Mesmo com troca por LED, reclamações de lâmpadas queimadas aumentam 20% no Rio


O programa Luz Maravilha, que iniciou a troca da iluminação pública carioca em fevereiro de 2021, com previsão de conclusão para dezembro deste ano, já substituiu cerca de 300 mil lâmpadas amarelas por luminárias de LED, o que corresponde a 67% do total de cerca de 450 mil pontos de luz do município. Mas isso não resultou em queda no número de reclamações. Pelo contrário: houve um aumento de 20% nos pedidos de reparo de lâmpadas — apagadas, fracas ou piscando — no comparativo entre o período de janeiro a abril de 2021 (quando foram feitos 35.078 chamados) e os mesmos meses deste ano, que acumulam 42.119 reclamações.

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Assim como em 2021, a reposição de lâmpadas lidera o ranking de queixas dos cariocas este ano, de acordo com dados da Central 1746. A RioLuz afirma, porém, que as luminárias não queimaram e apagam por causa da rede elétrica, que está obsoleta. Além disso, furtos de cabos desestabilizam o sistema.

Dados do 1746 de janeiro até abril
Dados do 1746 de janeiro até abril Foto: RioLuz e Central 1746

Na noite da última quarta-feira, o GLOBO percorreu bairros de diferentes regiões do Rio e constatou que muitas das novas lâmpadas de LED — que são mais duráveis do que as convencionais — já estão com problemas.

Às 18h, boa parte da Avenida Presidente Vargas, no Centro, tinha trechos com lâmpadas piscando. Poucos minutos depois, o mesmo problema foi constatado no entorno do Maracanã, na esquina da Rua Eurico Rabelo com a Avenida Professor Manoel de Abreu.

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Por volta das 20h, o problema se repetia na Avenida das Américas, na altura do Rio Design Barra, e também perto do Recreio Shopping (sentido Guaratiba). Ainda na Avenida das Américas, na altura da estação BRT Pedra de Itaúna, um trecho de quase um quilômetro estava completamente apagado às 21h30m.

Boemia insegura

Às 6h30m de quinta-feira passada, o pisca-pisca continuava na Avenida das Américas e no túnel do Elevado do Joá, sentido São Conrado. Na sexta-feira, por volta de 17h30, a Avenida Lúcio Costa, entre os postos 6 e 8, tinha lâmpadas apagadas e piscando.

Na Lapa, mais de uma dezena de luzes apagadas na Praça dos Arcos e na Avenida República do Paraguai deixa mais suscetível a assaltos a região, onde há grande concentração de moradores em situação de rua. É o que relata Bernardo Machado, que passa pelo local de segunda a sexta-feira, por volta de 19h:

— Passo aqui sempre atento, tiro até o fone do ouvido. As lâmpadas novas, assim que foram colocadas, melhoraram a escuridão. Mas, em pouco tempo, algumas apagaram. E é justamente onde não tem iluminação que os usuários de crack ficam. Tenho medo.

Penumbra nos Arcos da Lapa deixa região suscetível a roubos
Penumbra nos Arcos da Lapa deixa região suscetível a roubos Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

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A lâmpadas de LED usadas pelo Luz Maravilha têm vida útil de aproximadamente 70 mil horas. Uma vez que ficam acesas 12 horas por dia, podem durar mais de 15 anos. A RioLuz estima que, por serem muito mais econômicas do que as lâmpadas convencionais, os cofres municipais deixarão de gastar mais de R$ 100 milhões com iluminação pública em 2022. De janeiro até abril, essa economia supera R$ 39 milhões.

Rede elétrica antiga

Mas os apagões também se espalham pela Zona Sul. No Túnel do Pasmado, em Botafogo, fileiras de lâmpadas recentemente trocadas já não acendem. O trecho entre as galerias do Túnel Rebouças, no Cosme Velho, sofre do mesmo problema: oito das 16 luminárias de LED estavam apagadas.

Presidente da RioLuz, Pierre Batista argumenta que múltiplos fatores interferem na iluminação, como furto de cabos e instabilidade no circuito de energia.

— As luzes de LED não estão queimadas, mas apagadas. Um dos motivos das luzes piscarem é a situação da rede elétrica do Rio, que é muito antiga e obsoleta. A outra questão é o contínuo furto de cabos, transformadores e outros materiais que desestabilizam o sistema. Mesmo em vias onde os cabos são subterrâneos, a rede é totalmente interligada. Então, sempre pode haver interferência. A modernização da rede também está no escopo da PPP (parceria público-privada) da iluminação pública, mas é um processo que demora muito mais do que a troca das lâmpadas — afirma, acrescentando ainda que já foram substituídos 1 milhão e 350 mil metros de cabos.

