Órfãos do carnaval de rua aprovam cancelamento dos blocos e fazem planos para a folia


A notícia de que o carnaval de rua de 2021 foi cancelado levou os foliões a buscarem outras formas de aproveitar a festa sem aglomerar. Autodeclarado “maratonista de blocos”, Jorge Ricardo dos Santos, o Kadinho, é um dos órfãos da folia. Mas o carioca da Rocinha, que todos os anos engata uma sequência impressionante de blocos com fôlego de atleta — foram 41 em 2020 — não pretende ficar parado. Ele planeja um carnaval caseiro, mas não menos animado.

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— Vou fazer bloco em casa, com meu pai e meu filho e, de preferência, de máscara — brinca. — Meu pai está numa felicidade enorme, porque vamos para a casa dele em Saquarema. Desde 2000 eu não saía do Rio nessa época. O carnaval aqui é tudo.

Apesar da enorme paixão pelo carnaval de rua, o folião-maratonista acredita que a decisão de cancelar os desfiles de blocos em 2021 foi totalmente acertada e pode servir para conscientizar a população de que a pandemia ainda não acabou. Kadinho também prefere esperar por uma vacina contra a Covid-19 para cair na folia com segurança e a consciência tranquila:

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— Seria muito egoísmo da minha parte e do público que ama carnaval achar que tem que ter bloco de qualquer jeito. Eu amo carnaval, mas ficar como a gente ficou, morrendo tanta gente, não dá. Quero ficar feliz com todo mundo feliz.

Desfile do bloco Cordão do Bola Preta 22.02.2020
Desfile do bloco Cordão do Bola Preta 22.02.2020 Foto: Cléber Júnior / Agência O Globo

A opinião é compartilhada pela dupla Renata Feler e Aran Rotbande. É deles o perfil @aboutcarnaval, que traz registros exclusivos dos blocos de rua do Rio. Os dois concordam que o momento é de cuidar da saúde coletiva, e folia nos moldes tradicionais pode ficar para depois.

— Carnaval é uma celebração e não tem como celebrar com 150 mil mortos — enfatiza Renata. — Tem muita gente na que vai fazer lives, que deve ser o formato do carnaval do ano que vem, e muita gente viajando.

Conscientes dos riscos de se aglomerar pelas ruas do Rio no carnaval, a Renata e Aran têm a preocupação de, inclusive, não incentivar os foliões. Por isso, mesmo que estejam pela cidade no período da folia, eles não pretendem fotografar ninguém.

— A gente com certeza não vai registrar. Eu acredito plenamente que vai ter gente saindo mesmo, mas não vamos registrar. Não é o momento de acontecer — afirma Aran.

Folia simbólica e com responsabilidade

Para Rita Fernandes, representante da Sebastiana, a Associação Independente dos Blocos de Carnaval de Rua da Zona Sul, Santa Teresa e Centro, a impossibilidade de levar os cortejos para a rua não significa que a folia não vai acontecer. A entidade pretende elaborar formas de reunir os apaixonados pelo carnaval, mas num formato diferente.

— Não existe uma condição segura para que a gente possa fazer o carnaval de rua. Mas não significa que a gente não possa fazer outras coisas. Podemos criar lives, eventos fechados, seguindo todas as normas, e eventos compartilhados — explica Rita.

Luis Otavio Almeida, representante da Desliga dos Blocos, propõe um “carnaval simbólico” no ano que vem:

— O carnaval não pode ser suspenso nem decretado. É uma festa popular. Ninguém tem essa alçada. O carnaval existe da soma das vontades de cada folião. Acredito muito na liberdade, mas também na responsabilidade que a acompanha. Os irresponsáveis negacionistas são os mesmos que sempre atacaram a festa mais popular do Brasil. Confio na capacidade do povo carioca de reinventar a festa e fazê-la de forma segura e responsável. Talvez este ano seja um carnaval mais simbólico, mas nunca suspenso. Em 2022, com a vontade acumulada, com certeza faremos o maior carnaval de todos os tempos.





Fonte: G1