‘Vamos até o fim. Queremos toda justiça do mundo’, diz artista circense que perdeu cadela morta por policial


O artista circense colombiano Fabian Sanchez, 22 anos, diz que busca justiça pela morte da cadela vira-latas Malu, com um tiro disparado por um policial civil da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) nesta segunda-feira na Praça da Bandeira, na Zona Norte do Rio.

— Vamos até o fim. Queremos toda justiça do mundo. Ele fugiu após matar o cachorro. Ele foi covarde — diz o artista.

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Fabian, que mora no Brasil há quase três anos, relata que tudo aconteceu muito rápido. Segundo ele, o agente saiu de casa apontando a arma para ele e outras três pessoas e dizendo que eles eram “maconheiros e que não poderiam ficar ali”.

— Ele já tinha um problema com o pessoal do circo que frequenta aqui. Ele nunca teve problemas diretamente com a gente — afirma Fabian.

Mayume e Fabian Sanches com cadela que foi agredida por policial, que ainda matou outro animal do casal
Mayume e Fabian Sanches com cadela que foi agredida por policial, que ainda matou outro animal do casal Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo

Fabian diz que foram abordados pelo policial após chegarem ao local para treinar.

— Estamos treinando no Rio Comprido, descemos para almoçar na Praça da Bandeira. Depois viemos treinar. Colocamos as mochilas e logo em veio gritando “e aí, seu maconheiros, vocês não podem ficar aí”. Ele já veio correndo com a pistola, apontando para nós e os cachorros. Os cachorros – a Malu (que morreu) e a Tormente – latiram para ele de longe. Em seguida, ele deu uma coronhada na Tormenta e atirou na Malu. Ele mesmo disse que iria atirar. E atirou. Nem falou nada. Foi tudo muito frio. Foi quase um minuto de dor e sofrimento — relata.

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Também dona de Malu, a malabarista Mayumi Boletlho Bataches Rodriguez, 21 anos, diz que vai denunciar o policial para as entidades de proteção dos animais.

— A gente só quer fazer justiça, porque a morte de uma cachorra não pode ficar assim. É inadmissível uma pessoa matar um cachorro e ficar assim. A gente tem três cachorros estavam aqui: a Malu, a Tormenta e a Estopinha e elas estão traumatizadas. Assim como foi a Malu, poderíamos ser todos nós. Ele estava muito nervoso e poderia atirar na gente — diz a jovem, que é namorada de Fabian.

O também artista circense hondurenho Erick Carcamo, 30 anos, afirma que não era a primeira vez que os artistas tiveram problemas com o policial. Ele conta que o agente já saiu armado outras vezes para impedir que o grupo ensaiasse no espaço aberto.

— Há cinco meses, ele saiu armado e apontou a arma porque estávamos acampando de baixo do prédio por conta da chuva. Estávamos treinando e isso aconteceu. E há quatro meses, ele desceu novamente e apontou a arma para os amigos que estavam aqui. Tinha uma criança com a mãe. Ele não gosta das pessoas aqui. Para matar uma cachorra, ele não pode estar bem da cabeça. Ele sempre fala que é policial para intimidar as pessoas.

Praça onde cadela foi morta por policial civil ainda tem cápsulas da arma usada pelo agente e marcas de sangue
Praça onde cadela foi morta por policial civil ainda tem cápsulas da arma usada pelo agente e marcas de sangue Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo

O autor do disparo foi Ney Côrtes da Silva, que moraria na região, segundo quem se exercita no espaço. Testemunhas que viram a cena disseram que a confusão começou após o agente se irritar com a presença dos animais. Em depoimento, ele nega e diz que temia ser atacado pela cadela. No local, foram encontradas várias cápsulas. Moradores contarem que após matar a cadela, o agente fugiu.

— Aqui é uma praça que tem vários cachorros, e as pessoas vêm passear com eles todos os dias. O pessoal do circo — os artistas circenses — vêm as segundas, quartas e sextas para os treinos e os cachorros ficam brincando na praça. A gente sabe que tem gente que mora aqui e não gosta dos cachorros. São pessoas poderosas, e a gente não quer se meter com eles. A gente não pode fazer nada por medo. Eu desço todo dia com os meus cachorros — diz nesta terça-feira uma moradora, que, por medo, prefere não se identificar.

A mulher completou:

— Essa agressão é gravíssima. Ele sabe que não vai dar em nada e por isso ele se aproveitou. Os moradores estão lutando para que a praça seja cercada e tenha espaço para os animaizinhos ficarem à vontade — finalizou.

A empresária Luana Félix é dona de um petshop e conta que o fluxo de pessoas e seus animais aumentou na praça durante a pandemia da Covid-19.

— As pessoas se exercitam, passeiam com os cachorros, cuidam das plantas e até descansam. A associação de moradores está correndo atrás das melhorias. O pessoal do cachorro (que morreu) a gente só vê de vista treinando. Eles não são de arrumar problemas com ninguém — conta.

Um funcionário de uma empresa próxima do local diz que ouviu um disparo e logo em seguida notou a confusão generalizada e pessoas gritando.

— As pessoas começaram a se revoltar com o que aconteceu e começaram a questioná-lo. Em seguida a polícia chegou — disse.

Uma aposentada que caminha no espaço de lazer todos os dias criticou a postura do agente:

— É um absurdo fazer isso. Muitos animais cuidam do ser humano, e ele vem e faz isso. Não tinha por quê. Um bicho indefeso.

Agente admite que matou cão

Por volta de 15h30m, policiais militares do 4º BPM (São Cristóvão) foram chamados pela artista circense, que, acompanhada de um amigo, alegava que Ney os havia ameaçado com arma de fogo e dado um tiro no seu cão. Na 18ª DP (Praça da Bandeira), o policial admitiu o disparo, mas alegou temer que o animal fosse atacá-lo.

O caso foi enquadrado no crime de maus-tratos a animais, com o agravante morte, e diligências devem ser feitas nos próximos dias. Em nota, a Polícia Civil informou que a Corregedoria da corporação vai apurar o caso com rigor.

De acordo com o Linha Verde, do Disque Denúncia, mais de quatro mil denúncias de maus tratos de animais já foram registrada neste ano.



Fonte: Fonte: Jornal Extra