Filha se casa em hospital para realizar desejo da mãe com câncer em estágio avançado de participar da cerimônia


O casamento da advogada Tatiane França Martins, de 27 anos, com o assistente administrativo Rafael da Costa Coutinho, de 33, estava marcado para o dia 4 de novembro. Desde o início do ano, a mãe da noiva, Mirsa Maria França Martins, de 58, esteve envolvida com os preparativos e seu maior sonho era ver a filha entrar na igreja. Mas, há cerca de dois meses foi surpreendida pelo avanço de um câncer no intestino, contra o qual já luta há dois anos e precisou ser internada. O agravamento da doença precipitou a cerimônia, que foi antecipada para a última sexta-feira, no Hospital Quinta D’Or, em São Cristóvão, na Zona Norte do Rio, para que a paciente pudesse participar.

— Foi algo muito especial, porque eu e a minha mãe já sonhávamos com esse casamento há muito tempo. Minha irmã mais velha já se casou e faltava eu. Ela planejava tudo nos mínimos detalhes e sonhava com esse dia. A maior preocupação dela era não estar bem para estar aqui com a gente em novembro. Foi um sonho possibilitar que ela participasse disso, porque não sabemos como vai ser daqui para a frente. Foi lindo demais e emocionante — disse a advogada, que mora em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, e tem outra irmã de 8 anos.

Mirsa, com a filha, o genro e a pinsher Nina, acompanhou tudo deitada numa maca
Mirsa, com a filha, o genro e a pinsher Nina, acompanhou tudo deitada numa maca Foto: Daniel Resende / Divulgação Instituto Rope

A cerimônia, que durou pouco menos de meia hora, para poupar a paciente que acompanhou tudo deitada numa maca, foi realizada no auditório do hospital, localizado no 10º andar, e celebrada pelo capelão Bruno Oliveira, na presença de poucos convidados, dois deles bem especiais: o pai de Mirsa, Daniel, de 92 anos, e a pinsher Nina, que é o xodó dela. A cadelinha entrou acompanhada do neto dela, Bernardo, de 3, que levou as alianças dos noivos. Tatiane contou que foi pega de surpresa porque a iniciativa não partiu dela e sim da ONG Instituto Rope, que se dedica a realizar o desejo de pacientes de doenças graves, em parceria com o hospital.

— Eles ficaram sabendo pelos médicos do hospital que acompanhavam a minha mãe, porque ela contava isso para todo mundo. Eu só fui saber quando eles ligaram pra mim perguntando se eu topava fazer (o casamento no hospital). Foi tudo muito rápido. Em dois dias eles já arranjaram tudo. Só entramos praticamente com os convidados e a cadela — contou a jovem, dizendo que a presença da cadelinha também era para atender um desejo da paciente, já que ela e o animal eram inseparáveis.

A doença da mãe dela foi descoberta em 2019, quando iniciou o tratamento, e se agravou há cerca de dois meses. Mirsa se internou há um mês. Segundo a filha, os médicos não dão muita esperança porque o câncer está em estágio muito avançado e já teria se espalhado por outros órgãos. Mas, Tatiane, que não desmarcou a cerimônia oficial no começo de novembro, ainda acalenta o sonho de poder contar com a presença da mãe:

— Para Deus nada é impossível — diz a jovem.

Equipe do hospital ajudou a organizar cerimônia
Equipe do hospital ajudou a organizar cerimônia Foto: Daniel Resende / Divulgação Instituto Rope

A terapeuta ocupacional do Quinta D’Or, Diana Amar, que acompanha a mãe de Tatiane acredita que uma ação como essa é importante para a paciente, para a família dela e toda a equipe do hospital. A profissional acha que mesmo com a decisão da noiva em manter a cerimônia oficial em novembro, certamente a que vai ficar mais marcada será a realizada no hospital, para atender o desejo da mãe dela.

— A gente está lidando com pessoas que estão no fim da vida e se puder mudar aquele momento é importante.Naquele instante que durou a cerimônia ela parou de pensar na dor e no sofrimento. Isso faz diferença na vida de qualquer um e principalmente de quem está na situação dela, passando por esse momento delicado.Se eu, como terapeuta ocupacional, puder mudar a vida dela nem que seja por uma hora ou vinte minutos, já fiz bem o meu trabalho— destaca a profissional.

A ONG Rope, que realizou o sonho da paciente, atua no Brasil há cinco anos e, inspirada numa iniciativa holandesa, realiza desejos de pessoas como Mirsa, acometidas por doenças graves que ameaçam suas vidas. A organização não governamental possui 17 diretores e mais de 80 voluntários e tem investido em ações parecidas em diversos estados, além do Rio e de São Paulo, em parceria com hospitais como o Inca, Servidores do Estado, Gafrrée Guinle, Pedro Ernesto, da Lagoa e outros.

Somente no Rio já foram mais de 60 sonhos realizados, que vão de festa de 15 anos a casamentos. Tudo é feito com a ajuda dos voluntários e com doações. Um dos sonhos realizados pela ONG, em fevereiro desse ano, foi o de uma idosa de 92 anos, amante dos pássaros e que desejava voar de asa delta, de forma virtual.

— Nossa missão é realizar sonhos de pessoas que têm suas vidas ameaçadas por doenças graves. Buscamos satisfazer aquilo que é a razão da vida dessas pessoas e que deixa uma tatuagem emocional inclusive na gente. Quem participa de um negócio desse nunca mais consegue esquecer. Deixa a vida mais colorida — avalia Roberto Palmeira, criador da ONG da qual é diretor de sonhos.





Fonte: G1