
Ouça a voz em português que viaja pelo espaço há 48 anos
Entre as vozes gravadas a bordo das sondas Voyager 1 e Voyager 2, lançadas em 1977 pela NASA , há uma frase em português que ecoa pelo espaço há quase meio século: “Paz e felicidade a todos.”
A saudação faz parte do Voyager Golden Record, um disco banhado a ouro que carrega sons, imagens e mensagens da Terra com o objetivo simbólico de apresentar a humanidade a possíveis civilizações extraterrestres.
A mensagem em português foi gravada por Janet Sternberg, linguista norte-americana com ligação ao Brasil.
Em entrevista concedida a veículos internacionais, ela contou que foi convidada pela equipe de Carl Sagan, responsável pelo projeto, para participar das gravações.
A escolha da frase, simples e universal, representa o desejo humano de paz e harmonia, valores que a NASA quis projetar ao universo como marca de nossa espécie.
O Disco de Ouro: uma cápsula do tempo interestelar
O Disco de Ouro das Voyager é considerado uma das maiores declarações culturais da humanidade.
Nele estão gravadas 115 imagens, sons da natureza, 27 faixas musicais, que vão de Bach a canções folclóricas, e saudações em 55 idiomas diferentes.
Segundo a NASA, a intenção era reunir um retrato abrangente da vida na Terra. As mensagens foram traduzidas em línguas de todos os continentes, incluindo idiomas antigos e dialetos regionais. “
Paz e felicidade a todos” , em português, foi uma das poucas frases que dispensaram o nome do país de origem, justamente por expressar uma ideia compreensível em qualquer cultura.
Um recado da Terra para o cosmos
O projeto foi idealizado pelo astrônomo Carl Sagan e produzido no laboratório da Universidade Cornell, nos Estados Unidos.
Cada detalhe foi pensado para resistir ao tempo e às duras condições do espaço: o disco é feito de cobre revestido a ouro e foi projetado para durar mais de um bilhão de anos.
A sonda Voyager 1, que carrega uma das cópias, já ultrapassou o sistema solar e segue viajando pelo espaço interestelar, a mais de 24 bilhões de quilômetros da Terra. A Voyager 2, lançada duas semanas antes, segue uma trajetória semelhante.
Ainda que a chance de o disco ser encontrado por seres inteligentes seja mínima, o projeto é visto como um gesto de esperança e curiosidade científica, um registro de quem somos e do que valorizamos.
A voz que representou o português
Janet Sternberg, hoje professora de linguística na Fordham University, em Nova York, foi quem deu voz ao português.
Na época, ela trabalhava com colegas brasileiros e dominava o idioma. Segundo ela, a equipe queria frases curtas, gentis e compreensíveis mesmo para quem não reconhecesse as palavras.
“Era uma saudação que pudesse transmitir boas intenções. ‘Paz e felicidade a todos’ parecia perfeita para isso” , contou Sternberg em entrevista à imprensa americana.
Sua voz, registrada há quase 50 anos em um estúdio de Cornell, hoje segue a bilhões de quilômetros da Terra, cruzando o espaço profundo como um símbolo de unidade e gentileza.
Representatividade e simbolismo
A presença do português entre os 55 idiomas escolhidos também reforça a importância global da língua, falada hoje por mais de 260 milhões de pessoas em nove países. O registro é uma das raras vezes em que o idioma aparece em uma missão espacial da NASA.
Especialistas em linguística e comunicação intercultural apontam que a frase escolhida carrega um valor universal. Segundo eles, palavras como “paz” e “felicidade” sintetizam valores comuns a praticamente todas as culturas humanas, independentemente de origem, religião ou contexto histórico.
Onde está o Disco de Ouro hoje
Embora as Voyager sigam seu caminho pelo espaço, réplicas idênticas do Golden Record estão expostas em museus dos Estados Unidos, como o Smithsonian National Air and Space Museum, em Washington, e o Jet Propulsion Laboratory (JPL), na Califórnia.
O conteúdo também foi digitalizado pela NASA e pode ser ouvido no site oficial da agência, que disponibiliza as saudações em áudio e a lista completa dos idiomas.
Em 2017, o documentário The Farthest, da PBS, reuniu entrevistas com cientistas e técnicos que participaram do projeto. O filme inclui trechos da gravação original de Janet Sternberg e relatos sobre o significado cultural do disco.
Um legado que atravessa o tempo
Mais de 45 anos após o lançamento, o Golden Record continua despertando fascínio. Para os cientistas, é uma cápsula do tempo que leva a memória da humanidade para além das fronteiras do sistema solar.
Para os historiadores e comunicadores, é uma obra de arte coletiva, que une ciência e poesia.
“É um lembrete de que, em meio às nossas diferenças, somos parte de uma mesma história cósmica” , afirmou Carl Sagan, em 1978, pouco depois do lançamento das sondas.
E entre todas as vozes, sons e músicas que viajam no espaço desde então, a pequena saudação em português continua ecoando silenciosamente: “Paz e felicidade a todos.”
IG Último Segundo