Derrotado por 10 x 0 no julgamento de impeachment, Witzel é afastado em definitivo e perde direitos políticos por cinco anos


RIO — O Tribunal Especial Misto (TEM) julgou, nesta sexta-feira (30), procedente, de forma unânime, o pedido de impeachment do governador afastado do Rio, Wilson Witzel. O placar final foi de 10 a 0 a favor do afastameno. Com isso, pela primeira vez na História do Rio de Janeiro, o processo de impeachment é consumado contra um governador.

Após o fim da votação acerca das acusações, se nenhum dos membros do júri mudar o seu voto, outra votação do TEM decidirá o tempo que Witzel ficará impedido de ocupar cargos públicos – com prazo máximo de cinco anos.

O primeiro voto lido na sessão foi o do relator do processo, o deputado Waldeck Carneiro (PT), que pediu a condenação do governador por crime de responsabilidade. Carneiro também defendeu que o acusado seja impedido de ocupar qualquer função pública por cinco anos. Até o momento, são 7 votos a 0: um do relator, os dos desembargadores José Carlos Maldonado, Teresa Castro Neves e Fernando Foch, e os dos deputados Carlos Macedo (Republicanos), Chico Machado (PSD) e Alexandre Freitas (Novo).

O julgamento foi iniciado no Tribunal de Justiça do Rio sem a presença de Witzel, e por volta de 9h30. O governador afastado informou ao GLOBO que vai acompanhar a votação da sua casa. Ele é acusado de crime de responsabilidade por seu suposto envolvimento em fraudes na compra de equipamentos e celebração de contratos durante a pandemia da Covid-19.

Acompanhe o julgamento em vídeo:

Relator: governador agiu com “desleixo” e “omissão”

Relator do processo, Waldeck Carneiro foi o primeiro a manifestar o seu voto, favorável à condenação de Witzel. O parlamentar leu sua decisão por mais de 2 horas. Ele reproduziu alguns trechos de interrogatórios conduzidos ao longo do processo no TEM e depoimentos dados à Procuradoria-Geral da República (PGR) por envolvidos no esquema investigado pelo MPF. Entre eles, os do o ex-secretário e delator Edmar Santos, dos empresários Mário Peixoto e Edson Torres, e do líder do PSC, Pastor Everaldo.

As citações irritaram a defesa de Witzel, que tentou interromper a fala do deputado. O advogado Bruno Albernaz argumentou que os fatos mencionados não constam na denúncia, o que foi negado pelo presidente do TJ, Henrique Figueira. Em sua decisão, Waldeck falou em “desleixo”, “omissão” e “negligência” por parte do governador.

– Em relação à acusação de crime de responsabilidade relativo ao ato de requalificação da OSS Unir Saúde, considero que a pretensão acusatória é procedente, tendo em vista que tal ato, por parte do réu, contribuiu diretamente para proteger interesses privados, mesquinhos e ilegítimos, em detrimento do elevado interesse público – disse Waldeck.

Sobre à contratação da Iabas, o parlamentar falou em “nítida ação omissiva”:

– A atitude do Réu, ao se esquivar do exercício de sua função de dirigente executivo máximo do Estado do Rio de Janeiro, em nítida ação omissiva, contribuiu diretamente para as maquinações delituosas de um dos grupos econômicos que disputavam, por meio do aliciamento criminoso de agentes públicos e do pagamento de vantagens indevidas, os contratos da Secretaria de Estado de Saúde – concluiu.

“Prevaleceu apenas a vontade pessoal e política do governador”, disse Maldonado

O primeiro a votar, após o relator, foi o desembargador mais antigo, José Carlos Maldonado. O magistrado seguiu o voto do relator, a favor do impeachment.

