Com a ameaça de obstrução por parte da oposição e a demora para instalar comissão especial de análise do PL da isenção, a Câmara corre o risco de paralisia
A proposta de isentar do Imposto de Renda (IR) pessoas com salário de até R$ 5 mil corre o risco de emperrar no plenário da Câmara dos Deputados. Isso porque a oposição ameaça obstruir votações caso o projeto de anistia a investigados por atos golpistas de 8 de janeiro continue fora da pauta.
O impasse se instalou após o Colégio de Líderes, sob comando do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), decidir, na quinta-feira (24) não avançar com o PL da Anistia. A medida irritou os partidos de oposição, que acusam a base governista de recuar diante da pressão popular e articulações internas.
O líder da oposição, deputado Zucco (PL-RS), afirmou que a retirada foi um “desrespeito com os parlamentares” e prometeu que o grupo vai seguir obstruindo os trabalhos legislativos. “Nós temos maioria e 264 assinaturas. É inaceitável mudar a estratégia com base em pressões externas. Esse tema é necessário e precisa ser debatido”, criticou Zucco.
“Vamos sair da obstrução somente quando tivermos a data marcada para a anistia”, declarou Zucco. A obstrução é um recurso utilizado para impedir o prosseguimento dos trabalhos e ganhar tempo.
Na prática, os parlamentares atrapalham o avanço da votação de projetos no plenário e em comissões na Câmara ao utilizar mecanismos como pronunciamentos, pedidos de adiamento da discussão e da votação, formulação de questões de ordem, saída do plenário para evitar quórum ou a simples manifestação de obstrução, pelo líder, o que faz com que a presença dos seus liderados deixe de ser computada para efeito de quórum.
Enquanto isso, o governo tenta acelerar a tramitação do Projeto de Lei 1087/2025, que aumenta o limite de isenção do IR a partir de 2026. A proposta é uma das principais promessas da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e foi enviada ao Congresso em março, em regime de urgência constitucional — dispositivo previsto na Constituição que permite ao presidente da República pedir que projetos de sua autoria tenham prioridade na pauta do Legislativo.
Antes de chegar ao plenário da Câmara, o projeto precisa ser analisado por uma comissão especial. Embora o presidente da Casa, Hugo Motta, tenha anunciado no início do mês a criação desse colegiado, a instalação ainda não ocorreu.
Segundo o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), ainda não houve a formação da instância responsável por analisar a proposta porque os líderes não indicaram os participantes. “Quanto à comissão especial do Imposto de Renda, ela já está aprovada. Falta apenas os deputados indicarem seus membros. As bancadas ainda não haviam feito as indicações, o que é normal, sem nenhuma dificuldade”, disse.
Com a ameaça de obstrução por parte da oposição e a demora para instalar a comissão especial, a Câmara corre o risco de paralisia. Isso porque, por tramitar em regime de urgência constitucional, o PL 1.087/2025 tranca a pauta de votações a partir de 3 de maio.
“A pauta da isenção do imposto de renda, o presidente Hugo quer instalar até a próxima semana as comissões especiais, dentre elas a comissão especial do imposto de renda, que é prioridade das prioridades”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), após reunião de líderes.
“A prioridade do governo é votar essa e outras matérias. Nossas energias precisam estar voltadas para votar a PEC da Segurança , o projeto do Imposto de Renda, a montagem das comissões especiais restantes e das comissões mistas das medidas provisórias”, acrescentou o deputado.
Em relação ao projeto da anistia, Guimarães sinalizou que o governo está aberto a negociações. “O presidente da Câmara disse que decidiu adiar a votação, mas não que o tema foi encerrado. As conversas continuam acontecendo. Isso indica que o governo aceita algum tipo de negociação em relação a esse projeto”, assegurou.
Entenda o PL de Isenção
O Projeto de Lei 1087/2025 propõe mudanças importantes na tributação do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), com foco na isenção para quem ganha até R$ 5 mil mensais e na instituição de um imposto mínimo para altas rendas.
Entre as principais medidas propostas pelo governo está o aumento da faixa de isenção para R$ 5 mil mensais a partir de 2026, o que pode beneficiar cerca de 10 milhões de brasileiros. Para quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 7 mil, haverá redução no valor do imposto pago.
A proposta também inclui um Imposto de Renda Mínimo a partir de rendas superiores a R$ 600 mil por ano – cerca de R$ 50 mil mensais. A alíquota mínima para esse grupo chegaria a 10% para quem ultrapassa R$ 1,2 milhão anuais. Também serão tributados com essa mesma alíquota lucros e dividendos remetidos ao exterior.
Para compensar a perda de arrecadação com as isenções — estimada em R$ 25,84 bilhões —, o governo espera arrecadar R$ 34,12 bilhões com a taxação dos mais ricos, que representam apenas 0,13% dos contribuintes.
Por outro lado, segundo estudo realizado pela Câmara dos Deputados, essa proposta pode reduzir a desigualdade em 1,1% entre os contribuintes e aumentar em até R$ 10,3 bilhões o consumo no comércio e setor de serviços.
Na prática, a proposta busca corrigir distorções históricas, nas quais os mais ricos pagam, proporcionalmente, menos imposto que a classe média. Hoje, quem recebe acima de R$ 600 mil por ano tem uma alíquota efetiva de apenas 2,54%, segundo dados da Receita Federal.
A pauta é considerada prioritária para o Planalto. Em cerimônia no Palácio do Planalto, em março, Hugo Motta classificou o texto como uma medida de justiça social. “A proposta precisa avançar. Ela representa um alívio fiscal para quem mais precisa e sinaliza responsabilidade com o equilíbrio das contas públicas”, afirmou o presidente da Câmara.
De acordo com o líder do governo, o acordo é para que o projeto seja votado na Câmara e no Senado até o segundo semestre deste ano. “Há o entendimento de que a matéria será votada nas duas Casas até setembro. Esse foi o acordo que fizemos. Eu acho que está de bom tamanho. Agora é fazer o que precisamos fazer”, concluiu Guimarães.
IG Último Segundo