A Fundação Ceperj, investigada pelo Ministério Público do Rio, pagou em sua folha secreta salários para 46 políticos que disputam as eleições deste ano. Um levantamento feito pelo GLOBO com base em dados cruzados pelo MPRJ com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra a teia política instaurada nas contratações nos meses que antecedem o pleito de outubro. O grupo ganhou mais de R$ 650 mil em 171 pagamentos — muitos direto na “boca do caixa”.
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Ao todo, os nomes pertencem a 16 partidos, a maioria da base aliada do governador Cláudio Castro (PL), que tenta a reeleição. A legenda campeã de cargos secretos é o MDB, partido do candidato a vice-governador Washington Reis, com nove correligionários que, ao todo, receberam R$ 101 mil do Ceperj. Procurado, o presidente da executiva estadual, o deputado federal Leonardo Picciani, não retornou a ligação.
Candidata a deputada federal pelo MDB, Gabriela Souza Thinnes, a Sou Gaby, recebeu R$ 4.502 em duas parcelas, sacadas na “boca do caixa”. Sem ter formação em Educação Física, ela diz ter dado aulas de ginástica funcional nas imediações do Parque Royal, na Ilha do Governador, junto com um amigo. Gabriela afirma achar normal ter recebido dinheiro direto na caixa do banco.
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— Essa história de candidatura apareceu depois. Você sabe que quem trabalha com a política se movimenta. Quem me indicou foi o Ângelo, que não é candidato — disse ela, sem revelar o sobrenome do padrinho.
Na semana passada, o GLOBO já havia mostrado que um levantamento feito pelos promotores na lista do Ceperj tinha encontrado 2.058 pessoas que receberam da Fundação através de ordens de pagamento e foram candidatas em eleições realizadas de 2000 a 2020. Na lista há candidaturas para vereadores, prefeitos, deputados e até suplência para o Senado Federal. Agora, candidata a vice-prefeita do Rio em 2020, na chapa de Paulo Messina, Sheila Barbosa tenta novamente se eleger. Este ano, a psicologa do MDB, que buscará uma vaga na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), recebeu sete ordens de pagamento que, somadas, chegam a quase R$ 38 mil. Sheila desligou o telefone ao saber que a reportagem era sobre o Ceperj e não retornou mais as ligações.
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Já no PP, um dos que almejam voltar à cena política é o ex-vereador e ex-deputado Marcelino D’Almeida, que concorre à Alerj. O candidato disse que foi indicado a o cargo pelo ex-secretário de Governo Rodrigo Bacellar (PL), também candidato este ano.
— Botaram a gente para fazer um levantamento das demandas da população. Sabem que sou político e conheço as pessoas e as comunidades da Zona Oeste como Magalhães Bastos, Realengo, Bangu e Padre Miguel. Fiz alguns relatórios, de forma oral e por e-mail — contou Marcelino.
Redutos eleitorais
O dentista Bruno Chagas, candidato a uma vaga a deputado federal pelo PMN, terceiro partido com mais representantes na lista secreta, recebeu R$ 15.853,40 em cinco ordens de pagamento. Em suas redes sociais, Bruno Chagas agradece a seu “irmão da política” Rodrigo Bacellar, que não respondeu os contatos da reportagem.
Ao todo, na lista das próximas eleições estão 27 nomes que buscam uma cadeira na Alerj e outros 19 na Câmara dos Deputados, em Brasília. Apesar de haver menos candidatos a federal, eles receberam mais do Ceperj do que os postulantes a deputado estadual. Quem faz campanha para o Congresso recebeu R$ 330 mil no total, enquanto os candidatos à Alerj ganharam R$ 326 mil.
A capital é a cidade com mais candidatos que receberam ao menos um pagamento na lista de cargos secretos, com 21 nomes. Na Baixada Fluminense, em seis municípios, há outros 12 candidatos. As outras 13 candidaturas estão espalhadas por cidades como Itaperuna, Campos e Petrópolis.
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Por partido, o Podemos é o segundo com maior número de contratados, porém, seus filiados foram os que receberam mais verbas da Fundação. São oito candidatos que ganharam ordens de pagamento do Ceperj que somam R$ 180 mil. Secretário estadual de Trabalho e presidente da executiva estadual da legenda, Patrique Welber diz não ver nada demais em candidatos estarem na lista. A pasta tinha convênio com o Ceperj, no programa Casa do Trabalhador.
— Se eles trabalharam, qual é a ilegalidade de terem recebido? Como também não há qualquer impedimento de serem candidatos — disse Patrique.
Um dos nomes do partido na lista é Manoel Figueiredo, candidato à Câmara de Deputados, que apenas este ano recebeu R$ 44 mil. Em 2012, ele foi candidato a vice-prefeito de Caxias, na chapa de Washington Reis, que não se elegeu. Manoel não foi localizado pela reportagem.
Exclusão de candidatura
O único partido a reagir à presença de quadros na lista foi o PSOL. Ao saber pelo GLOBO que a advogada Rafa Galassi, com reduto eleitoral em Campos, recebeu pelo Ceperj, o presidente estadual, Mário Barreto, decidiu excluí-la da nominata da Alerj.
“O PSOL foi o principal denunciante do esquema construído por Cláudio Castro junto ao Ceperj. Quaisquer filiados que tenham mantido vínculos sem comprovação de exercício de suas funções terão suas candidaturas excluídas e serão encaminhados ao Conselho de Ética com pedido de expulsão”, se manifestou Mário, por nota.
Rafa, também por nota, disse que participou de um processo seletivo e trabalhou para o Ceperj por três meses e prestará todos os esclarecimentos ao partido.
Procurado, o Ceperj afirma que uma auditoria apura todas as contratações. E caso irregularidades sejam identificadas, “todas as medidas necessárias serão tomadas e divulgadas tão logo a auditoria seja finalizada”.
Fonte: Portal G1