– A improbidade administrativa, ao meu ver, resta demonstrada em todas as imputações direcionadas ao acusado. Em todas as nuances. Vilipendiando a ética, a moral e os bons princípios que balizam a boa administração pública, atingindo de forma direta e indireta todos os cidadãos fluminenses. Por conseguinte, voto no sentido de condenar o réu Wilson José Witzel como incurso nos crimes tipificados, com a perda do cargo de governador do Estado do Rio de Janeiro nos exatos termos da fundamentação por mim aqui apresentados – disse.

Sobre a requalificação da OS Unir, Maldonado disse não haver qualquer dúvida de que o ato foi de interesse pessoal do governador, configurando improbidade e deslealdade.

– O ato de requalificação da OS Unir Saúde foi improbo, imoral, desarrazoável. O fato de que a população do Rio vivia os efeitos nefastos de uma pandemia, como todo o país, serviu de pano de fundo para o acusado trazer de volta a Organização Social Unir para administrar hospitais e UPAs, tornando sem efeito assim a sanção de desqualificação, inclusive no que se refere à parte financeira. Não houve, como se deveria, qualquer análise técnica, financeira ou a realização de uma auditoria. Prevaleceu apenas a vontade pessoal e política do governador.

Ao falar sobre o contato milionário com a Iabas, o desembargador falou em ganância, ao entender que ficou provada a participação de Witzel nas irregularidades.

– Não foram apenas mil respiradores comprados por preços superfaturados. Mas também desvios de valores correspondentes a toda a montagem e funcionamento dos hospitais de campanha para abrigar esses e outros materiais, frutos da ganancia, sem que importassem as filas, as pessoas, o público em geral e a luta contra a morte nos corredores e enfermarias superlotados, sem a menor expectativa de a população fluminense ser bem atendida. Para mim, é o que basta – afirmou em seu voto.

‘Narrativas da defesa não tiveram êxito’

O terceiro a declarar seu voto foi o deputado estadual Carlos Macedo (Republicanos), que também votou a favor do impeachment de Witzel. Já no início de seu discurso, o parlamentar adiantou que acompanharia o que foi levantado tanto pelo relator quanto pelo desembargador mais antigo.

– As narrativas propostas pela defesa não tiveram êxito, ao meu pensar, em demonstrar uma posição proativa do gestor Wilson Witzel em liderar a gestão de políticas públicas contra a pandemia – introduziu. – Com a colheita de provas e depoimentos, e entendendo que a acusação se manteve ímpeta com êxito, cito a requalificação da OS Unir e a contratação da empresa Iabas para construção de hospitais de campanha para a pandemia. Nesse sentido, meu voto é pela procedência da acusação, na forma do voto do relator, entendo que o Sr. Wilson Witzel teve atuação. Concluo que, na análise dos fatos, que ocorreram práticas de crime de responsabilidade.

Desembargador diz que quadrilha tomou de assalto o estado

O quarto membro do TEM a votar foi o desembargador Fernando Foch, que também votou a favor do impeachment. Para o magistrado, “uma quadrilha tomou de assalto a administração pública”, e é claro que a máquina pública foi loteada entre Mário Peixoto, Pastor Everaldo, Edson Torres e José Carlos de Melo.

– É uma situação trágica, num momento trágico do Brasil – disse em sua introdução. – o governo gerido pelo enunciado foi tomado por verdadeiras quadrilhas, que tomaram de assalto a administração pública, e tivemos aqui revelações não tão surpreendentes sobre o que aqui ocorre. Restou claro que os setores da máquina administrativa pública foram loteados entre Mário Peixoto, Pastor Everaldo, Edson Torres e José Carlos de Melo, que controlaram setores de influência no governo. Direcionavam contratações sistematicamente superfaturadas: desde o governador, até aquele que exercia influência na administração. O pastor Everaldo, por exemplo, no Detran, na Cedae. Isso foi claramente exposto pelo Edmar Santos, quando ouvido como testemunha.

Ele também falou sobre a elaboração suspeita de contratos com OSs na Saúde, e também comentou uma das alegações da defesa de Witzel, que diz que o governador não teria, em sua função, o dever de, por si só, fiscalizar e acompanhar o que é feito por seus subordinados.

