Antes de soltar preso com alvará falso, advogada tentou enganar juízes em processo


A advogada Débora Albernaz de Souza, presa nessa terça-feira suspeita de integrar uma quadrilha que libertava presos com alvarás de soltura falsos, tentou enganar também juízes da Vara de Execuções Penais (VEP) do Rio. O EXTRA localizou uma petição de Débora, de 26 de agosto do ano passado, na qual foram fornecidas informações falsas no processo de Execução Penal de João Victor da Silva Roza, conhecido como Negão.

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No documento, a advogada informa à VEP que João Victor havia conseguido uma decisão favorável em um recurso no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, tendo sua pena reduzida, o que não era verdade. Para tentar embasar a fraude, ela anexou um documento sem qualquer valor legal.

Com base na falsa redução da condenação e em remições de pena – diminuição da pena por leitura, trabalho ou estudo – Débora pediu à VEP que seu cliente fosse beneficiado com prisão domiciliar.

No dia 4 de setembro, a promotora de Justiça Simone Gomes de Souza solicitou à vara que a advogada apresentasse os comprovantes de remição e também a íntegra da decisão que supostamente teria beneficiado João Victor.

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No dia 3 de outubro, a advogada solicitou que o seu pedido fosse julgado com urgência, mas não apresentou os documentos citados pelo MP. Quatro dias depois, em 7 de outubro, Débora anexou ao processo certidões de julgamento que não comprovavam o suposto julgamento favorável ao seu cliente. As planilhas de remição de pena não foram anexadas.

Em uma petição, Débora informou ao juízo que havia juntado ao processo o acórdão, conforme solicitado pelo MP, o que não havia ocorrido. Depois disso, a advogada entrou com várias petições pedindo mais uma vez o julgamento do pedido de prisão domiciliar. A última delas foi no dia 9 de outubro.

Sem ter o pedido apreciado pela VEP, o grupo teria partido para outra estratégia. No dia 14 de outubro, João Victor deixou a penitenciária Vicente Piragibe, no Complexo de Gericinó, com um alvará de soltura falso. De acordo com a investigação da Polícia Civil do Rio, que contou com apoio da Secretaria de Administração Penitenciária, a quadrilha integrada por Débora foi reponsável por produzir o alvará.

Informações falsas

No dia 29 de outubro, ainda sem ter sido informada de que João Victor havia sido solto, a juíza Ana Paula Abreu Filgueiras, da VEP, determinou que os funcionários de seu próprio gabinete buscassem a íntegra do acórdão mencionado pela advogada de João Victor. Ela também determinou a solicitação das planilhas de remição.

No dia 6 de novembro, foram anexados ao processo os documentos relativos ao recurso de Apelação de João Victor na Justiça Federal, que foi negado, diferentemente do que havia sido informado pela advogada. No mesmo dia, foi informado no processo que o preso havia sido solto após conseguir um suposto habeas corpus.

Diante da informação da soltura de João Victor, a juíza determinou que sua defesa e o MP se manifestassem. A advogada Débora Albernaz alegou, em uma petição, que o habeas corpus no qual o cliente havia sido beneficiado não tinha sido impetrado por ela. Já o MP informou apenas estar ciente da decisão.

No dia 10 de fevereiro, após a divulgação de matéria pela TV GLOBO, denunciando que João Victor havia sido libertado com um alvará falso, a promotora Simone Gomes solicitou que medidas fossem tomadas.

Foto: Divulgação

No mesmo dia, o antigo advogado de João Victor, Flávio Crelier, também solicitou à VEP sua exclusão do processo, uma vez que desde julho de 2020 quem vinha atuando na ação era Débora Albernaz. Na petição, Crelier pede ainda que o grupo de advogados – incluindo Débora – assumisse responsabilidade pelos atos processuais praticados.

– Diante do tumulto criado no processo e da divulgação das notícias pela mídia, solicitei que meu nome fosse retirado do processo, o que foi deferido pela magistrada – explicou o advogado ao EXTRA, que também renunciou no processo respondido por João Victor na Justiça Federal.

Como revelado nessa terça-feira pelo EXTRA, uma procuração anexada ao processo em julho do ano passado habilitava Débora e o falso advogado e ex-detento Arlésio Luiz Pereira Santos no processo. Arlésio utilizou um número de OAB do Distrito Federal que é inexistente, conforme consulta no site do Conselho Federal da ordem dos advogados.

João Victor é acusado de integrar uma quadrilha de tráfico de armas de João Filipe Cordeiro Barbieri, enteado de Frederick Barbieiri, conhecido como Senhor das Armas. João Felipe também deixou a cadeia com alvará falso, em novembro do ano passado.

As investigações iniciadas após a denúncia feita pela TV GLOBO revelaram ainda que uma terceira pessoa – a presa Gilmara Monique Amorim – também foi solta com alvará falso. Um cruzamento de informações feito pelos investigadores revelou que a conexão entre os três presos era a advogada Débora Albernaz.

Também foram acusados de fazer parte da organização criminosa o ex-detento e falso advogado Arlésio, sua esposa, Josefa Antônio da Silva, a advogada Angélica Coutinho Rodrigues Malaquias Campos e o agente penitenciário Fabio Luís da Silva Polidoro. Todos foram presos nessa terça-feira. Gilmara se entregou à polícia na última semana. Já João Victor e João Filipe estão foragidos. O Disque-Denúncia oferece recompensa de R$ 2 mil por informações sobre ambos.



Fonte: Fonte: Jornal Extra