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Dados do 1746 de janeiro até abril
Dados do 1746 de janeiro até abril Foto: RioLuz e Central 1746

Professor do curso de Engenharia Elétrica da Coppe/UFRJ, Edson Watanabe diz que, além dos fatores apontados pela RioLuz, deve se dar atenção a outras razões.

— Uma chuva forte ou ventania pode fazer a tensão de parte da rede elétrica cair e ocasionar instabilidade, fazer a luz piscar. As lâmpadas incandescentes, quando passam por oscilação, apagam ou ficam com a luz fraquinha. As de LED são mais resistentes, então, permanecem tentando acender em sua capacidade máxima e, quando não conseguem, piscam — explica.

No Catete, o Beco do Pinheiro recebeu quatro luminárias de LED este ano. Poucos meses após a revitalização, três delas já não funcionam. Marcele Piazi, moradora da Rua Dois de Dezembro, reclama: — A gente achou até que fosse melhorar, mas, com as luzes apagadas, continua escuro.

Na ciclovia da Lagoa, próximo ao Parque dos Pedalinhos, um corredor de 21 luminárias de LED apagadas faz com que muitos tenham receio de passar por esse trecho. O empresário Victor Salgado mora no bairro e costuma caminhar no entorno da Lagoa à noite, mas sem carregar nada valioso: — Desde o início da nova iluminação, algumas lâmpadas não funcionam. A iluminação é melhor do que a anterior, mas é inexplicável essa situação. Todos sabem dos crimes que já ocorreram na Lagoa. Então, saio de casa só com um celular velho, o do ladrão.

Beco do Pinheiro, no Catete: das quatro lâmpadas de LED da via, apenas uma funciona
Beco do Pinheiro, no Catete: das quatro lâmpadas de LED da via, apenas uma funciona Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

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Enquanto a rede não é totalmente modernizada, moradores continuam sofrendo com a iluminação precária, principalmente na Zona Oeste. Morador de Campo Grande desde que nasceu, Carlos Alberto Pieroni, de 37 anos, ressalta que, ao contrário das áreas periféricas, “a região central do bairro sempre recebeu investimentos”, o que pode explicar a antítese nos números.

— A Avenida Manoel Caldeira de Alvarenga, na altura da Uezo, nunca teve problemas de luz e já recebeu o LED. Nos três postes adiante, há luminárias amarelas. E, menos de um quilômetro depois, não há mais iluminação. A Estrada do Monteiro também tem muitos pontos importantes desassistidos — detalha.

PPP da iluminação

Firmada em fevereiro de 2021, a PPP da iluminação pública também prevê a instalação, até o fim deste ano, de três mil sensores semafóricos, dez mil câmeras (quatro mil com reconhecimento facial), cinco mil pontos de wi-fi, além da troca de 34.500 mil postes da RioLuz por postes de fibra. A empresa Smart Luz é responsável por troca, suporte, manutenção e operação dos equipamentos, inclusive se adequando às novas tecnologias que, eventualmente, possam surgir nos 20 anos de contrato.

Em contrapartida, a Smart Luz é remunerada com 54,5% da arrecadação líquida da taxa de Contribuição para o Serviço de Iluminação Pública (Cosip). Segundo a RioLuz, a arrecadação líquida com a Cosip em 2021 foi de R$ 62 milhões, sendo cerca de R$ 34 milhões pagos à concessionária.

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A Smart Luz informa que, a partir do 12º ano de concessão, efetuará a troca das luminárias de LED novamente, uma vez que a vida útil delas é de cerca de 16 anos. Disse ainda que há dois motivos para as lâmpadas piscarem: a situação da rede elétrica e a desestabilização do sistema devido ao constante furto de materiais como cabos e transformadores e que, ao implementar o programa Luz Maravilha, prefeitura e concessionária estavam cientes de, ao mesmo tempo, “modernizar o parque de iluminação pública e de fazer a manutenção da rede elétrica de mais de 25 anos”.

A concessionária afirma ainda que, até o fim de maio, serão instaladas cerca de 1.500 câmeras do total previsto em contrato, além de mais de 5 mil postes de fibra. Por fim, a Smartluz afirma que recebeu R$31,1 milhões em 2021 em contrapartida a investimentos superiores a R$ 450 milhões realizados, “demonstrando de fato que está, de forma ativa, sendo o maior investidor privado nas infraestruturas de iluminação pública da cidade do Rio de Janeiro”.

*Estagiário sob supervisão de Giampaolo Morgado Braga





Fonte: G1