Homem com obesidade mórbida luta há mais de dez anos por cirurgia bariátrica no Rio


Márcio Ribeiro Nunes, de 39 anos, morador em Sulacap,na Zona Oeste do Rio, vive há dez anos um drama que parece não ter fim. Obeso mórbido pesando cerca de 270kg, segundo última pesagem feita há quatro meses, ele tenta desde 2010 fazer uma cirurgia bariátrica que garanta uma melhor qualidade de vida, sem sucesso. De lá para cá, já entrou e saiu da fila do Sistema de Regulação (Sisreg), recorreu à justiça para voltar, mas não foi atendido. Quando finalmente estava perto de retornar, apareceu um novo problema, dessa vez na tireoide, que ele precisa operar antes e que o fez entrar de novo na lista da regulação. Enquanto isso, a operação de redução de estômago segue em compasso de espera.

— Meu principal objetivo é conquistar minha cirurgia bariátrica. Venho lutando há vários anos para que eu possa ser operado. Essa é minha maior dificuldade hoje em dia. Toda vez que sou contemplado (com encaminhamento), chega na hora a porta se fecha. Quero voltar a ter uma vida digna — apela o paciente.

A primeira vez que Márcio achou que estava perto de realizar a bariátrica foi em 2011, quando ainda pesava 215 kg. Na ocasião, ele foi encaminhado para o Hospital Adventista Silvestre, que é particular, mas como a família não teria recursos para pagar por alguns procedimento cobrados, desistiu. Demorou mais cinco anos para surgir uma nova esperança de final feliz. Dessa vez, já com 240 kg, o paciente foi encaminhado ao Hospital dos Servidores, que alegou não ter estrutura para atender um obeso mórbido.

Márcio Ribeiro Nunes tem 39 anos e pesa 270kg
Márcio Ribeiro Nunes tem 39 anos e pesa 270kg Foto: Brenno Carvalho

A família de Márcio acusou o hospital de não ter devolvido a chave do Sisreg (documento contendo todo o histórico do paciente), o que fez com que ele só conseguisse tentar novo retorno à fila do Sisreg dois anos mais tarde, com ajuda do Posto de Saúde Professor Massao Goto, onde é atendido desde o início de sua saga. Isso depois de ter buscado, sem sucesso um recurso na Justiça para obter o documento. Mas, aí surgiu o problema da glândula no pescoço, que virou prioridade, e o levou de volta ao Sisreg.

— O médico da clínica da família disse que não tem como fazer a bariátrica antes de resolver o problema da tireoide. Por meio do Sisreg ele foi encaminhado ao Gaffrée e Guinle. Já fez todos os exames, mas como é uma cirurgia de risco, precisa de um CTI disponível. Era para ter sido operado entre fevereiro e março, mas por causa da pandemia alegaram não haver vaga. Esperamos desde janeiro, já estamos chegando em março e ele ficando cada vez mais chateado e desesperançoso — contou Lydiane da Silva Castelano Nunes, ex-mulher de Márcio e que o tem ajudado nessa via crúcis.

Márcio já era uma criança gorda, mas a obesidade se agravou na vida adulta. Entretanto, nunca o impediu que fosse uma pessoa ágil e independente. Ele já trabalhou como fiscal de transporte alternativo e fazendo o transporte de passageiros, com um carro de passeio, tendo uma clientela fixa. O veículo foi apreendido numa blitz, por suspeita de clonagem. Hoje, ele lamenta ter sua mobilidade reduzida.

— Sou uma pessoa sedentária. Não consigo fazer nada, não posso trabalhar e exercer minha função como pai e chefe de família. Fico sempre jogado nos cantos, de mãos atadas. O apelo que eu gostaria de fazer é que queria ter uma vida digna. Não quero nada a mais, só ser operado e ter uma vida correta. É um direito que eu tenho. Quero ser operado para poder voltar a trabalhar, sustentar minha família e trazer o pãozinho de cada dia para dentro de minha casa — pede.

Márcio vive num imóvel de fundos. A residência é emprestada por um parente e precisou ter portas e janelas ampliadas para se adaptar ao seu tamanho. Não paga aluguel, mas tem uma despesa mensal de cerca de R$ 650, com água, luz e internet, entre outras, que são bancadas pelo filho mais velho, de 21 anos.

Atualmente, até para tomar banho e se alimentar precisa de ajuda. O problema da tireoide dificulta o sono e o obriga a dormir sentado. E, durante o dia, para pegar um pouco de sol, caminha com lentidão até o quintal. Sem condições de trabalhar, recorrei ao INSS em busca do benefício de prestação continuada a pessoa com deficiência, que foi negado. Pai de dois filhos – tem também uma menina de 13 -, ele lamenta que a obesidade o tenha impedido de acompanhar mais de perto o crescimento deles.

— A cirurgia (bariátrica) é importante para mim porque com ela vou ter uma vida nova. Como a que tinha na minha adolescência e juventude. E poder acompanhar o resto da vida dos meus filhos, já que não pude acompanhar a infância deles. É uma tristeza ficar travado dentro de casa com um peso constante carregando para cima e para baixo – afirma.

Procurado, o Hospital Gaffrée e Guinle afirmou que “a cirurgia do paciente é do tipo complexa” e que, em virtude da pandemia, há “uma lista grande de casos de câncer como prioridade, que necessitam do mesmo grau de complexidade operatória”. Segundo a unidade, a cirurgia de Márcio, relativa a “um caso benigno”, acontecerá, a princípio, na segunda quinzena de março.

Já a Secretaria estadual de Saúde, por meio da Central Estadual de Regulação (CER), informou que “o paciente não está inserido no Sistema Estadual de Regulação, o que é feito pelas unidades de origem dos pacientes”. O órgão conclui: “Cabe ainda ressaltar que as unidades citadas na demanda não são de gestão da rede estadual e que o Sisreg é de responsabilidade do município”.

O INSS, por fim, enviou a seguinte nota:

“O segurado ingressou com ação judicial, e conforme o decreto 3.048/99, Art. 307, a propositura pelo interessado de ação judicial que tenha por objeto idêntico pedido sobre o qual verse o processo administrativo importará renúncia ao direito de contestar e recorrer na esfera administrativa, com a consequente desistência da contestação ou do recurso interposto. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020). O segurado deve consultar seu advogado quanto ao andamento do processo.”





Fonte: G1