Uma nova onda de crimes digitais tem tomado conta da web: criminosos “sequestram” o perfil de uma vítima e se passam por aquela pessoa para aplicar golpes. Imediatamente, os estelionatários passam a fazer publicações para tentar induzir os seguidores a fazer transações ou compras.
Sem ter a noção de que o perfil do amigo ou familiar, por exemplo, foi hackeado, muitos caem na falcatrua e perdem dinheiro para os criminosos. O golpe tem feito diversas vítimas pelo país e pelo mundo, lesando quem acreditava que a oferta era feita por aquele que, na verdade, é mais uma vítima da situação.
O fotógrafo Diego Mello, de 32 anos, teve seu perfil do Instagram hackeado e utilizado por um criminoso que estava detido em um presídio em Osasco, São Paulo, para a aplicação do “golpe do pix”, que alegavam ser um “investimento em bolsas de valores digitais com lucros imediatos”.
O invasor da conta de Diego chegou a fazer uma montagem fingindo ser a captura de tela de uma conta de banco do fotógrafo com a suposta quantia de R$ 8.000,00.
Diego foi à delegacia registrar a invasão de seu perfil para a promoção de golpes. | Foto: Divulgação
“Vários amigos, infelizmente, acabaram caindo no golpe acreditando que era eu que estava usando o perfil, quando na verdade estava em posse dos bandidos. Com muito trabalho consegui recuperar a conta com a ajuda de uma pessoa que tem conhecimento na área”, relata.
Reunir o máximo de provas do crime é importante
Diego conta que tentou a recuperação através da ferramenta de reconhecimento facial disponibilizada pelo Instagram, porém como seu perfil é de trabalho, a rede social não reconhecia seu rosto como prova. O fotógrafo profissional chegou a ir à delegacia, mas diz que não teve o retorno esperado.
“Fui à delegacia dos crimes de internet na Cidade da Polícia, mas tive a surpresa de que nada poderia ser feito para me auxiliar, somente poderiam ajudar quem teve prejuízos financeiro, mesmo eu tendo minha imagem prejudicada”, diz.
Delitos como o que Diego sofreu têm crescido bastante no país. Essa alta ajuda a confirmar o Brasil como um dos países que mais sofreu com crimes cibernéticos nos últimos tempos: o 5º do mundo no ano passado, segundo a consultoria alemã Roland Berger: apenas no primeiro trimestre foram registradas um total de 9,1 milhões de ocorrências, mais que o ano inteiro de 2020.
Hacker se utiliza de perfil de Diego para aplicar golpe | Foto: Divulgação
Os golpes financeiros virtuais chegaram a somar cerca de R$ 3 bilhões no ano passado, segundo a empresa especializada em cibersegurança Axur.
A gonçalense Deise Pontes, 54, passou por algo parecido com o que viveu o fotógrafo Diego. A técnica contábil teve duas contas hackeadas. Os criminosos começaram a “vender” móveis, eletrodomésticos, como se uma amiga dela estivesse desapegando dos itens; e também a divulgar a “pirâmide do Pix”, golpe em que a vítima supostamente investe uma quantia e recebe um valor superior como retorno.
“Me senti prejudicada emocionalmente, pois foi a minha vida sendo colocada como uma pessoa de má índole. A princípio também não se sabe o que eles estão fazendo com suas fotos, seus pensamentos. Tive duas crises de ansiedade e até a minha psoríase que estava em remissão veio à tona”, desabafa.
Deise Pontes é técnica contábil e escritora, e faz um alerta sobre o crime de golpes cibernéticos | Foto: Divulgação
A moradora do Galo branco diz que passou a viver uma “neura cibernética”, pensando apenas nas possíveis consequências para a sua família, sua mãe, seu neto, uma vez que tinha postado fotos deles.
“Me senti culpada, só que eu sou a vítima. Não posso adoecer por causa desses bandidos”, expõe.
Infelizmente, uma pessoa que Deise conhecia há pouco tempo, e só tinha contato com ela pelo Instagram, rede que fizeram o “sequestro” da conta, fez um depósito no valor de R$1.500,00 para o criminoso. Ela acreditou estar comprando uma geladeira através de um negócio com Deise.
