um amigo da vítima, ainda de acordo com o relato, foi espancado pelo PM, mas teve a vida poupada.

Um outro denunciante disse à DHBF que Lopes se utiliza de sua farda para facilitar uma série de crimes da milícia, como “torturas, homicídios, venda de cigarros contrabandeados e furtos de combustível de dutos da Petrobras”. Segundo o depoimento, o PM também atua na venda de armas apreendidas em operações.

Lopes foi um dos 16 alvos de uma operação da Polícia Civil contra a milícia, em novembro do ano passado. Careca foi preso; já o PM responde ao processo em liberdade. O pai dele, o sargento reformado André Antônio Lopes do Nascimento — que, na época, era vereador e candidato a prefeito de Magé —, foi alvo de um mandado de busca e apreensão no dia da ação e é investigado por envolvimento com a quadrilha.

Sargento Lopes, pai do soldado e ex-vereador, teve o celular apreendido na operação
Sargento Lopes, pai do soldado e ex-vereador, teve o celular apreendido na operação Foto: Reprodução

O inquérito da DHBF aponta uma infiltração da milícia no 34º BPM (Magé). Depoimentos de testemunhas citam que Careca viajava fardado em viaturas e participava de blitzes. Ligações telefônicas grampeadas com autorização da Justiça revelam que ele era convidado a participar de operações. “Vamos no carro à paisana”, disse um policial ao miliciano em setembro de 2019, após Careca passar nomes, características físicas e localização exata de traficantes a uma patrulha.

Laudo contraria relato

Uma das ocorrências policiais em que Lopes teve atuação posta sob suspeita foi registrada em dezembro de 2016 no bairro Parque Estrela, vizinho a uma área dominada por milicianos. Na ocasião, o soldado e um colega atiraram em dois homens numa mata, na qual alegaram que houve um confronto. Um deles morreu, e seu laudo cadavérico contrariou a alegação dos agentes.

Uma bala atingiu o corpo da esquerda para direita; uma outra o acertou de baixo para cima, entrando nas nádegas e saindo pelas costas. “Nessa trajetória, está claro que a vítima já estava caída ao solo quando foi atingida pelo segundo disparo, havendo fortes indícios de que houve, no mínimo, excesso na ação policial”, alegou a Defensoria Pública no processo ao qual o sobrevivente respondeu por suposto ataque contra os policiais. Ele foi absolvido. Durante a audiência no Tribunal do Júri de Magé, no ano passado, Lopes afirmou que não há mais tráfico de drogas no bairro: “A paz reina no local”, disse.

Em nota, a Polícia Militar informou que Lopes segue lotado no 34º BPM, mas só realiza atividades internas. De acordo com a corporação, sua atuação é alvo de “procedimentos apuratórios internos” do batalhão. O EXTRA tentou contato com a defesa do soldado, sem sucesso.



Fonte: Fonte: Jornal Extra