pintor de paredes ganha exposição com quadros consagrados


Johny Alexandre Gomes, o Jota,de 20 anos, morador do complexo do Chapadão, na Zona Norte do Rio, descobriu que tinha habilidade com desenho ainda pequeno, mas não acreditava que seu mundo teria cores tão brilhantes quanto seus sonhos. Batia ponto na construção civil virando massa e pintando paredes como ajudante de pedreiro de um tio. Seu destino começou a mudar quando, incentivado por um colega de escola, começou a pintar quadros e exibi-los numa rede social. Jota foi descoberto na internet por uma plataforma que aposta em novos talentos, a MT Projetos de Arte. Pouco mais de um ano após, o jovem já se mantém com a sua arte e inaugura neste fim de semana sua primeira exposição individual.

— Esse amigo foi a primeira pessoa a apostar no meu talento. Não só me incentivou a pintar como comprou meus dois primeiros quadros. Eu mesmo não acreditava muito. Mas ele achava que um dia eu ia ficar famoso — brinca o jovem.

Se a premonição do amigo ainda não se concretizou, está bem perto disso. Ainda no ano passado, pouco tempo após ter trocado a pá e o cimento pelas tintas e pincéis, o rapaz simples de comunidade já estava participando de um dos mais importantes eventos de arte do país, a ArtRio, quando dividiu o estande com artistas do porte de Anna Bella Geiger. Todos os seus três quadros expostos foram vendidos no primeiro dia. Um foi comprado pela criadora da feira de arte, Brenda Valansi, e os outros dois foram para o acervo de colecionadores.

Johny, o Jota, faz a primeira exposição individual no Atelier MT, na Lapa
Johny, o Jota, faz a primeira exposição individual no Atelier MT, na Lapa Foto: Agência O Globo

Sua primeira exposição individual tem a curadoria de Pablo León de La Barra, curador para a América Latina do Museu Guggenheim, na Espanha. A mostra “Eu vim de lá”, que segue em cartaz até 3 de outubro no MT Atelier, na Lapa, foi aberta ontem, com todas as 25 telas vendidas previamente, em lances dignos de um pintor consagrado.

O título da mostra não só é uma referência às raízes do jovem artista como demonstra sua principal fonte de inspiração. Das cores de suas telas brotam imagens dos bailes funk, das meninas na laje se bronzeando com fitas adesivas coladas no corpo, crianças soltando pipa e passeios na praia — um retrato típico do cotidiano dos jovens das comunidades.

‘Fiquei felizão’

Jota foi descoberto pelo mundo das artes tão rapidamente que ainda não deu tempo de se acostumar com a vida de artista. Num dia era um rapaz comum e no outro já era um pintor. E sua obra, vendida inicialmente por alguns trocados, segue se valorizando. O rapaz conta que começou a pintar os primeiros quadros no começo da pandemia, por puro hobby, utilizando os materiais que tinha em mãos: tinta acrílica e lápis de cor. Na falta de telas, recorria a pedaços de compensado ou mesmo de papelão.

— Era o que tinha em mãos ou que o dinheiro dava para comprar. Não pintava com intenção de ganhar nada. Era hobby. Ia jogando no Instagram e um dia um colecionador me procurou querendo comprar todas as minhas telas. Fiquei felizão — conta o rapaz, que vendeu dez, segundo ele, bem baratinho.

O que o jovem pintor não sabia era que o comprador integrava um grupo de colecionadores, do qual também participava Margareth Telles, a criadora do MT Projetos de Arte, que apoia novos talentos de fora do circuito tradicional de artes e, principalmente, das periferias. Através dele, ela conheceu o trabalho de Jota e, ao perceber que o rapaz tinha potencial, o incentivou a abandonar o canteiro de obra para viver apenas da pintura, contribuindo com ajuda de custo, além de investir em material de qualidade, que incluía telas, pincéis e tinta importada.

— Vi potencial no traço dele, mesmo sendo uma coisa muito primitiva. Vi ali um traço e uma identidade únicos. Vi que ele tinha personalidade artística. Foi aí que tive a ideia de incentivá-lo — lembra Margareth.

Apoiadora não conhecia museus até os 30 anos

A incentivadora de novos artistas — descobridora, entre outros, de Marcela Cantuária, que ganhou notoriedade recentemente por ter feito a concepção visual do novo disco de Marisa Monte —, é uma ex-instrumentadora cirúrgica nascida em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, que até os 30 anos não tinha entrado num museu. Apaixonada pelas artes, integra um grupo classificado como de “colecionismo ativista”.

—É uma responsabilidade social. Sempre fiz esse movimento de ajudar artistas iniciantes — define Margareth.

Orgulhosa, a aposentada Marilena Alexandre da Silva, de 57 anos, mãe de Jota, vê com bons olhos os apoios a seu filho.

— Queria investir nele, mas não tinha condições. Era sozinha para cuidar de dois — diz a mãe também de Jonathan, de 25.





Fonte: G1