Adriano da Nóbrega recrutou tropa de ex-PMs para proteger sua família


O ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, apontado como um dos maiores matadores de aluguel do Rio, recrutou uma tropa de agentes egressos das fileiras da Polícia Militar para garantir sua segurança e a da sua família. Uma investigação do Ministério Público e da Polícia Civil identificou três ex-PMs que trabalhavam como guarda-costas do miliciano e de suas irmãs. Outros dois PMs da ativa que garantiam a segurança da família também foram identificados — ambos, no entanto, morreram durante a investigação.

Os ex-PMs que trabalhavam para o miliciano têm trajetórias parecidas com a do próprio Adriano, ex-capitão da PM expulso da corporação em 2014 após ser acusado de trabalhar como segurança para uma família de bicheiros. Após serem excluídos da PM após cometerem crimes, todos caíram no submundo, usando o que aprenderam na corporação para proteger um criminoso foragido da Justiça.

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Os laços dos agentes com o chefe do Escritório do Crime, maior quadrilha de matadores de aluguel do Rio, foram descobertos graças a ligações telefônicas interceptadas com autorização da Justiça entre junho de 2019 e fevereiro de 2020 — quando Adriano foi morto durante uma operação policial na Bahia. Durante a deflagração da Operação Gárgula — que prendeu, na semana passada, comparsas que passaram a controlar os bens de Adriano após sua morte — o MP e a polícia cumpriram mandados de busca e apreensão em endereços ligados a todos eles. Atualmente, os seguranças são alvo de uma nova investigação.

Um deles é Valdemi Gomes Júnior, o Cabeça, apontado pelo MP como “uma espécie de ‘faz tudo’ de Adriano e sua família, sendo seu homem de confiança”. Cabeça foi expulso da PM após ser condenado, em 2006, a 19 anos de prisão por um homicídio cometido em serviço. O crime aconteceu em julho de 2001, em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio. Segundo a investigação, dois homens foram sequestrados pela patrulha integrada por Cabeça durante uma abordagem policial. Uma arma foi encontrada no carro, e os PMs tentaram negociar R$ 500 para que a dupla fosse liberada. Como os dois não tinham o valor, foram levados a um outro ponto, onde os agentes planejavam matá-los.

Capitão Adriano foi morto durante operação da PM da Bahia
Capitão Adriano foi morto durante operação da PM da Bahia

Segundo a investigação, Cabeça foi o responsável pelos disparos que mataram Marcos Vinicius Gomes Chaves de Oliveira, um dos jovens capturados. O outro jovem, Marcelo Coelho da Cruz, conseguiu fugir em meio aos disparos. Cruz, no entanto, desapareceu meses depois após ser sequestrado a caminho do Fórum de Jacarepaguá para uma audiência do processo a que os PMs respondiam.

Dois celulares de Cabeça foram interceptados durante a investigação. O ex-PM foi flagrado em conversas com as duas irmãs de Adriano. Numa delas, em junho de 2019, ele chegou a afirmar que faria uma “missão” em Rio das Pedras, reduto de seu chefe. Ao longo do período das escutas, ele foi preso em flagrante por porte ilegal de arma, mas foi libertado dias depois e, desconfiado, trocou o número de celular.

Outro ex-PM identificado é Waldiney Mirlando Gomes Lopes, apontado pelo MP como “responsável pela segurança de Adriano e de seus familiares”. Para os promotores responsáveis pela investigação, a proximidade entre Lopes e a família do miliciano foi revelada quando o ex-PM — contemporâneo de Adriano no Bope, onde se conheceram — foi, junto com Tatiana, irmã de Adriano, à Bahia para reconhecer o corpo do chefe, em fevereiro do ano passado.