– Há prova testemunhal fortíssima no sentido de que os contratos com as OSs eram mal feitos, segundo o próprio secretário de Saude, Carlos Alberto Chaves, eram elaborados para não funcionar – disse. – O denunciado também confessa omissão própria, era seu dever fiscalizar seus subordinados e ele não auxiliou.

Foch também citou os hospitais de campanha ao falar sobre o contrato com a Iabas. Para ele, a iniciativa resultou em “retumbante fiasco”

– Restou claro que Mário Peixoto tem fortes interesses nas OSs Unir e Iabas. A primeira foi desqualificada em razão de descumprimento de obrigatoriedades contratuais e irregularidades. No entanto, o denunciado a requalificou, fazendo-o não por razão de mérito recursal, mas por critérios de oportunidade e conveniência. Quanto à OS Iabas, não encontro justificativa senão a de que houve favorecimento à sua escolha para gerir o estratosférico posto de construir e gerir todos os hospitais de campanha que mandou-se instalar e acabaram em retumbante fiasco.

Irregularidades de Iabas foram relativizadas, diz desembargadora

A desembargadora Teresa de Castro Neves foi a sexta a votar a favor do impeachment de Witzel. Em seu voto, destacou em seu voto a contratação do Iabas que entregou apenas dois dos oito hospitais de Campanha prometidos no início da pandemia. Ela concluiu que o governador permitiu a contratação da OSs mesmo com indícios de irregularidade, assim “olhando para o lado”. Ela ainda criticou a escolha de investir em unidades provisórias e não na rede de saúde do Rio.

— Quando você propicia a corrupção você pode fraudar um documento ou simplesmente olhar para o lado. Ciente de tudo isso e mandando ampliar a transparência, ele contrata o agente, mas pior, um agente que já vinha com uma qualificação aquém do que seria recomendada para construir oito hospitais a quase R$ 1 bilhão. O governador deixou de agir, ele não contratou mas olhou para o lado — afirmou.

Ao comentar a requalificação da UNIR, a desembargadora entendeu a ação do governador de forma parecida.

— Diz o governador que tinha gente pior, e se tivesse gente pior poderia manter esse. Não é porque há outros piores que não vou agir neste ou olhar de novo para o lado. Parece que esse atuar é uma encenação de atuação correto, uma grande comédia para parecer atuar — concluiu.

“Os fatos aniquilam a tese de que o denunciado teria agido de forma lícita”, disse Freitas

O deputado Alexandre Freitas foi o sétimo e derradeiro voto para o impeachment de Wilson Witzel do cargo de governador do Rio. No seu voto ele alegou que as provas no caso da UNIR Saúde são robustas e ressaltou que conversas interceptadas pela Justiça mostram que articuladores da OS sabiam de decisões do governo antes de serem tomadas ou publicadas:

— O ponto aqui é o contexto que seu deu o recurso. Os elementos demonstram a vinculação entre o governador e Mário Peixoto. Todas as provas desde o início apontavam para irregularidades da Unir e que Mário Peixoto é sócio oculto. Os relatórios deixam claro que o empresário é um grande articulador de contratos entre Organizações Sociais e o poder público. Os fatos aniquilam a tese de que o denunciado teria agido de forma lícita. Tanto as imputações e as provas estão nos autos desde a origem, e os depoimentos apenas reforçaram elas.

Sobre a contratação dos hospitais de Campanha, Freitas entendeu, entretanto, que as irregularidades da contratação do IABAS não teve influência do governador e somente da pasta da Saúde com participação e Edmar Santos e Gabriell Neves.

Desembargadora critica imagem vendida como ‘outsider’

A oitava a votar a favor do impeachment de Witzel, a desembargadora Inês da Trindade afirmou que o processo de impeachment é “traumático para a sociedade, sobretudo no Rio, que passou por escândalos de corrupção” nos últimos anos. Ela concluiu que o governador participava do esquema de corrupção que tinha como intenção fraudar licitações, como o superfaturamento de respiradores pela Iabas durante a pandemia.

