Baixada Fluminense concentra 2/3 dos homicídios de políticos do Rio


Em pouco mais de sete meses, a Câmara de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, viu três de seus 29 membros serem vítimas de homicídios na cidade. Os três casos — o último ocorrido na manhã desta quarta-feira, quando Alexsandro Silva Faria, o Sandro do Sindicato (Solidariedade), foi executado a tiros de fuzil dentro da van que dirigia — ajudam a colocar a região à frente no ranking de assassinatos políticos no Rio. Antes, já haviam sido mortos Joaquim José Santos Alexandre, o Quinzé (PL), em setembro, e Danilo Francisco da Silva, o Danilo do Mercado (MDB), morto na companhia do filho no dia 10 de março.

Sandro do Sindicato foi morto a tiros em Duque de Caxias, onde era vereador
Sandro do Sindicato foi morto a tiros em Duque de Caxias, onde era vereador Foto: TV Câmara / Reprodução

Um levantamento feito pelo Observatório da Violência Política e Eleitoral, vinculado à UniRio, aponta que o estado foi palco, desde o início do ano passado, de 19 crimes do gênero contra candidatos, parlamentares e funcionários de gabinetes. Desses, praticamente dois terços (12) ocorreram na Baixada.

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Com outros dois casos na lista, Duque de Caxias soma, segundo a pesquisa, cinco mortes de políticos a partir de janeiro de 2020. Nova Iguaçu, também na Baixada, é o único município que também aparece com mais de um homicídio na lista: foram três.

— O Rio, de modo geral, e sobretudo a Baixada Fluminense, é um local em que houve uma mistura enorme entre o crime organizado e a política. Milícia, tráfico, jogo do bicho, os grupos de extermínio em especial na Baixada… Todos muito fortes e se embrenhando nesse universo. Então, não é apenas uma disputa política, é algo que quase sempre envolve outros interesses — explica o cientista político Felipe Borba, professor da UniRio, que continua: — A maior parte desses crimes envolve cargos locais. Tem a ver com ter o controle da cidade, do bairro, da região, o que naturalmente favorece os negócios ilegais.

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De acordo com o Observatório, além dos três parlamentares, também foram mortos em Caxias dois pré-candidatos a vereador entre fevereiro e maio do ano passado: Aerton Santos de Araújo e Valnir Borges. Em Nova Iguaçu, os homicídios tiveram como alvo dois candidatos a vereador já em outubro, às vésperas da eleição (Mauro Miranda da Rocha e Domingos Barbosa Cabral, o Domingão), além de um ex-policial militar que já havia sido candidato ao mesmo cargo no passado: Altino Glaucio Ramos Dias, conhecido como Tilt, acusado de formação de quadrilha armada, tráfico de drogas, homicídio, tortura e sequestro.

A lista de execuções na Baixada Fluminense tem ainda: Ubirajara Moraes Pereira (pré-candidato a vereador, em São João de Meriti); Sandra Silva da Ferreira, a única mulher da relação (pré-candidata a vereadora, em Magé); Carlos Alexandre de Castro Oliveira, o Ling, que concorreu duas vezes a vereador em Japeri; e Jorge Luiz Pereira, o Jorginho Ibiza, que disputou as eleições do ano passado pleiteando o mesmo posto, em Nilópolis, mas não se elegeu.

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Na Região Metropolitana, foram mortos Anderson Pinto Lourenço, assessor parlamentar de um vereador da capital, e Joelson Leonel Bravo do Nazaré, o Minigel, que candidatou-se sem sucesso a vereador em São Gonçalo, em 2020. Há, por fim, cinco casos no interior: Leonardo Pinheiro, pré-candidato a vereador em Araruama; Carlos Roberto Rocha Ritter, pré-candidato a vereador em Campos dos Goytacazes; Valmir Tenório. que já havia disputado eleições em Paraty; Antônio Nunes de Azeredo, candidato por mais de uma ocasião em São Francisco de Itabapoana; e Siderlei de Araújo Arcanjo, ex-candidato a vereador em Volta Redonda.

