Alvo de investigação do Ministério Público, a Fundação Ceperj pediu em junho à Secretaria estadual de Fazenda para continuar a fazer os pagamentos da folha secreta na boca do caixa até o fim das eleições. Ofícios obtidos pelo GLOBO mostram que, desde maio, o órgão era alertado pelos técnicos da Contabilidade Geral do Estado de que saque em dinheiro no banco não é o padrão utilizado pelo governo. No entanto, a Fazenda acabou permitindo que as transações continuassem até 5 de novembro, seis dias após o segundo turno.
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Os alertas começaram no dia 10 de maio quando uma servidora enviou um comunicado por e-mail ao Ceperj, às 15h, questionando a forma de pagamentos. Uma hora depois, Renato da Silva Vicente, chefe de departamento da fundação, respondeu explicando que o Ceperj tem um “sistema de pagamentos avulsos”, que é enviado diretamente ao banco. Além de a maioria das retiradas ser na boca do caixa, a identificação do dinheiro na saída dos cofres do governo era feita apenas com o nome do programa, como um credor genérico, e não individualizada (com os dados dos funcionários que faziam os saques). Esse modelo também é alvo de investigação do Tribunal de Contas do Estado (TCE), pois dificulta a fiscalização do destino dos recursos.
Nessa resposta, Vicente ainda pediu a compreensão da Fazenda porque o volume de pessoas que deveriam ser cadastradas no sistema era “descomunal” e colocaria em risco a continuidade dos projetos. A troca de e-mail continuou, e, uma semana depois, o superintendente Celso Borba, da Secretaria de Fazenda, reiterou que o pagamento de qualquer tipo de serviço contratado deve ser feito por meio do sistema de contabilidade do governo estadual — usado por todas as pastas. Borba ainda ofereceu ajuda dos servidores da pasta para incluir todos os dados no sistema, o que inclusive facilitaria as folhas futuras. Este ano, o Ceperj fez cerca de 90 mil pagamentos a mais de 27 mil pessoas. Denúncias de indicações políticas e funcionários fantasmas são investigadas.
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Outro ofício de 23 de junho voltou a citar o mesmo assunto, mas em um novo processo. Desta vez, Gabriel Rodrigues Lopes, então presidente do Ceperj, enviou um e-mail ao secretário estadual de Fazenda, Leonardo Pires. No texto, ele escreveu que a fundação tem um sistema próprio de pagamento, que dá “celeridade ao ato administrativo” e permite o recebimento dos valores por quem não possui conta-corrente. Citando 25 mil colaboradores por mês, repete que o volume é muito grande para cadastrar todos e pede 120 dias para “possível adaptação e mudança de pagamentos exigidas”.
Com o pedido de prazo, Leonardo Pires encaminhou, no dia 8 de julho, o processo para que servidores da pasta tomassem as providências cabíveis após sua ciência. Era o sinal verde para deixar a solução apenas para depois das eleições. Três dias depois, Yasmin da Costa Monteiro, subsecretária de Contabilidade Geral, determinou que, durante os 120 dias, a fundação encaminhe o cronograma de cadastramento.
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Apesar dos alertas da Secretaria de Fazenda e do pedido do Ceperj para continuar com um sistema de pagamentos avulsos, o governador Cláudio Castro afirmou na semana passada que, desde novembro de 2021, governo exigia a “bancarização” ao Bradesco, mas que não foi atendido. Esse não foi o pedido feito ao banco em fevereiro. Daniel Feliz Tavares Junior, diretor administrativo e financeiro do Ceperj, solicitou a quebra do floating bancário — ou seja, reduzir o prazo entre o depósito das ordens bancárias e a disponibilização do saque. A justificativa foi de que o prazo de praxe colocaria em risco a continuidade dos projetos do órgão.
O Bradesco informou que a prestação dos serviços “está de acordo com as regras previstas no contrato firmado e no edital de licitação, bem como nas diretrizes regulatórias vigentes”. Em nota, a Secretaria estadual de Fazenda divulgou que, desde março, vem orientando o Ceperj a incluir os dados no Sistema Integrado de Gestão Orçamentária, Financeira e Contábil do Rio (Siafe-Rio), “de modo mais detalhado, garantindo a plena rastreabilidade dos valores”. A pasta também afirmou que “o governo vinha exigindo do Bradesco a bancarização dos funcionários do Ceperj” desde novembro.
Fonte: Portal G1