— De acordo com as provas compartilhadas com o STJ, constata-se que há três núcleos com divisão de espaço de poder. Tal constatação é claramente identificada, assim o modus operandi da organização do Witzel era fraude nas licitações. E em contrapartida o pagamento a políticos pela licitação fraudada. Configura-se assim mais uma organização criminosa no governo no Rio, com divisão de tarefas.

Ao analisar a requalificação da Unir, que segundo a defesa atuava no estado desde o governo Pezão, a desembargadora ainda criticou a posição de “outsider” que Witzel assumiu durante a eleição de 2018:

— Registra que o acusado recebeu quase R$ 1 milhão antes das eleições, caso fosse. Se Witzel gostaria de dar uma nova cara ao Rio, teria que se afastar de famosos figurões do estado. A decisão de requalificação foi desprovida de total motivação diante de tantas provas contrárias à gestão da empresa. Diante do ato de requalificação conclui-se que há provas que a decisão está imaculada pela improbidade

Sobre a contratação do Iabas para gerir as unidades de campanha, a desembargadora citou diversas provas compartilhadas pelo STJ, que julgaram Witzel criminalmente por desvios na Saúde:

— Uma antecipação da escolha da empresa em período de pandemia, o que é inaceitável em uma administração pública. Diante de todas as provas coletadas, não existem dúvidas que Witzel foi escolhido não por aposta de nova política, que era uma roupagem para esconder a velha política ímproba — instalada nos últimos governos do estado. Todas as provas demonstram o dolo de Wilson Witzel no esquema montado para ferir a lei. Esse caso constitui mais um exemplo de desvio de verbas públicas.

Deputada do PSOL cita ‘relações promíscuas’

A nona a votar a favor do afastamento de Wilson Witzel, a deputada Dani Monteiro (PSOL) considerou que Wilson Witzel chefiava um grupo que tinha “relações promíscuas” entre agentes públicos e privados. Ela concluiu seu voto dizendo que na requalificação da UNIR Saúde, Witzel agiu em pró de agentes privados e em detrimento do ente público. Ela lembra que interceptações telefônicas da operação Placebo mostraram que articuladores da OS sabiam da desqualificação antes mesmo de ela ser publicada.

— Os fatos narrados ficaram comprovados com provas testemunhas e documentais. Não há dúvida sobre as relações promíscuas entre agentes públicos e privados, chefiado pelo ora denunciado, como sua participação direto nos fatos imputados. Impõe-se reconhecer que que o denunciado agiu em detrimento do interesse público — afirmou

Ao analisar a contratação dos hospitais de Campanha, a deputada relembrou a frase do atual secretário de saúde Carlos Alberto Chaves que “a tropa é um retrato fiel dos seus comandantes”. Ela negou a tese da defesa de que o subsecretário de Saúde Gabriell Neves cometeria os crimes sem o conhecimento do governador.

— Raramente os líderes das facções são responsáveis pelas tratativas, que são delegadas para subalternos em uma tentativa de se distanciar caso o crime seja descoberto — afirmou.

Em voto derradeiro, desembargadora diz que houve ‘permissividade’

A desembargadora Glória Bandeira de Mello foi a última a votar, também pelo afastamento de Wtizel. Ela iniciou seu voto analisando a contratação do Iabas, em que considerou que a atuação de Gabriel Neves foi escancarada em prol de um determinado grupo que atuava na secretaria de Saúde. Ela negou a tese da defesa do ex-governador de que ele não tinha ingerência pelos contratos, já que não era contratação grande e em um momento delicado:

— Ficou clara a permissividade do governador no desenvolvimento livre da estrutura (criminosa). O processo dá elementos sobre o “olhar para o lado”, do porquê disso de simplesmente fechar os olhos para isso. E os autos dá esses elementos, mas aqui as delações se harmonizam pela costura do governador nesse esquema — diz.

