Um carnaval que cabe na palma da mão mas que, apesar da escala reduzida, não deixa de encantar os apaixonados pelo mundo do samba. Desde 2014, a União das Escolas de Samba de Maquete (UESM) promove desfiles com agremiações em miniatura. Na brincadeira, bonecos ocupam o lugar dos componentes e alegorias são construídas em tamanho 25 vezes menor. Tudo sem deixar de ousar na criatividade com plumas e paetês. Em meio ao cancelamento do carnaval devido à pandemia de Covid-19, as apresentações podem ser uma maneira inusitada dos foliões matarem a saudade da festa.
— Encontramos nas maquetes a possibilidade de externalizar nosso amor pelo carnaval. Já havia ligas com competições de desenhos, mas muitos de nós não sabíamos desenhar. Foi a chance de fazermos carnaval virtual com diversão — conta Raphael Khaleb, de 34 anos, um dos fundadores da UESM.
As apresentações deste ano acontecem entre os dias 12 e 16 de fevereiro, datas que celebrariam o carnaval. A liga hoje abriga 52 escolas de todo país, sendo oito do Rio de Janeiro. As agremiações são normalmente formadas por famílias ou grupos de amigos, que confeccionam o desfile e criam os vídeos de exibição com filmagens, fotografias e técnicas de stop motion (quadro a quadro). Os enredos devem ser autorais, mas o samba-enredo pode ser reeditado de escolas reais com prévia autorização. Já as fantasias são modeladas para bonequinhos com pouco mais de cinco centímetros de altura.
Quem faz o carnaval de maquetes não esconde a paixão pela festa. É o caso do professor universitário Thiago Laurentino, de 30 anos, que mora em Vicente de Carvalho, Zona Norte do Rio, e tornou-se carnavalesco de maquetes em 2016, depois de muito aproveitar a folia em tamanho real.
— Eu sempre curti muito o carnaval. Desde os 7 anos, meu pai e meu tio me levavam aos ensaios da Mocidade Independente de Padre Miguel. Já desfilei em várias escolas, na Sapucaí e na Intendente Magalhães. Sou folião mesmo — garante Thiago, que criou a Independente Suburbana em 2019, escola que este ano terá como enredo “Alma pirata”, tema que abordará o tema da pirataria com samba reeditado da Imperatriz Leopoldinense de 2003.
A transmissão acontece pelo site e redes sociais da UESM. Depois, os desfiles ficam disponíveis nos canais do Youtube de cada agremiação. A avaliação fica por conta de jurados que dão notas de 9 a 10 em sete quesitos: evolução, enredo, fantasias, alegorias, comissão de frente, conjunto, mestre-sala e porta-bandeira. Assim como no carnaval real, as escolas são separadas em grupos especial, de acesso e de avaliação, com rebaixamento e ascensão.
— Muitas pessoas estranham, nos acham loucos. Mas ver o nosso trabalho pronto é um super reconhecimento. Já tivemos o apoio de carnavalescos como Max Lopes, Márcio Puluker e Alexandre Louzada. Muitos dos nossos artistas vão trabalhar em grandes escolas, como Vila Isabel e Paraíso do Tuiuti. Nós esperamos alçar novos voos. Quem sabe, na pandemia, nossos desfiles virem o centro das atenções no mundo do samba — conta Raphael
.
O representante comercial Lucas Leão, de 25 anos, começou ainda na adolescência a atuar no carnaval. Hoje, é fundador de uma escola de maquete.
— Minha história com o carnaval começou aos 14 anos quando comecei a trabalhar como aderecista de carros alegóricos na Cidade do Samba. Em 2014, vi um vídeo de um carnaval de maquete e criei a Acadêmicos do Novo Império — afirma ele, que desenvolve o enredo “Terra a vista”, que conta sobre a expedição de Pedro Álvares Cabral sob um olhar lúdico. — Podem esperar um grande desfile, algo jamais visto na história da escola de São Gonçalo.
O casal Roberto Eloy e Rosangela Mathos já foram campeões de samba-enredo em escolas tradicionais do Rio. Hoje, eles estão à frente da Cambaxirra do Andaraí, que desfila no grupo de avaliação. Para a apresentação de 2020, os dois vão apresentar um enredo pronto desde 1998 com samba inédito.
— Eu desenvolvi um enredo que ficou guardado durante 23 anos, sobre o beijo. É um tema que fala desde o nosso nascimento, quando recebemos um beijo do anjo, até o beijo da morte, passando por beijos famosos na história e músicas que falam de beijo. Nossa escola está pronta — detalha Eloy, convocando o público a assisti-los. — Como em 2021 não terá carnaval, os desfiles de maquete estão aí para você curtir a festa de dentro de casa.
Fonte: G1