Um objetivo para governar todos
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2015, representam um marco ambicioso na busca por um futuro global mais justo, equitativo e ambientalmente responsável.
Apesar de sua nobre intenção e abrangência, a estrutura atual dos 17 ODS e suas 169 metas tem sido alvo de críticas relacionadas à sua complexidade, às potenciais sobreposições, aos desafios de implementação e à dificuldade em estabelecer prioridades claras em meio a tantos objetivos.
Neste contexto, o presente artigo se propõe a analisar criticamente a arquitetura dos ODS, argumentando que, embora bem-intencionada, sua configuração atual pode diluir o foco e dificultar ações efetivas.
Essa agenda universal é composta por 17 objetivos interconectados e desdobrados em 169 metas específicas, que abordam os desafios globais mais prementes.
Seu escopo é vasto, englobando desde a erradicação da fome e da pobreza extrema (ODS 1 e 2), a garantia de saúde e educação de qualidade (ODS 3 e 4), a igualdade de gênero (ODS 5) e o acesso à água potável e saneamento (ODS 6), até questões como energia limpa (ODS 7), trabalho decente e crescimento econômico (ODS 8), inovação e infraestrutura (ODS 9), redução das desigualdades (ODS 10), cidades sustentáveis (ODS 11), consumo responsável (ODS 12), combate às alterações climáticas (ODS 13), proteção da vida marinha e terrestre (ODS 14 e 15), promoção da paz e justiça (ODS 16) e o fortalecimento de parcerias globais (ODS 17).
As 169 metas representam o detalhamento prático dos 17 ODS, traduzindo as ambições gerais de cada objetivo em alvos específicos e, sempre que possível, mensuráveis, a serem alcançados até 2030.
Por exemplo, enquanto o ODS 1 busca erradicar a pobreza em todas as suas formas, a Meta 1.1 especifica “erradicar a pobreza extrema para todas as pessoas em todos os lugares, atualmente medida como pessoas vivendo com menos de US$1,90 por dia”.
Similarmente, sob o ODS 3 (Saúde e Bem-Estar), a Meta 3.1 visa “reduzir a taxa de mortalidade materna global para menos de 70 mortes por 100.000 nascidos vivos”. Outro exemplo é a Meta 6.1 (ligada ao ODS 6, Água Potável e Saneamento), que busca “alcançar o acesso universal e equitativo à água potável, segura e acessível para todos”.
Apesar da abrangência e da nobre visão encapsulada nos ODS e suas metas, a arquitetura atual do sistema apresenta fragilidades significativas, que podem comprometer sua eficácia prática.
A vasta quantidade de 17 objetivos e 169 metas, embora buscando não deixar ninguém para trás, gera uma complexidade inerente que dificulta a priorização estratégica, a alocação eficiente de recursos e a comunicação focada para mobilizar a sociedade. Argumento que essa amplitude pode levar à diluição de esforços, em que a interconexão declarada nem sempre se traduz em abordagens integradas, correndo o risco de manter a fragmentação setorial (“silos”) que a própria Agenda 2030 busca superar.
Além disso, a falta de uma hierarquia clara entre os objetivos, os desafios relacionados à mensurabilidade de certas metas e à sua adaptação e implementação em contextos locais levantam questionamentos sobre o potencial de transformação real do framework atual.
A proposta da PRIME Society, federação sem fins lucrativos que lidero, é simples. Devemos, como sociedade global, focar em um único objetivo: a erradicação completa e sustentável da pobreza no planeta. Para atingir tal objetivo, todos os outros ODS estão incorporados nesta única meta. Por exemplo, se não houver combate às alterações climáticas – o resultado será a pobreza, o mesmo vale para educação, saúde, paz e justiça.
Onde os ODSs podem estar pecando é na estruturação muito teórica e pouco prática. Se imaginarmos prefeitos de cidades pelo mundo, poucos têm capital humano e financeiro para realizar o que é necessário. Estruturas de governança hierárquicas e pouco distribuídas fazem com que os recursos fiquem presos em níveis superiores. Basta a falta de alinhamento ideológico para que os municípios fiquem limitados. O que é o contrário do sistema de governança que a humanidade precisa.
Precisamos criar o mecanismo de industrialização de novas cidades, as chamadas cidades 5.0, que têm como objetivo a erradicação total da pobreza. O conhecimento de todas estas fases devem ser amplamente descritos e detalhados, seguindo todas as melhores práticas – para que qualquer prefeito em qualquer local do mundo, possa replicá-lo Desde as características do terreno, tratamento do esgoto, água potável, até a construção da moradia.
Quem são os fornecedores homologados? Qual é o custo do metro quadrado e como treinar a população local para adquirir o conhecimento necessário? De onde conseguir os recursos financeiros? Como devem ser estruturados os contratos entre os operadores da cidade e os cidadãos? Qual é o modelo ideal de resolução de conflitos? Como deve ser o mecanismo de tributação – e como todos esses devem evoluir e se adaptar ao longo do tempo?
Devemos criar a figura do Engenheiro de Erradicação de Pobreza – alguém que deve dominar a base científica dentro deste tema, sendo capaz de ver o todo, e saber de que componentes ele deve ser construído, incluindo organizar, planejar, executar e corrigir. Cada cidade 5.0, do ponto de vista técnico, deve ser liderada por esse engenheiro – cujo diploma foi adquirido a partir do conhecimento disponível.
Estima-se que mais de 2.5 bilhões de pessoas passem a viver em centros urbanos até 2050. Ao criar o modelo industrial de cidades 5.0 ao menos podemos evitar repetir os erros do passado nessas novas cidades, acelerando sua execução, melhorando sua qualidade e mitigando risco para os investidores. Ademais, essas cidades servirão de modelo para a reestruturação das cidades existentes.
Se não capacitarmos as prefeituras ao redor do mundo, se não desenvolvermos os mecanismos de alocação de capital, se não criarmos padrões de planejamento, governança, monitoramento e execução – poderemos culpar os outros pelo fracasso dos ODS; porém, nós todos seremos responsabilizados. Seja pelas guerras, pela fome, pelas doenças, pela instabilidade, e por tudo aquilo que levou a ONU a criar o ODS.
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A Prime Society realizará o evento “Cidade 5.0 – Quando a Erradicação da Pobreza é um Bom Negócio” nas principais capitais do país, com o objetivo de iniciar uma transformação concreta e buscar soluções eficazes para um problema que assombra o Brasil há séculos. Participe e faça parte dessa mudança!
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG
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