Corpo de morador de rua que morreu dentro de padaria ainda aguarda retirada no hospital


O corpo do morador em situação de rua Carlos Eduardo Pires de Magalhães, de 40 anos, ainda aguarda retirada no Hospital municipal Miguel Couto, na Gávea, Zona Sul do Rio. O homem morreu na última sexta-feira, dia 27, enquanto tentava pedir ajuda a comerciantes e clientes da Confeitaria e Lanchonete Ipanema, também na Zona Sul. Carlos Eduardo tinha uma tuberculose em estágio avançado e, numa crise de tosse, queria assistência para chamar o Samu. O corpo ficou por mais de duas horas coberto com um plástico preto dentro do estabelecimento aberto. O fato gerou muitas críticas nas redes sociais.

A informação da presença do corpo no hospital é da Secretaria municipal de Saúde do Rio, confirmada nesta terça-feira, um dia após a pasta negar que tivesse recebido Carlos Eduardo em alguma unidade pública de saúde. “Um corpo sem identificação foi encaminhado para o Hospital Municipal Miguel Couto no dia 27. Hoje, papiloscopistas da polícia identificaram como sendo o corpo de Carlos Eduardo Pires de Magalhães. O corpo permanecerá no hospital, aguardando a retirada pelos familiares”, diz a nota enviada pela pasta.

Morador de rua morreu em padaria, que continuou aberta
Morador de rua morreu em padaria, que continuou aberta Foto: Blog Joaquim Ferreira dos Santos / O GLOBO

Nas ruas, os únicos companheiros fiéis de Carlos Eduardo eram dois vira-latas. Mas como a sua doença já estava avançada, os dois acabaram sendo adotados por uma moradora do bairro dias antes da morte. Foi o próprio Carlos Eduardo quem pediu para que ela levasse os animais no dia em que ele foi internado pela última vez, dia 25.

Na madrugada de sexta-feira, Carlos Eduardo teria passado todo o tempo usando drogas, segundo relatos de pessoas que o conheciam.

Trabalhando na região há 26 anos como operada de vagas, Rita de Cássia Diniz, de 52 anos, só guarda boas lembranças de Carlos Eduardo. Segundo ela, brigas de família por conta da dependência química o levaram às ruas. A vítima era usuária de crack mas não tinha um comportamento agressivo e nem cometia furtos na região, pelo contrário, era querido por todos aqueles que o conheciam.

— Ele vivia brincando com a gente, rindo, não fazia mal a ninguém. Era inteligente, do bem. Falava super bem, era culto. Uma moradora da região pagava duas refeições por dia para ele, que eram entregues aqui. Quando o tratavam mal ou o ignoravam, ele fazia um discurso de respeito ao próximo. Sentíamos que ele sabia o que estava falando.

Rita de Cássia Diniz, de 52 anos, diz que
Rita de Cássia Diniz, de 52 anos, diz que ‘só guarda boas lembranças de Carlos Eduardo’ Foto: Guilherme Pinto / Agência O Globo

Fundação Leão XIII prestava atendimento

As horas que se seguiram à sua morte mostraram que, mais do que esquecido, ele era um pária da sociedade. Como estava sem documentos, o cadáver teria sido encaminhado para o Hospital municipal Miguel Couto, na Gávea, segundo o Corpo de Bombeiros. Mas o corpo estava desaparecido até a noite de noite desta segunda-feira. Ele não chegou ao Instituto Médico-Legal (IML), de acordo com a Polícia Civil. E a Secretaria municipal de Saúde negava, até esta manhã, que tivesse sido levado para qualquer hospital da rede.

— Cheguei exatamente na hora em que ele morreu. Estava com a camisa ensanguentada, de tanto tossir e cuspir sangue. Mas, como sempre acontece, as pessoas não ouvem os moradores de rua e só oferecem o desprezo. Ele não conseguiu ajuda — disse o jornaleiro Tarcísio Filho, dono de uma banca na Praça Nossa Senhora da Paz.

Carlos Eduardo era acompanhado há cinco meses pela Fundação Leão XIII que atua no Projeto de Atenção Socioassistencial às Pessoas em Situação de Rua. Ao longo desse tempo, houve encaminhamentos para atendimento em unidades de saúde e acesso a medicamentos.

— Era mais uma vida sofrida. Ele tinha o vício dele, mas era uma pessoa do bem. Ele me contou sobre o banho e me pediu ajuda para que pudesse se lavar direito. Com um amigo, organizamos e demos esse banho a ele. Chorei demais (quando soube da morte), fiquei muito triste. O tempo de convívio na praça acaba virando um vínculo muito forte. Que Deus dê a ele um bom lugar — conta um operador de vagas amigo de Carlos Eduardo que não quis ser identificado.

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Fonte: G1