Cinco anos de inelegibilidade

Às 19h30, o tribunal votou a favor do uso da lei federal e não da lei estadual quanto ao período da inelegibilidade de Witzel. Assim, o ex-governador agora está com seus direitos políticos cassados por cinco anos. O placar dessa votação foi de 9 a 1, sendo o deputado Alexandre Feitas (NOVO) a única voz dissonante, ao votar a favor de um período de quatro anos, por não ter visto dano ao erário.

O deputado relator Waldeck Carneiro diz que foi “ofensiva” a atitude de Witzel e que é um conhecedor da lei por ser ex-juiz federal. Ele votou para também deixar o ex-governador inabilitado politicamente por 5 anos, pena máxima.

— As consequências desses atos são muito graves. Morreu muita gente nesse estado de Covid-19. Isso do meu ponto de vista contextualiza de forma grave os fatos aqui julgados
Já o desembargador José Carlos Maldonado se emocionou a falar das 44 mil mortes :
— Ressalto a crueldade que stá por trás dos fatos e que nos levaram a esse julgamento unânime. Quantas dessas 44 mil mortes teriam sido evitadas? Isso é fundamental.
Ao final da sessão, o presidente do TEM, desembargador Henrique Figueira proclamou o resultado: “por unanimidade de votos procedente o pedido para decretar a destituição de Wilson José Witzel do cargo de governador do Rio e inabilitado por cinco anos de exercer funções políticas por maioria”.

Tribunal nega pedido da defesa por suspensão do processo

Antes mesmo do início da votação, Witzel sofreu uma primeira derrota. O tribunal decidiu por unanimidade rejeitar três pedidos preliminares da defesa do governador para que o processo fosse refeito. Os advogados alegaram inépcia da denúncia por falta do libelo acusatório (peça inicial do processo com exposição escrita e detalhada dos fatos criminosos), falta de acesso integral às provas e ausência de prova pericial. Esses argumentos já foram usados pela defesa em uma reclamação feita ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em duas rodadas de votação, todos os desembargadores e deputados rejeitaram as alegações e entenderam que Witzel teve conhecimento de todos os elementos contidos na denúncia e que teve garantido o amplo direito de defesa.

— A defesa, inclusive, mostrou desde o início, conhecer os eixos da denúncia – disse o relator, Waldeck Carneiro.

Acusação: governo dava “suporte a atos de corrupção”

O deputado estadual Luiz Paulo (Cidadania), autor da denúncia em que que se baseia o processo de impeachment, foi o primeiro a falar na sessão. O parlamentar citou as operações Placebo, Favorito, Tris in Iden, as investigações do Ministério Público Federal (MPF), e definiu a organização do governo Witzel na área da saúde como “corrupta e incompetente”.

— Tenho convicção que o governador Wilson Witzel cometeu crime de responsabilidade. Nas alegações finais, demonstrei isso com fartura dos documentos, escutas telefônicas e conjunto de oitivas que demonstram que na requalificação da Unir, o governador afastado atendeu a interesses espúrios. No caso da Iabas, a contratação de R$ 850 milhões para construir 7 hospitais de campanha, sendo que só um, do Maracanã, funcionou de forma efetiva, mesmo assim, de forma muito precária. A construção dos hospitais foi feita por uma empresa que fazia gestão hospital, sem ser uma empresa de engenharia. Isso é um erro basilar que um juiz federal (Witzel) e o secretário de saúde, Edmar Santos,não poderiam ter cometido. Havia interesses escusos no caso Iabas para pagar propina. Diante disso, fica constatado o crime de responsabilidade. Peço também a perda dos direitos políticos por cinco anos.

Luiz Paulo também comentou as peças principais da acusação, sobre a requalificação da OS Unir Saúde e os contratos envolvendo a Iabas. Segundo o parlamentar, Witzel agiu em favor dos interesses de terceiros, contrariando o interesse público. Citando uma das denúncias do MPF, definiu o suposto esquema de desvios como “caixinha da propina”.

