Idoso com suspeita de Covid-19 morre à espera de leito em hospital público


Após descumprimento de ordem judicial para transferência hospitalar, o aposentado Carlos Alberto Correia de Lima, morreu ontem (28) aguardando por uma vaga, sob suspeita de Covid-19. O caso do idoso de 65 anos não é isolado. Segundo a Defensoria Pública, a demanda de pedidos do tipo vem crescendo bastante nas últimas duas semanas, agravando ainda mais a situação da saúde no Rio.

Segundo a filha de Carlos Alberto, Carla Santos de Lima, de 33 anos, o pai foi internado na UPA de Rocha Miranda na última quarta-feira (25). Ele já havia passado por um médico particular, que tinha detectado comprometimento do pulmão dele através de um exame de raio-x. O profissional chegou a expedir um encaminhamento para o Hospital Municipal Raul Gazolla, em Acari, na Zona Norte do Rio, mas apenas encaminhamentos feitos pela própria rede pública são aceitos na unidade.

Carlos Alberto Correia de Lima, que tinha sintomas de Covid-19, morreu à espera de um leito
Carlos Alberto Correia de Lima, que tinha sintomas de Covid-19, morreu à espera de um leito Foto: Acervo pessoal

Sem ter como custear a internação do pai na rede particular, Carla diz que procurou a UPA, onde Carlos Alberto foi prontamente internado e respirava com a ajuda de um cateter de oxigênio, enquanto aguardava a transferência para um leito de hospital com equipamentos suficientes para tratá-lo. Devido ao seu estado grave e por ter hipertensão, obesidade e diabetes, no dia seguinte da internação na UPA, a família do paciente solicitou a defensoria pública, que expediu duas ordens determinando a transferência imediata do aposentado: a primeira à meia-noite da última sexta-feira (27) e outra pela noite do mesmo dia. Porém, a vaga concedida no Hospital Pedro II, em Santa Cruz, só foi liberada no sábado (28), quando Carlos Alberto morreu dentro de uma ambulância, em frente a unidade.

– O meu pai trabalhou a vida inteira na rede ferroviária. Após muitos anos na justiça, conseguiu o dinheiro atrasado de sua aposentadoria, que saiu só em agosto. Mas, infelizmente, quando ele teve a oportunidade de ter um pouquinho de sossego, após de uma vida inteira de trabalho, foi negligenciado e não teve a como vivenciar a tranquilidade da aposentadoria dele junto a família que lutou tanto para dar uma vida digna – desabafa Carla que vai entrar na justiça contra a negligência.

Apesar de ainda não conseguir precisar números, a defensora Thaisa Guerreiro diz que tem notado uma crescente na demanda de pedidos por internação hospitalar nas últimas duas semanas. O que confirma o temor da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, sobre uma segunda onda de pico da pandemia pós o anúncio do fechamento dos hospitais de campanha com a baixa dos casos, no final de julho.

– Àquela época, já era para a Secretaria Municipal de Saúde e a Secretaria Estadual de Saúde terem sentados juntas para elaborarem um plano de contingencia para preparar quais leitos seriam utilizados na hipótese de uma segunda onda. O posicionamento da Defensoria Pública foi cobrar um plano para esse momento, que submetemos às secretarias, à época, por meio de ofício – afirma.

A defensora pública ressalta que o que tem observado em anos de experiência é uma demora no cumprimento das ordens judiciais cada vez maior. Ainda de acordo com ela, mesmo antes da pandemia, a média de espera já era de 72 horas, mesmo diante de uma decisão judicial imediata.

– Quando chegam na defensoria para fazer uma ação, geralmente, já estão aguardando uma transferência na UPA ou emergência por pelo menos 48 horas. Esse é um tempo de espera que vai se somando. Como o poder público não cumpre a ordem judicial, muitas vezes essa espera se torna fatal.

No caso de Carlos Alberto, assim como em diversos outros, a ordem judicial determinava multa para as secretarias de saúde em caso de descumprimento da transferência imediata e a opção de transferência custeada para a rede privada, em caso de lotação da pública. Mas as medidas não surtiram efeito no prazo previsto.

– Como não conseguimos executar essa multa de forma rápida, por questões jurídicas, acaba que ela não tem muita efetividade. Então, o poder público se sente confortável e estimulado a descumprir a ordem judicial porque medidas mais efetivas não são tomadas – lamenta a defensora.

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde informa:

– O paciente foi transferido tão logo a central de Regulação do estado conseguiu uma vaga, no sábado (28). Infelizmente, Carlos Alberto sofreu uma parada cardiorrespiratória quando já estava em frente ao Hospital Pedro II, para onde estava sendo transferido. A RioSaúde se solidariza com a família neste momento de dor e informa que durante a internação na UPA de Rocha Miranda, o Sr. Carlos Alberto recebeu toda a assistência devida ao quadro que apresentava.





Fonte: G1