Por outro lado, a maioria dos amigos que a seguiam, logo perceberam que se tratava de um golpe, a avisando imediatamente. “Quem me conhece sabe que jamais faria esse tipo de venda, muito menos nos stories do Instagram”.
A técnica em contabilidade chegou a ser avisada de uma tentativa de invasão no Facebook, que a desvinculou das suas contas no Instagram e permitiu que ela pudesse alertar seus amigos do golpe na rede social vizinha.
Já no próprio Instagram, Deise não teve a mesma sorte. O criminoso conseguiu colocar o próprio e-mail e número de telefone, dessa forma, mesmo com o suporte, todas as tentativas da gonçalense em recuperar as suas contas foram em vão.
Criminoso usou perfil de Deise para fingir que a técnica em contabilidade estava ajudando uma amiga a vender móveis | Foto: Divulgação
Um registro de ocorrência foi realizado por ela na 78ª DP (Fonseca), em Niterói, com o mínimo de provas circunstanciais que tinha em mãos. A delegacia informou que iria abrir uma linha de investigação.
“Gostaria de deixar as pessoas alertas para essa sensação de facilidade, com os valores muito abaixo do mercado, com sorteios e promoções, com convite para publicidades e outras coisas desse tipo nas redes”, conclui Deise Pontes.
Segundo a polícia civil, o crime de estelionato é configurado somente nos casos em que há prejuízo financeiro, como o que aconteceu com a amiga da Deise, que realizou o pix acreditando estar fechando uma compra. Os casos de perfis hackeados são enquadrados em crimes cibernéticos, entre outros, e também se faz importante o registro em delegacia.
Saiba como proteger seu perfil
De acordo com pesquisa da empresa de cibersegurança Norton, mais da metade (58%) dos brasileiros entrevistados afirma ter sofrido um crime cibernético em 2021. Estima-se também que cerca de 71 milhões de brasileiros sofreram ataques cibernéticos nos últimos 12 meses.
Com números tão grandes de golpes e crimes ocorridos no ambiente virtual, é preciso cada vez mais estar atento para as ferramentas de proteção das contas de redes sociais, aplicativos e sites.
Uma das alternativas disponibilizadas por algumas empresas é a autenticação dupla quando se faz um novo login, ou seja, quando você quer acessar uma conta novamente.
Com essa etapa adicional, além de inserir o e-mail/usuário e a senha, a rede social solicita um outro código de acesso, que pode ser enviado por SMS ou por um aplicativo específico instalado no celular. Lembre-se de nunca compartilhar esse código com ninguém.
Para ativar esse recurso extra, geralmente é necessário acessar a parte de configuração ou de segurança na rede social e ativar a autenticação de dois fatores.
“As pessoas precisam fazer a dupla confirmação oferecida pelas redes sociais. Elas são chatinhas, mas extremamente necessárias. A maioria das pessoas não conhecem, mas elas são um passo que protegem a conta”, explica o presidente do Instituto Sigilo – Instituto de Defesa da Proteção de Dados Pessoais, Compliance e Segurança da Informação, Victor Hugo Pereira Gonçalves. O Sigilo é a única ONG de defesa dos titulares de dados do país.
Falso print de conta digital que criminoso tentou associar ao fotógrafo Diego Mello | Foto: Divulgação
Sequestro de contas poderá virar crime
Segundo a Agência Senado, os senadores brasileiros vão analisar um projeto de lei que tipifica crimes digitais como o estelionato no ambiente virtual e o sequestro de contas em redes sociais. A proposta foi apresentada em março deste ano pelo senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR).
De acordo com o texto, o PL 651/2022, a pena para aquele que invadir e sequestrar contas em redes sociais para extorquir o proprietário será de 4 a 10 anos de prisão e multa. A pena para esse tipo de extorsão pode ser aumentada de um terço a dois terços, se o crime resultar em dano patrimonial ao titular da conta.
Já a pena para quem cometer estelionato digital, crime em que se assume o controle das redes sociais de um usuário a fim de aplicar golpes em terceiros se passando pelo titular do perfil, será de 4 a 8 anos de prisão.
Fonte: O São Gonçalo