Atualmente importada praticamente em toda a sua totalidade, o manejo tropical do lúpulo na Serra Fluminense visa desenvolver o mercado cervejeiro nacional com cadeias produtivas locais, estruturando o início da exploração da matéria-prima.
Extensionistas da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Rio de Janeiro (Emater-Rio) participaram da construção de um guia especial sobre o manejo do lúpulo nas condições climáticas da América Latina, relatando a produção fluminense como modelo experimental a ser seguido. A publicação “Produção de Lúpulo na Região Serrana Fluminense: Manual de Boas Práticas” contou com 30 autores ao todo e está disponível gratuitamente para download.
O documento vem sendo catalogado desde 2017, quando a espécie foi introduzida na região, por pesquisadores de múltiplas áreas, como engenheiros agrônomos, zootecnistas, médicos veterinários, geógrafos, biólogos, entre outros, associados ao Polo Cervejeiro Artesanal de Nova Friburgo e região (PCA-NF). O manual pode ser encontrado no site da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que foi uma das entidades técnicas envolvidas no processo, pelo link https://bityli.com/WnSBiO.
Segundo o chefe de Desenvolvimento Rural da Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Rio de Janeiro (SFA-RJ), Celso Merola Junger, o guia é divulgado em momento oportuno no âmbito do mercado de consumo, visto a grande quantidade importada de lúpulo para abastecer a produção cervejeira do País. O primeiro capítulo esboça um histórico da produção do lúpulo no estado e os avanços da rede de fomento à cultura, desde eventos temáticos, como a Festa da Flor do Lúpulo, à importância das diferentes fontes de financiamento para a comercialização de mudas.
“O manual traz informações técnicas sobre manejo de solo e água e a condução da cultura do lúpulo, envolvendo recomendações de calagem, adubação e irrigação, bem como de plantas de cobertura. Como não existem produtos registrados aqui para o plantio do lúpulo, é recomendado ao manejo fitossanitário o controle preventivo ao agente causal. No pós-colheita, foram vistos teores das resinas alfa e beta ácidos compatíveis com os itens importados pelas cervejarias. O mercado local da flor in natura e desidratada está se abrindo e deve ser construído socialmente pelos produtores, indústria, gestores públicos, técnicos e consumidores”, explicou.
O engenheiro agrônomo e extensionista rural da Emater-Rio, Alexandre Teixeira, foi um dos principais articuladores da pesquisa e relatou que antigamente era considerado impossível produzir lúpulo em regiões com latitudes diferentes da região de origem. A espécie é oriunda do Hemisfério Norte, na faixa de latitude de 35° a 55°. Fazendo uma linha paralela ao Hemisfério Sul, de acordo com ele, o lúpulo teria ótimo desenvolvimento e produtividade do sul do estado do Rio Grande do Sul até a Patagônia.
“Por ser uma espécie influenciada pelo fotoperíodo (exposição diária ao sol), nessas condições de latitude, o lúpulo necessita de aproximadamente 14 horas de luz na primavera/verão e 9 horas de luz no outono/inverno para elevadas produtividades, o que não ocorre no estado do Rio de Janeiro. Com essa problemática envolvida, o manual tem como objetivo alertar os interessados sobre as dificuldades a serem encontradas, os cuidados a serem tomados e desafios a serem vencidos em relação à cultura”, detalhou Teixeira, que também é vice-presidente de agronegócios da Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Nova Friburgo (Acianf).
Ele afirmou que essa cadeia produtiva ainda está em fase experimental, visto que praticamente todo o lúpulo usado na indústria cervejeira do Brasil é importado. A criação da Rede Lúpulo Serra Fluminense, a qual a Emater-Rio é atuante, compõe uma iniciativa pioneira de explorar o comportamento da espécie no clima tropical e aperfeiçoar o manejo para um produto de alta qualidade. “A partir da experiência de empreendedores rurais, estamos buscando obter produtividade satisfatória, com custo de produção que aumente a competitividade sobre a matéria-prima importada. Acreditamos que o número de interessados vai aumentar com a publicação do manual, o que pode resultar em mais campos de observação e eventos de capacitação técnica”, acrescentou.
Cultura do lúpulo
O uso do lúpulo na farmacologia mundial é conhecida há mais de 2.000 anos. A planta é considerada benéfica à saúde, tendo funções antioxidante, anti-inflamatória, sedativa, antibacteriana, antifúngica e aliada na saúde da mulher. É primordialmente a matéria-prima que fornece amargor e aromas característicos na produção dos diferentes tipos de cerveja, principalmente nas artesanais. A pesquisa prossegue em andamento, considerando as especificidades de manejo da espécie, e a inovação na cadeia produtiva local de abastecimento. Teixeira finalizou elencando o processo de “tropicalização” do lúpulo como um dos desafios a serem superados.
“O uso de luz artificial para suplementar o fotoperíodo, o melhoramento genético para obtenção de variedades não suscetíveis ao fotoperíodo, a identificação do ponto certo de colheita e as melhores tecnologias no pós-colheita são fatores preponderantes à adaptação do manejo à nossa região. O lúpulo nacional poderá ter papel fundamental na promoção dos polos gastronômico e cervejeiro, contribuindo na oferta de cervejas com “terrois” próprio e passíveis de indicação geográfica. Nesse caso, projeta-se a entrada de cervejas artesanais da região Serrana Fluminense não apenas no mercado nacional, mas também para exportação”, concluiu.
Fonte: O São Gonçalo