Tribunal Especial Misto (TEM) se reúne para decidir sobre impeachment de Witzel
Tribunal Especial Misto (TEM) se reúne para decidir sobre impeachment de Witzel Foto: Marcia Foletto / Agência O Globo

– A tragédia da falta de planejamento, associada à corrupção, levou a que apenas dois hospitais de campanha tenham sido concluídos, e, assim mesmo, com um atendimento muito aquém do previsto, com perdas evidentes de vidas e aos cofres públicos – disse. – Sobre a Iabas, no mínimo, o governador permitiu a contratação sem licitação, contrariando o interesse público e cometendo crime de responsabilidade.

Defesa argumenta falta de clareza da denúncia

Depois da fala da acusação, o desembargador Henrique Figueira deu a palavra à defesa de Witzel, representada pelos advogados Bruno Albernaz e Eric de Sá Trotte. Eles voltaram a falar que o chefe do Executivo não teria atribuição para, sozinho, tomar decisões em seu governo. Eles também reclamaram de não ter tido acesso à íntegra dos anexos da delação de Edmar, o que tornaria o processo nulo, e questionaram ausência do libelo acusatório e de provas periciais.

– Deputado Luiz Paulo, pensei que vossa excelência iria se debruçar sobre os autos e pedir absolvição do defendente – afirmou Trotte. – Gostaria de iniciar minha palavra, pedindo vênia para proclamar uma frase do desembargador Fernando Foch, aqui neste tribunal: “Eu tenho uma amiga que morreu na fila de espera de um posto de saúde”. Isso é algo de governos anteriores. Essa frase é muito emblemática, sobretudo pelo que aconteceu até agora no tribunal. Elementos estranhos nos autos, denúncias do MPF que sequer passaram pelo crivo do contraditório no processo originário. Foi até difícil para o governador se defender dos atos que estão sendo imputados a eles.

Os advogados também desqualificaram os depoimentos dados, por exemplo, por Edmar e o empresário Edson Torres. Eles voltaram a defender a requalificação da OS Unir, alegando que ela se encontrava em uma situação melhor que várias outras organizações que acabaram assumindo contratos, e que a decisão de Witzel foi baseada no bem da população. Em seguida, o advogado Bruno Albernaz acrescentou que a denúncia é “pouco clara”:

– Há de se apresentar que a denúncia é extremamente inválida, imprecisa, não apresenta elementos que mostrem com clareza as acusações que caem sobre o governador. Foi uma instrução pouco clara, onde se tratou de várias sortes de questões, inclusive alheias ao mandato, como supostas verbas destinadas ao governador antes inclusive de seu mandato, o que foge o objeto da demanda e não pode ser tratado nesse tribunal. A acusação lança mão de fatos estranhos aos autos, como a Operação Filhote de Cuco, que não é citada na denúncia. Há ausência de clareza.

Eric de Sá Trotte, então, terminou a defesa argumentando “ausência de provas de que (o governador) tenha agido dolosamente (intencionalmente)” na contratação da organização Iabas:

– Sequer foi denunciado pelo MPF por atos relacionados a Iabas. A acusação age de maneira descompromissada com a verdade. Diante da ausência de provas de que tenha agido dolosamente, a acusação pede condenação por ter permitido a contratação da Iabas. Permitir seria um ato culposo de negligência. Não há título de condenação por ato culposo em crime de responsabilidade.

Witzel: “Não desistirei jamais do cargo a que fui eleito”

Fora do julgamento, Witzel criticou pelo Twitter a argumentação de Luiz Paulo. Disse ainda que não vai desistir do cargo de governador. “Não desistirei jamais do cargo a que fui eleito. Espero um julgamento justo e técnico. As alegações finais do deputado Luiz Paulo são desprovidas de prova e demonstram toda sua frustração por seu grupo ter sido derrotado nas eleições, diga-se o grupo do Cabral e Picciani”, publicou o governador afastado, em seu perfil na rede social.

