Lula x Trump alimenta discurso lulista e reacende polarização


Presidente da República, Jair Bolsonaro, durante Reunião bilateral com o senhor Donald J. Trump, Presidente dos Estados Unidos da América.
Agência Brasil

Presidente da República, Jair Bolsonaro, durante Reunião bilateral com o senhor Donald J. Trump, Presidente dos Estados Unidos da América.

Nos últimos dias,  Donald Trump resolveu voltar atenções ao Brasil. Ele foi de declarações, digamos, pouco amistosas contra o governo, até o tarifaço oficialmente anunciado nesta quarta-feira, 9 de julho. Para que possamos entender melhor esse contexto, vale a pena voltarmos ao que aconteceu nos dias que sucederam o anúncio bombástico.

Tudo começou no domingo de 6 de julho, quando a XVII Cúpula do Brics (bloco formado por países emergentes do sul global, incluindo Brasil, China, Rússia e Índia) fez a divulgação da chamada “Declaração do Rio de Janeiro”. No documento, as nações defendem, entre outras questões, o fortalecimento do comércio multilateral, uso de moedas locais para redução da dependência do dólar e a promoção de uma “ordem internacional mais justa”.

Aparentemente, Trump não gostou. No mesmo dia, foi para as redes sociais fazer ameaças de taxação a países que se alinharem a “políticas antiamericanas do Brics”. No dia seguinte, 7 de julho, voltou a mirar o Brasil nas redes sociais. Criticou o Poder Judiciário brasileiro e defendeu Jair Bolsonaro, afirmando que ele estaria sendo perseguido. Trump disse ainda que está “acompanhando de perto” o julgamento do ex-presidente.

Lula reagiu. Embora não tenha citado Trump nominalmente, disse que o Brics “não nasceu para afrontar ninguém”. Sobre as críticas ao julgamento de Bolsonaro, afirmou que não aceita “interferência ou tutela de quem quer que seja”, complementando que ninguém está acima da lei no Brasil. “Que deem palpite na sua vida e não na nossa”, disse. Um recado que de nada adiantou.

Em uma retaliação de fundo muito mais ideológico do que econômico, Trump taxou os produtos brasileiros em 50%. O índice, muito diferente dos 10% fixados em abril, foi justificado como medida de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, em uma clara tentativa de enfraquecimento do Governo e, mais especialmente, da figura de Lula.

Mas tal embate, ao contrário do que possa imaginar o presidente norte-americano, potencialmente fortalece o lulismo no Brasil. Ele cria uma atmosfera de defesa ao “não vira-latismo”, ancorado pela cultura antiTrump que vem crescendo em todo o globo. E Lula, sob a figura do operário que se tornou presidente, ganha forte simbologia nesse enredo de confronto contra o multimilionário Trump, comandante da maior potência econômica do mundo.

A narrativa cai como uma luva para Lula, que vem amargando sucessivas quedas nas pesquisas de avaliação do governo e de intenções de votos para a corrida presidencial de 2026. O eleitor está decepcionado com o desempenho do governo e cansado da polarização entre esquerda e direita. De repente, no entanto, o presidente ganha novo fôlego junto aos brasileiros, na defesa do discurso nacionalista.

Por outro lado, o embate com Trump incita os bolsonaristas, para quem a narrativa de perseguição contra o ex-presidente fica agora fortalecida. As falas do presidente americano corroboram a tese de que Jair Bolsonaro é vítima; dessa vez, não de uma facada em praça pública, mas de um golpe supostamente desferido pelo Judiciário e apoiado pelo Poder Executivo agora nas mãos da esquerda.

Na prática, o clima interno de antagonismo passa a ser amplificado e reacende a polarização política no país. Ainda é prematuro que sejam feitas discussões sobre os possíveis efeitos do tarifaço de Trump no cenário político interno e sobre as tendências de melhora, ou não, do desempenho de Lula ou Bolsonaro junto à opinião pública.

O caminhar dessa narrativa dependerá dos acontecimentos que se sucederem a partir de agora. A conferir.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG



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