Clima de pânico

A sequência de crimes contra parlamentares em exercício de mandato trouxe um clima de pânico à Câmara de Duque de Caxias. O presidente da Casa, Celso do Alba (MDB), anunciou que estuda a “possibilidade jurídica” de disponibilizar veículos blindados para todos os vereadores. Segundo Celso, vários políticos vêm recebendo ameças anônimas.

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Na tarde desta quarta-feira, vereadores do município participaram de uma reunião a portas fechadas com o comandante do 15º BPM (Duque de Caxias), coronel Alessandro Oliveira Viana. Além da conversa com oficial da PM, os parlamentares cobram informações sobre as investigações da Polícia Civil.

— São três crimes. A DHBF (Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense) até agora não tem elucidação nem do primeiro, nem do segundo — criticou Celso do Alba, que solicitou um encontro com o governador Cláudio Castro para tratar do assunto.

Celso do Alba (MDB) cumprimenta o comandante do 15º BPM (Duque de Caxias), coronel Alessandro Oliveira Viana
Celso do Alba (MDB) cumprimenta o comandante do 15º BPM (Duque de Caxias), coronel Alessandro Oliveira Viana Foto: Gabriel de Paiva

A Polícia Civil informou, por nota, que possui “uma linha de investigação” para a morte de Danilo do Mercado e realizou “diversas diligências sobre o caso”. Segundo a DHBF, o vereador era alvo de inquéritos por ligação com assassinatos e por integrar uma milícia.

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Já a respeito da execução do ex-PM Quinzé, “que possuía anotações criminais por receptação e porte de arma de fogo fria”, a especializada afirmou que “as linhas de investigação têm relação com atividades criminosas”. Sandro do Sindicato, por sua vez, não tinha passagens pela polícia nem respondia a processos na Justiça. “As primeiras diligências foram realizadas, o caso está sendo investigado e no momento certo a DHBF apresentará mais informações”, limitou-se a dizer a Civil.

Sonho de ser vereador

Alexsandro tinha 42 anos e estava no primeiro mandato, depois de tentar três vezes uma vaga na Câmara da cidade. Diretor do SITICOMMM-Caxias (Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil, Montagem Industrial, Mobiliário, Mármore e Granito e do Vime de Duque de Caxias), ele transportou a atuação junto à categoria para o nome de urna: Sandro do Sindicato.

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A alcunha rendeu 3.247 votos nas eleições de 2020, o suficiente para que ele se elegesse pelo quociente eleitoral. Mais de dois terços da votação vieram da zona eleitoral de bairros como Vila Rosario, Parque Fluminense e Pilar, o mesmo onde ele acabou assassinado.

De acordo com o presidente da Câmara, Celso do Alba, Sandro vinha relatando, antes das sessões, “algum desconforto em relação à segurança”. Parentes do parlamentar, contudo, afirmam que ele não compartilhou nenhum tipo de ameaça ou temor com a família.

— Ele sempre desejou ser vereador, e as pessoas no bairro achavam que ele não teria condições. Primeiro pela cor da pele, pela condição financeira. Ele realizou o sonho dele. Acredito que morreu feliz — conta Marcos Silva Faria, de 39 anos, irmão do vereador.

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Sandro, que era evangélico, vinha cogitando deixar as atividades políticas e sindicais para dedicar-se à Igreja Ministério Apostólico Adonay. O legado nos dois campos ficaria para o filho, Alexsandro Júnior, de 26 anos:

— Uma semana atrás, ele me mandou mensagem perguntando: “Filho, você está preparado para ficar no meu lugar?” — lembra o primogênito do vereador.

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O parlamentar era casado e deixou seis filhos. Ele será enterrado nesta quinta-feira, no Cemitério do Pilar. Na Câmara, ele foi substituído pelo suplente Alex Freitas (Solidariedade), enquanto Elson da Batata ocupou o lugar de Quinzé. Já a vaga de Danilo do Mercado foi preenchida por Fernanda da Costa, filha do traficante Fernandinho Beira-Mar.

Alexsandro Júnior, filho do vereador assassinado
Alexsandro Júnior, filho do vereador assassinado Foto: Gabriel de Paiva



Fonte: Fonte: Jornal Extra