O principal tribunal de direitos humanos da Europa decidiu a favor da corredora Caster Semenya na terça-feira (11), afirmando que os tribunais na Suíça devem dar a ela uma nova chance de lutar contra a exigência de que atletas femininas com alto nível de testosterona natural tomem medicamentos para reduzi-lo.
Bicampeã olímpica dos 800 m, a sul-africana de 32 anos havia recorrido à Corte Europeia dos Direitos Humanos (ECHR) em fevereiro de 2021, após perder os recursos na CAS (Corte Arbitral do Esporte, o tribunal esportivo mais alto) e no Tribunal Federal Suíço (SFT), em uma longa batalha legal em curso.
A Corte Europeia de Direitos Humanos decidiu, por uma maioria apertada de quatro votos a três, que o recurso original de Semenya contra as regulamentações da World Athletics (a federação internacional de atletismo) não foi devidamente ouvido.
“A Corte constatou em particular que à requerente não foram garantidas salvaguardas institucionais e processuais suficientes na Suíça para permitir que suas queixas fossem examinadas de forma efetiva”, afirmou a ECHR em um comunicado.
“Os altos riscos do caso para o requerente e a margem estreita de apreciação concedida ao Estado requerido deveriam ter levado a uma revisão institucional e processual minuciosa, mas o requerente não conseguiu obter tal revisão.”
Semenya pode agora estar livre para desafiar, mais uma vez, as regras que deixaram sua carreira em espera, mas ainda há um longo caminho a percorrer nesse sentido.
Durante um período de três meses após o julgamento do ECHR, ele não é final e qualquer parte pode solicitar que o caso seja encaminhado à Grande Câmara da Corte.
Se tal pedido for feito, um painel de cinco juízes vai considerar se o caso merece uma análise mais aprofundada. Nesse caso, a Grande Câmara reabrirá o caso e proferirá um julgamento final.
A World Athletics afirmou que mantém suas regras, que permanecerão em vigor por enquanto, e acrescentou que incentivará o governo suíço a solicitar uma revisão da decisão.
“Permanecemos da opinião de que as regulamentações de DSDs [atletas com diferenças no desenvolvimento sexual] são um meio necessário, razoável e proporcional de proteger a competição justa na categoria feminina, como constatado pela Corte Arbitral do Esporte e pelo Tribunal Federal Suíço, após uma avaliação detalhada e especializada das evidências”, afirmou a World Athletics em um comunicado.
“Vamos nos comunicar com o governo suíço sobre os próximos passos e, dadas as fortes opiniões discordantes na decisão, vamos incentivá-los a encaminhar o caso para a Grande Câmara da Corte Europeia dos Direitos Humanos para uma decisão final e definitiva.”
Semenya possui uma condição médica conhecida como hiperandrogenismo, que é caracterizada por níveis mais altos do que o normal de testosterona, um hormônio que aumenta a massa muscular, a força e a hemoglobina, afetando a resistência.
De acordo com as regras, para competir em eventos femininos, atletas com diferenças no desenvolvimento sexual (DSDs) com altos níveis de testosterona devem reduzi-los para os de “uma mulher saudável com ovários”. Elas podem tomar pílulas contraceptivas, receber injeções mensais ou passar por cirurgia para remover os testículos.
A Corte Arbitral do Esporte decidiu em 2019 que as regras da World Athletics eram necessárias para uma competição feminina justa.
Na época, Semenya afirmou que as regras eram discriminatórias e que as pílulas contraceptivas a faziam sentir-se “constantemente doente”. Ela perdeu seu recurso para o SFT no ano seguinte para anular a decisão do CAS de 2019.
Semenya ganhou medalha de ouro nos 800 metros femininos nos Jogos Olímpicos de 2012 (após punição por doping da russa Mariya Savinova) e 2016 e também é tricampeã mundial nessa distância.
As regulamentações, inicialmente aplicadas a corridas de 400 metros a uma milha, foram ampliadas em março para incluir todas as provas femininas de pista, impedindo Semenya de relançar sua carreira correndo distâncias mais longas.