Aprenda a fazer o bolinho de feijoada que virou patrimônio cultural e imaterial do Rio


RIO – Foi ao experimentar (e se decepcionar) com um “bolinho de feijão” que, na verdade, era um acarajé, num bar de Belo Horizonte, que a chef Kátia Barbosa teve a ideia de criar sua iguaria mais famosa. À cabeça, veio logo a recordação da mãe, paraibana, amassando na mão bolinhos de feijão, arroz e farinha. Kátia desenvolveu uma receita própria (leia abaixo), com um tutu mais grosso, bacon e linguiça, que os amigos, aos degustarem pela primeira vez, sentiram logo o sabor de… feijoada. E assim nasceu, em 2009, o bolinho de sucesso meteórico, declarado pelo prefeito Eduardo Paes, através de decreto, patrimônio cultural de natureza imaterial da cidade.Copiado sem constrangimento não só por bares do Rio como dos quatro cantos do Brasil, o bolinho de feijoada da Kátia, original do Aconchego Carioca, na Praça da Bandeira, é feito hoje numa fábrica no mesmo bairro, de onde saem cerca de dez mil unidades por semana para seus restaurantes e casas de clientes.

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—Na primeira vez que vi alguém copiar o bolinho, fiquei bem irritada — conta a chef, uma das técnicas de “Mestre do sabor”, da TV Globo. — Mas aí lembrei de uma máxima da minha família. Meu pai fazia cocada, cuscuz e quebra-queixo para vender nas portas de cinema do Rio. Ele teve nove filhos, e somos quatro irmãos que cozinham, sendo três profissionalmente. Só que ninguém sabe fazer a cocada do meu pai, crocante por fora e um melzinho por dentro. Então, vi que é bobagem guardar conhecimento. Se não fossem as pessoas copiando e experimentando em todos os lugares, o bolinho de feijoada seria só mais uma receita. Esse reconhecimento agora é prova viva de que a gente precisa dividir para crescer.
Os bolinhos da chef são encontrados no Aconchego; no Kalango, em Botafogo; no Katita, no Norte Shopping e no Uptown, na Barra; e também em Portugal. Fora esses lugares, a mesma combinação de ingredientes pode ser vista no cardápio de inúmeros bares e restaurantes do Rio, já que não há segredos na receita. Após passar por quatro meses de experimentações em 2009, a criação nunca sofreu modificações.
No Bar da Frente, na Praça da Bandeira, que fica literalmente em frente ao Aconchego, é oferecido o mesmo bolinho desde 2009. E foi “cópia autorizada”, como brinca a empresária Mariana Rezende.

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— O Aconchego vivia muito cheio, e muita gente ficava três horas na fila só para comer o bolinho e ir embora. A Kátia sugeriu que a gente tivesse o bolinho, e meu cozinheiro foi aprender com ela a receita. Só não servimos igual ao dela, com torresmo e batida — diz Mariana, que estava em BH com Kátia e outros amigos quando a chef do Aconchego experimentou o “bolinho de feijão” num bar de BH, durante um festival gastronômico. — A gente faz sempre questão de dizer que a receita é da Kátia.
Outro que tem o mesmo bolinho é o Cachambeer, de Marcelo Novaes. O bar do Cachambi copiou “na cara dura”, mas, num episódio que é motivo de risos hoje, acabou “desmascarado” por Kátia Barbosa. Viraram amigos. A receita da chef, uma embaixadora da comida brasileira, tem seus ingredientes imateriais, como a generosidade.
— Eu fico orgulhosa de ter criado uma coisa bacana. Ao longo desses dez anos recebi muitas mensagens de gente dizendo que o bolinho salvou sua vida, de gente que vive de vender bolinhos nos bairros. Isso é reconfortante reconfortante — diz Kátia, que faz uma ressalva. — Não chamo isso só de generosidade. Se forem para praticar o antimarketing, que copiem direito!
O decreto municipal destaca que a iguaria “manifesta a arte, a tradição e o conhecimento de um povo, estando diretamente ligada à sua identidade”. Até na China Kátia já fez o bolinho 100% carioca:
—Num momento tão difícil, a gente mostrar a nossa cultura gastronômica e que o Brasil não é só futebol, praia, mulher gostosa e notícia ruim é a parte mais legal de ter o bolinho como patrimônio cultural.

Um quitute com a cara do Rio
Um quitute com a cara do Rio Foto: ROBERTO MOREYRA / Agência O Globo

Veja como fazer
Criado em 2009 pela chef Kátia Barbosa, o bolinho de feijoada agora é patrimônio cultural de natureza imaterial do Rio. A iguaria 100% carioca, inspirada no prato brasileiro mais famoso que existe, não tem segredos: Kátia, que é da opinião que o bolinho só conquistou tantos paladares, prêmios, e honrarias porque “tem gente fazendo e experimentando em todos os lugares”, sempre compartilhou a receita. Abaixo, o passo a passo.Bolinho da feijoada da Kátia Barbosa. Rende 100 unidades ou 25 porções de 4 unidades

Ingredientes:
1 KG de feijão preto
½ KG de farinha de copióba amarela
½ kg de carnes para feijoada – paio, linguiça, carne seca, costelinha, lombo e bacon
6 dentes de alho cortados pequenos
Farinha de trigo para empanar
900 gramas de bacon cortados em cubinhos pequenos, fritos.
Sal para feijão (sal, salsa e coentro secos, cominho e pimenta) a gosto
150 ml de azeite
10 gramas de polvilho azedo
4 molhos de couve passados rapidamente no alho, na frigideira


Modo de preparo:

Lavar as carnes de feijoada e cortar em pedaços pequenos. Cozinhar o feijão e as carnes por 40 minutos na panela de pressão em fogo alto. Após cozido, deixar esfriar. Bater o feijão com as carnes sem osso no liquidificador. Em uma panela, refogar o alho com o azeite e adicionar o feijão batido. Acrescentar a farinha de copióba aos poucos, mexendo vigorosamente sem parar. Adicionar o sal para feijão e continuar mexendo até desgrudar da panela. Quando a massa estiver fria, adicionar o polvilho azedo (bem pouquinho) apenas para evitar que ela quebre. Fazer bolinhas e rechear com bacon frito e couve refogada. Empanar na farinha de trigo e congelar. Fritar em óleo quente.





Fonte: G1