Escolas de samba preparam o ‘carnaval dos carnavais’; duas agremiações terão a Covid como protagonista de seus desfiles em 2022


Com a declaração do prefeito Eduardo Paes de que a cidade pode ter carnaval, caso o cronograma de vacinação seja cumprido, as almas foliãs ganharam um conforto de esperança. Segundo ele, com o avanço da imunização, a folia poderá ocorrer em fevereiro de 2022, e tem tudo para ser “o carnaval dos carnavais”. Entre as escolas de samba, duas agremiações — a São Clemente e a Viradouro — estão com enredos que colocam a pandemia de Covid-19 em evidência. Há ainda quem queria virar a página da pandemia e nem ouviir falar em doença, como é o caso da Mangueira.

Na Viradouro, o enredo escolhido é “Não há tristeza que possa suportar tanta Alegria”, que recorda o carnaval de 1919, o primeiro depois de outra pandemia, a da gripe espanhola. Já a São Clemente trocou o seu enredo este mês para homenagear o ator Paulo Gustavo, que morreu vítima da Covid-19. A sugestão foi feita pelo comentarista de carnaval Milton Cunha, que lembrou de um desfile em que encontrou o ator na passarela.

O ator Paulo Gustavo morreu vítima de Covid-19
O ator Paulo Gustavo morreu vítima de Covid-19 Foto: VICTOR POLLAK / Handout

— Achei ele muito humilde no desfile. Ele é símbolo da crise da Covid-19. E este vai ser o carnaval do pós-Covid, em que a gente vai aplaudir, celebrar, respeitar quem morreu, e dizer que nós que ficamos vamos honrar. A São Clemente trazer o Paulo para a avenida honra a alegria brasileira. Acho que vai ser uma epifania e uma catarse — conta Milton.

O carnavalesco da escola, Tiago Martins, pretende fazer um desfile a altura do homenageado.

— A perda do Paulo mexeu com o mundo. A gente olha a imagem dele e não acredita que ele se foi. Todas as mortes impactam. Mas o Paulo transmitia a alegria. Agora a gente precisa conversar com a família. Como folião, a gente está com este grito engasgado — explica Thiago, sobre o enredo que foi batizado de “Minha vida é uma peça”.

Já na Viradouro, atual campeã, o desfile irá promover um momento histórico, tal como foi o maior carnaval do século passado, em que a população ficou um mês comemorando.

— Nós entendemos que esse próximo carnaval terá um valor psicológico para cidade. Será um tributo à vida, à retomada da nossa realidade. Entendemos o valor que o carnaval possui para o brasileiro e o carioca. Por isso mergulhamos na história do carnaval de 1919, que marcou a despedida da gripe espanhola no Rio, e virou a página da história para os cariocas — explica carnavalesco Marcus Pereira, que divide os trabalhos com Tarcísio Zanon.

Entrevista: Leandro Vieira, carnavalesco da Mangueira: ‘Vamos celebrar o que temos de mais valioso: a poesia, o canto e a dança’

Leandro Vieira, carnavalesco da Mangueira
Leandro Vieira, carnavalesco da Mangueira Foto: Ana Branco / Agência O Globo

Como está a sua expectativa?

Hoje, vemos um momento de restrições e falta do convívio social. Quando o prefeito anuncia que o poder público tem uma expectativa positiva, acho que devemos fazer este exercício de manutenção da nossa sanidade. Manter esta ilusão e otimismo, neste momento, pode ser saudável. Temos que levar em consideração que tem trabalhadores desempregados.

Será mesmo o “carnaval dos carnavais”?

Tenho certeza, não por conta da beleza e luxo da festa, mas por estar em um período que poderemos celebrar que a vida venceu a morte. Isso será celebrado com festa. Vamos externar uma alegria que está repreendida e um sentimento de posse das ruas que está enclausurado. Acho que o maior carnaval será feito individualmente, de modo que cada um de nós estará imbuído dessa vontade de viver.

(FILES) Handout file photo released by O Globo TV and taken on December 03, 2019, of Brazil's comedian and actor Paulo Gustavo posing in Rio de Janeiro, Brazil. - Paulo Gustavo, one of Brazil's bes...

Essa menção a pandemia certamente não estará presente no meu carnaval. Questões sociais certamente estarão. A própria escolha de homenagear três pretos favelados é uma escolha política que guarda muito os contornos sociais. Estes nomes que mostram que a favela pode vencer têm um tom político muito grande. Quando houver esta festa, a Mangueira irá celebrar aquilo que ela tem de mais valioso, que é a poesia, o canto e a dança. Escolhi um nome associado a cada uma delas. Sem essas coisas três do morro da mangueira, esta festa não está completa. Esta é a nossa contribuição.

Volta ao trabalho

Por enquanto, o carnaval de 2020 não foi desmontado na Cidade do Samba, mas já há expectativa para liberação do local que havia sido interditado. Esta semana, será realizada uma vistoria do Corpo de Bombeiros, depois de a Liesa ter cumprido as exigências de instalações de equipamentos de combate a incêndio. Segundo o presidente da Liga, Jorge Perlingeiro, a expectativa é que ela volte a funcionar dentro de um mês e que a prefeitura reinstale os equipamentos perdidos no incêndio. A prefeitura quer um destacamento do Bombeiros dentro da Cidade do Samba.

— Nossa maior preocupação no momento, é com os colaboradores e artesãos dos barracões, além dos fornecedores que dependem da indústria do carnaval para sobreviverem. A Cidade do Samba emprega muitos trabalhadores. Neste momento, muitos deles tem necessitado da volta aos trabalhos para manterem suas vidas e de suas famílias — explica Marcus Pereira, acrescentando: — Os trabalhos nos barracões podem recomeçar assim que tivermos o local liberado.

Em contrato a ser assinado entre a prefeitura e a Liesa, deve haver uma previsão de adiamento dos desfiles para julho, caso as metas de vacinação não sejam alcançadas.





Fonte: G1