‘Se preferirem deixar tudo como está… beleza’, diz Salles após críticas por ideia de abrir hotel no Jardim Botânico


Após a repercussão negativa de ambientalistas e moradores, o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles pareceu ter dado sinais em seu perfil oficial do Twitter de que havia desistido da ideia de transformar o Museu do Meio Ambiente, no Jardim Botânico, na Zona Sul do Rio, em um hotel butique, na manhã desta terça-feira. A informação foi adiantada pelo colunista Lauro Jardim em seu blog.

“A ideia é realizar um estudo para eventual concessão do espaço pouco utilizado do Museu convertendo num hotel-boutique, gerando empregos, recursos e investimentos para recuperação do Jardim Botânico como um todo. Contudo, se preferirem deixar tudo como está… beleza”, escreveu Salles no Twitter, vinculando à postagem uma reprodução da reportagem na capa da edição do GLOBO.

O Ministério do Meio Ambiente foi procurado para confirmar a decisão de Salles sobre a desistência de conceder o espaço no Jardim Botânico à iniciativa privada, mas reiterou que ainda não há nenhuma ação planejada. O Jardim Botânico, no entanto, não emitiu posicionamento próprio, preferindo seguir a resposta do ministério sobre o assunto.

Inaugurado em 2008, dentro das comemorações de 200 anos da chegada da Família Real, o museu passou por uma reforma entre 2010 e 2012, se encontrando em bom estado hoje, de acordo com funcionários da instituição, onde a notícia criou um clima de tensão. A última atividade lá, antes da pandemia, foi o evento “Um mergulho mar adentro”, organizado pelo Instituto Mar Adentro com exposição, peça infantil e apresentação de documentário.

Crítica à proposta de Salles sobre a implantação de um hotel no lugar do museu, a produtora de eventos Valéria Machado Colela é contrária à justificativa do ministro de que o espaço não é muito utilizado, alegando que ela seja “superficial” e existindo outras questões por trás disso. Segundo ela, o próprio Jardim Botânico estabelece entraves burocráticos que dificultam a promoção de exposições e eventos culturais no local. O preço do aluguel diário de todo espaço, que chega a R$ 19 mil, de acordo com uma portaria enviada à União em 2017. No entanto, não foi um ponto que a moradora do Jardim Botânico destacou como empecilho.

— O que acontece com o Museu do Meio Ambiente é que a gestão é muito ruim. O Jardim Botânico é cheio de entrave burocrático, principalmente por ser uma instituição do Governo Federal. E o que eu vejo é que está havendo um desmonte de todas as estruturas que estavam funcionando para promover eventos culturais, exposições — comenta Valéria.

A ex-presidente do Jardim Botânico Samyra Crespo, que administrou o local entre 2013 e 2016, se manifestou em seu perfil no Facebook sobre a proposta do ministro, por meio do texto que escreveu para a revista Eco 21. No começo da postagem, ela traça um histórico do lugar, desde a criação do espaço pela família real brasileira até a abertura para visitação, e passa ainda pela importância científica que o Jardim Botânico representa. O conteúdo da publicação é de lamento pelo que foi proposto.

“Assim sendo, defender o Jardim Botânico é defender uma instituição que é mais do que parece, e que entrega à sociedade mais do que ela pensa”.

O ambientalista Mário Moscatelli também repudiou a ideia levantada pelo ministro.

— Particularmente acho que a finalidade do Jardim Botânico não é a de ter hóspedes, isto é, ter um hotel. A finalidade do Jardim Botânico é pesquisa, visitação e educação ambiental. Numa cidade tão mal servida de centros de educação ambiental, não vejo com bons olhos a perda de um espaço como esse — adverte Moscatelli.

As redes sociais do Jardim Botânico também foram bombardeadas de comentários contrários à implantação do hotel no local proposta por Salles. “Não queremos hotel, queremos museus para educação ambiental e disseminação da cultura nacional !”, escreveu um usuário do Instagram. “Salvem o Museu do Meio Ambiente. Fora Salles criminoso ambiental! #ForaSalles”, comentou um homem no Facebook.

A repercussão entre os moradores também ficou longe de ser positiva. Angela Tostes, jornalista, moradora há 30 anos do bairro e integrante da Associação de Amigos do Jardim Botânico, criticou a ideia:

— Foi uma coisa comunicada de cima para baixo. Aquele imóvel tem uma função dentro da realidade da instituição, que não é só parque. É uma instituição de educação, pesquisa e um centro museológico. O prédio tem uma função, recebeu muito investimento e não está abandonado. E está funcionando.

A empresária Vera Saboya, do Ateliê Culinário e da Fazenda Culinária, moradora do bairro há mais de 20 anos, é outra que já mostrou sua indignação nas redes de moradores.

— É chocante essa decisão. Por que um hotel no Jardim Botânico? A gente tem uma cidade com tantas necessidades, com patrimônios abandonados que precisam de estímulo da iniciativa privada para se manter. O prédio do museu foi reformado, não tem nenhum problema – diz ela. Um ministro do Meio Ambiente que quer transformar o Museu do Meio Ambiente num hotel privado é um retrato do país.





Fonte: G1