A Questão Política e os Limites de Atuação do STF


Por: Ricardo Sayeg*

Plenário do Supremo Tribunal Federal
Agência Brasil

Plenário do Supremo Tribunal Federal

Tenho certeza de que todos os Ministros do Supremo Tribunal Federal estão imbuídos do sentimento patriótico mais puro e compromisso com o Brasil.

Entretanto, a sociedade brasileira, perplexa, assiste ao protagonismo do Supremo Tribunal Federal em matérias que escapam à sua função típica de guarda da Constituição. É inaceitável a substituição do debate democrático parlamentar por decisões judiciais.

E para agravar, nesta ambiência, alastra-se o receio de que, qualquer crítica mais contundente possa ser reprimida com desproporcional severidade. Instalou-se, aos olhos da cidadania, um sentimento de temor de que basta uma opinião mal interpretada ou uma caricatura politicamente inconveniente para que se cogite a imposição de punições que antes só se viam para situações ou crimes de extrema gravidade.

Nesse cenário de inquietação cívica, viralizou nas redes sociais uma belíssima passagem de um julgamento no Pretório Excelso em que o Ministro Luiz Fux fez uma ponderação de profundo bom senso e maturidade institucional sobre a questão política e os limites de atuação do Supremo Tribunal Federal. Com extrema lucidez e juridicidade, o Ministro Fux pontificou que, em uma Democracia o protagonismo é do Legislativo — poder eleito pelo povo e que, por isso mesmo, é ele que deve responder politicamente nas urnas com o custo social perante seus representados. Mais também: deixou clara a premissa de que o Judiciário, especialmente em sua instância suprema, não deve assumir o papel de gestor da República nem tampouco de legislador substituto.

De fato, ao Supremo Tribunal Federal incumbe a aplicação da Constituição, jamais a sua reescrita ideológica. Assim sendo, dentro do contexto atual, esse alerta do Ministro Fux é um marco fundamental e histórico.

É preciso compreender que o Supremo Tribunal Federal não é composto por juízes eleitos. Seus membros não prestam contas diretas ao povo. A Magistratura por não é uma profissão populista, certo que, a legitimidade de sua atuação encontra limite na interpretação imparcial da norma constitucional e legal, sendo-lhe vedado invadir o espaço do debate político, que é intrinsecamente plural, contraditório e dialético por natureza.

Cabe invocar o paradigma universal consolidado pela jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos ao ser firme em instituir e aplicar concretamente a doutrina da “political question”, pela qual questões eminentemente políticas são consideradas insuscetíveis de apreciação judicial, justamente por pertencerem ao domínio exclusivo dos outros Poderes da República. Essa posição visa proteger tanto a Democracia quanto a própria credibilidade do Judiciário, que não pode ser confundido com uma instância de governo paralelo.

Como pontificaram os Ministros da Suprema Corte Norte Americana: o Poder da Corte está na confiança e legitimidade de suas decisões. Confiança essa que seria destruída pelo posicionamento político de defensores da Democracia que não foram eleitos pelo povo.

Essa lição se consolidou no caso Luther de 1837, e ecoa naquela nação até os dias de hoje.

Desde Marbury v Madison, primeiro grande caso de repercussão global de Direito Constitucional, a mesma Corte Suprema que declarou para Thomas Jefferson, a personificação do Constituinte originário daquela nação, que a lei que este redigiu seria inconstitucional, também traçou os limites da sua própria atuação, reconhecendo a proibição de intervenção judicial nas questões políticas.

Como afirmado pelo Justice John Marshall: “tal como não temos o direito de recusar o exercício da jurisdição que é dada, também não temos o de usurpar a que não é dada. Qualquer uma dessas condutas é uma traição à Constituição”.

Marshall em outro de seus emblemáticos pronunciamentos ainda proclamou que: “o poder judicial nunca é exercido com o propósito de dar efeito à vontade do Juiz; sempre com o propósito de dar efeito à vontade do Legislativo; ou, em outras palavras, à vontade da lei.”

Máxime porque, como nos lembra aquele renomado jurista: “o povo fez a Constituição, e o povo pode desfazê-la. Ela é fruto da vontade do povo e vive apenas por ela.”

Exatamente por isso que, o ativismo judicial, por mais bem-intencionado que possa parecer, presta um desserviço à Nação. Enfraquece o Legislativo, desloca o debate público, estimula o ressentimento social e, no limite, ameaça a estabilidade das instituições.

Ao Judiciário cumpre o dever de autocontenção. A tentação de fazer justiça com as próprias convicções cede lugar à primazia do princípio republicano da Separação dos Poderes expressamente consagrado na nossa Constituição Federal.

O pronunciamento do Ministro Fux é, portanto, um alento e edificante para o país. Um verdadeiro chamado à sobriedade institucional. Esta sua manifestação ilumina a verdade de que, sem a Separação de Poderes, não há Justiça; sem Justiça, não há Democracia.

Está escrito na histórica Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 da Revolução Francesa que, a sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.

Parabéns, Ministro Luiz Fux. O senhor, com coragem e fidelidade à Constituição, encanta ao Brasil!

* Ricardo Sayeg – Jornalista. Jurista Imortal da Academia Brasiliense de Direito e da Academia Paulista de Direito. Professor Universitário. Livre-Docente. Doutor e Mestre em Direito. Presidente da Comissão de Direito Econômico Humanista do IASP. Presidente da Comissão Nacional Cristã de Direitos Humanos do FENASP. Comandante dos Cavaleiros Templários do Real Arco Guardiões do Graal.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG



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