Milícia de Zinho usa bancos de dados do governo do estado para planejar ataques e homicídios contra desafetos, afirma MP

A milícia chefiada por Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho, irmão do paramilitar Wellington da Silva Braga, o Ecko, morto em operação policial em junho do ano passado, usa bancos de dados oficiais do Rio para levantar informações de desafetos e planejar homicídios, além de extorquir dinheiro de comerciantes e moradores da Zona Oeste do Rio e da Baixada Fluminense. A informação é do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), órgão subordinado ao Ministério Público do Rio (MPRJ), após uma operação contra a maior milícia do estado nesta quinta-feira (25). Oito suspeitos de integrar a milícia foram presos, entre eles um homem apontado como contador dos negócios dos paramilitares.

Herdeiro do crime: Saiba quem é Zinho, que passou da contabilidade ao comando da maior milícia do Rio

‘Caveirão’ da milícia: Polícia investiga origem do veículo usado por criminosos em invasões; vídeo

Conversas extraídas de um aplicativo de telefone do miliciano Rodrigo dos Santos, conhecido como Latrell, preso em março deste ano, apontam que o grupo de Zinho usa dados oriundos de bancos de dados da Secretaria de Administração Penitenciária e das Policiais Militar e Civil, além de outros órgãos do estado para obter informações privilegiadas e, posteriormente, planejar seus crimes, afirma a promotora Roberta Dias Laplace, subcoordenadora do Gaeco.

— Eles têm acesso a informação privilegiada por conta dos agentes que eles corrompem, têm acesso a bancos de dados oficiais, dos bancos de dados vendidos por aí ilegalmente e também têm acesso a fotografias de bancos oficiais — diz a promotora.

Veja fotos: Policia Federal faz operação contra milícia

Arsenal: Fuzis, escopetas e espingarda: Armas apreendidas com milícia ligada a Tandera têm valor estimado de R$ 1,3 milhão

Para dar um exemplo, a promotora citou um episódio em que o grupo de Zinho recebeu a foto de um traficante da maior facção criminosa do estado e que constava apenas no banco de dados da Seap. Além disso, para municiar ainda mais de dados de seus desafetos, os paramilitares também assinavam, de acordo com a promotora, bancos de dados privados:

— Essa é a prova cabal que eles têm acesso a informações que só estão nos bancos de dados oficiais.

Luiz Antônio da Silva Braga, o Zinho, é empresário e irmão de Ecko, líder da milícia
Luiz Antônio da Silva Braga, o Zinho, é empresário e irmão de Ecko, líder da milícia Foto: Divulgação

Motivação investigada: MP apura se Jerominho foi morto por tentar expandir e retomar seus domínios na Zona Oeste do Rio

Procurado, o governo do estado não rebateu as afirmações do MP. Em nota, a PM afirmou que “todas as denúncias envolvendo policiais militares são devidamente apuradas quando chegam ao conhecimento da Corregedoria Geral da Corporação”.

A instituição lembrou que criou a 8ª Delegacia de Polícia Judiciária Militar (DPJM) “justamente para conduzir inquéritos relacionados a narcomilícias, reforçando o apoio a outras instituições, entre as quais o Ministério Público e a Polícia Civil”.

A Polícia Civil não respondeu sobre as afirmações que seus bancos de dados são usados ilegalmente pelos milicianos. A secretaria só apresentou números de prisões. De acordo com o órgão, “nos últimos dois anos, a Polícia Civil prendeu mais de 1.200 milicianos, inclusive, os três maiores líderes deste tipo de organização criminosa, dando prejuízo de cerca de R$ 2,5 bilhões para às milícias”.

Números da violência: Homicídios em confronto com a polícia aumentaram 40% em julho, após operação com 18 mortes no Alemão

Já a Secretaria de Administração Penitenciária informou que “outras instituições têm acesso ao Sistema de Identificação Penitenciária (Sipen)”.

‘Propina aos baldes’

Ainda de acordo com as investigações, a prática de se levantar fichas criminais, endereço e outras informações que pudessem ajudar nos planos de homicídio e extorsão é uma rotina do grupo paramilitar.

– (Existe) corrupção de agentes da força de segurança. Havia pagamento de propina aos baldes. Eles pagam para dezenas de agentes públicos – afirma Roberta Laplace.

O Gaeco afirma que, de acordo com as trocas de mensagens encontradas nos celulares de Latrell, existe um fluxo de pagamento de propina muito grande para agentes de diversos órgãos, como policiais de batalhões de áreas dominadas pela milícia de Zinho.

10 dias depois de liberdade: Desembargador suspende prisão domiciliar do traficante Isaías do Borel; ‘inadmissível’, escreve na decisão

Ainda de acordo com promotoria, alguns dos homens da milícia comandam ações de dentro da cadeia. É o caso de Latrell. Apesar de a investigação indicar participação de agentes de segurança, Laplace afirmou que o fato de a operação de ontem ter sido deflagrada pela Polícia Federal não tem relação com o fato de uma desconfiança de agentes das Polícias Civil e Militar.

– Foi uma questão de oportunidade e conveniência – salientou a promotora que destacou o excesso de trabalho e falta de estrutura das polícias fluminense, um fator que contribuiu para a Polícia Federal atuar no caso, já que o órgão tem menos casos para lidar ao mesmo tempo.

Estelionato via mensagem: Rio tem um registro de golpe a cada quatro minutos; números de 2022 já superam todo o ano passado

Zinho ‘altamente blindado’, diz promotora

Roberta afirmou que o atual chefe da milícia “é altamente blindado” e nenhuma morte de gente poderosa acontece sem a anuência do paramilitar.

– Ele delega a organização a quatro ou cinco pessoas da organização criminosa. Um deles é o Matheus, que está foragido, sobrinho dele – disse a promotora, que destacou: – Nada de grave é feito sem a anuência do Zinho. É uma matança danada. Mas quando vai se matar alguém relevante, pedem a autorização do irmão, do amigo, do chefe.

Fonte: Fonte: Jornal Extra