Impeachment: Witzel fala em “perseguição”

Horas depois, se pronunciou de novo, acusando o relator de “contrariar a tecnica jurídica: “Lamentavelmente o Relator Deputado Waldeck Carneiro do @ptbrasil está usando exclusivamente a delação de Edmar Santos para fundamentar seu voto, absolutamente contrário a técnica jurídica sem compromisso com um julgamento justo”. Em seguida, o governador afastado completou: “A grande contradição é que o Presidente Lula foi condenado única e exclusivamente pela delação de Léo Pinheiro – réu confesso e desesperado como Edmar – deputado Waldeck Carneiro, delação só vale quando é oposição ao delatado?”

Impeachment depende de sete votos entre dez

O TEM é composto de cinco deputados estaduais e cinco desembargadores. Caso Witzel receba sete votos (dois terços do júri) contrários no julgamento, estará definitivamente afastado do cargo de governador e não poderá exercer qualquer função pública por tempo também a ser estabelecido na sessão desta sexta-feira por votação entre os membros do TEM, não podendo passar de cinco anos. Caso seja absolvido, o regulamento manda que Witzel retorne imediatamente às suas funções, mas uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que em fevereiro aceitou denúncia do MPF e o tornou réu por corrupção e lavagem de dinheiro, também o afasta do mandato até 2022.

O relator do TEM, deputado Waldeck Carneiro (PT), disse que a ausência de Witzel no tribunal só “criaria uma questão” caso o governador afastado apresentasse um documento de renúncia:

— O réu e a defesa ainda não chegaram, o que não impede que o julgamento aconteça, porque a defesa foi apresentada. As alegações finais foram apresentadas e os memoriais que sintetizam as alegações foram apresentados, levados em conta por todos os julgadores. O que poderia criar uma questão ao tribunal é caso, eventualmente, ele não venha, apresentando um documento de renúncia. Nesse caso, teríamos que decidir como proceder em relação à ineligibilidade pelo prazo máximo de cinco anos.

O rito do julgamento

No primeiro momento do rito, acusação e defesa terão a palavra por 30 minutos cada. Em seguida, Waldeck deverá ler seu relatório e expor seu voto, que pode ser seguido ou não pelos demais membros do TEM. Por fim, inicia-se a votação, começando pelo desembargador mais antigo e, depois, alternando entre magistrados e parlamentares.

O relator do processo de impeachment, deputado Waldeck Carneiro (PT), durante o julgamento
O relator do processo de impeachment, deputado Waldeck Carneiro (PT), durante o julgamento Foto: Marcia Foletto / O Globo

Caso sete membros do tribunal (dois terços) votem pela condenação do impeachment, Witzel será definitivamente afastado do cargo de governador, sendo automaticamente inabilitado para exercer qualquer função pública. No entanto, se a decisão for pela absolvição, Witzel, que pelo regulamento voltaria imediatamente ao cargo, segue afastado, pois cumpre determinação do STJ.

Em caso de condenação, na sequência, o presidente do Tribunal Especial Misto fará nova consulta aos seus membros sobre o tempo, não excedente de cinco anos, durante o qual Witzel deverá ficar inabilitado para o exercício de qualquer função pública, decisão esta que também será tomada por dois terços dos votos dos membros do TEM.

Após a decisão, um membro do Tribunal Misto redigirá o acórdão e relatará o processo no prazo máximo de dez dias após a sessão. Em seguida, o presidente do Tribunal Especial Misto solicitará a todos os seus membros que tomaram parte no julgamento que assinem o acórdão e determinará sua publicação do Diário Oficial e no Diário da Justiça Eletrônico. Por fim, os ofícios são apresentados à autoridade que deva assumir o governo do estado, que, neste momento, seria o governador em exercício Cláudio Castro.

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Fonte: G1