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Lopes foi expulso da PM por um roubo que cometeu com outros agentes do Bope, em novembro de 2005, em Maricá, na Região Metropolitana do Rio. Na ocasião, o agente e seus comparsas entraram, à paisana, na casa de um homem suspeito de integrar o tráfico local. Segundo a investigação, para não levarem o homem preso, eles exigiram uma série de bens que estavam no local, como joias, dinheiro, cartões de crédito e as senhas dos cartões. Em 2007, Lopes foi condenado a 6 anos de prisão pelo crime.

Já Wagner de Castro Pinto, o Cara de Ovo, foi identificado na investigação como o “responsável por executar várias atividades de administração do haras de Adriano, sempre prestando contas à Tatiana”, irmã do miliciano. Numa das escutas interceptadas pela polícia, um comparsa afirma que Wagner e Tatiana estavam “fazendo a limpa”. O diálogo foi gravado no dia 13, apenas quatro dias depois da morte de Adriano. Segundo o MP, a dupla “possivelmente estaria se desfazendo de objetos e provas” no Haras Modelo, em Guapimirim, de propriedade de Adriano e onde sua irmã passava boa parte do tempo até o miliciano ser morto. Cara de Ovo também foi flagrado em outro diálogo em que Tatiana confidencia que os bens de Adriano seriam passados para a mãe dele.

Ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega foi morto durante operação da polícia baiana em fevereiro
Ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega foi morto durante operação da polícia baiana em fevereiro Foto: Divulgação

Ele foi expulso da PM por um assassinato que aconteceu numa festa em abril de 2008, em Irajá, na Zona Norte do Rio. A vítima foi o policial civil Davis Pereira Lourenço Cleto. Na ocasião, os dois brigaram durante a comemoração, Cara de Ovo sacou uma pistola e deu vários disparos. A filha de outro policial que estava no local também foi atingida, sem gravidade. Segundo testemunhas, o ex-PM teria dito antes de disparar: “Eu não sou homem de ser intimidado por ninguém, principalmente por você”. Cara do Ovo foi condenado, em 2019, a 15 anos de prisão pelo homicídio.

Os dois PMs da ativa que foram identificado são o sargento Luiz Carlos Felipe Martins, o Orelha, e o subtenente Odimar Mendes dos Santos, o Marreta. Martins, que era lotado no 16º BPM (Olaria), foi executado a tiros em Realengo, na Zona Oeste do Rio, no último dia 20, às vésperas da Operação Gárgula. Segundo o MP, ele era o braço-direito de Adriano e foi um dos responsáveis por ordenar a venda dos bens do chefe após sua morte. Os dois se conheciam há mais de 20 anos e já passaram dois períodos na cadeia juntos.

Orelha foi morto às vésperas da operação
Orelha foi morto às vésperas da operação Foto: Reprodução

Em 2004, os dois integravam a mesma patrulha do 16º BPM e foram presos pelo assassinato do guardador de carros Leandro dos Santos Silva, de 24 anos. A vítima havia denunciado os agentes no dia anterior pela prática de extorsão e ameaça. Ambos foram absolvidos do crime em 2007. No ano seguinte, foram presos de novo pelo antentado contra o pecuarista Rogério Mesquita em meio a uma guerra da contravenção. Segundo a investigação, Adriano e Orelha integravam uma gangue de PMs encapuzados que preparam uma tocaia para Mesquita. O homem conseguiu sobreviver porque estava com seguranças. Anos depois, os dois foram absolvidos e libertados. Orelha seria preso na operação da última segunda-feira.

Já Marreta, que era lotado no 9º BPM (Rocha Miranda), morreu vítima da Covid-19. Durante a investigação, promotores identificaram sua proximidade com Orelha e com Julia Lotufo, viúva de Adriano. Num bilhete encontrado em sua conta de e-mail, Julia escreveu que “Orelha vai fazer retirada pelo Marreta da fazenda e de uma prestação de terreno”. Ele é citado por comparsas em várias ligações como destinatário de quantias em dinheiro. Numa delas, dois comparsas falam que “Marreta iria pegar noventa mil no dia seguinte”.



Fonte: Fonte: Jornal Extra