Horas antes de o roraimense Samir Xaud ser eleito presidente da CBF, no Rio, o único time de Roraima que participa de uma das quatro divisões do Campeonato Brasileiro, na Série D, entrou em campo em Boa Vista, do outro lado do país.
No final da tarde de sábado (24), pela quarta divisão nacional, o GAS (Grêmio Atlético Sampaio), bicampeão roraimense, foi derrotado por 2 a 1 pelo Manaus, de virada, no estádio Flamarion Vasconcelos, o Canarinho.
Integrantes dos dois times e torcedores do GAS celebraram a ascensão do conterrâneo ao topo da entidade gestora do futebol nacional, elogiaram o trabalho dele –há dois anos, Samir começou a administrar a Federação Roraimense, presidida há mais de 40 anos pelo pai dele, Zeca Xaud–, e atribuíram as críticas que ele tem recebido a desconhecimento e preconceito.
“O futebol roraimense melhorou muito, Samir trouxe mais torcida e dinheiro, atraiu patrocinadores, fez sorteio de brindes e queima de fogos nos jogos do Estadual. Ele tem pouca experiência, mas pode dar uma alavancada gigantesca”, disse Francisco Moreira Jr, o Chico Jr, 42, dono de uma empresa de churrasqueiras pré-moldadas e presidente da torcida GasBoêmios.
O nome da torcida é inspirado na vascaína VasBoêmios. “Porque aqui todo mundo torce para times do Rio ou de São Paulo”, explicou Chico, vascaíno acima de tudo.
Os namorados Maria Alice Pinto (23, estudante de nutrição, mais vascaína que GASense) e Richard Oliveira (24, auxiliar administrativo, mais GASense que santista), engrossaram o coro.
“Há preconceito por ele ser de Roraima, é só ver os comentários. Se fosse de qualquer outro lugar seria diferente. O povo diz que aqui não tem futebol, mas não conhece nem procura saber”, disse ela, elogiando as novidade introduzidas por Samir, como o VAR nas finais do Roraimense e sorteios durante os jogos. “Samir pode ser um espelho para nosso futebol melhorar”, completou ele.
Para o servidor público Andre Luiz de Sá, é injusto usar o futebol de Roraima como parâmetro para avaliar a capacidade de Xaud. “E os dirigentes que eram de outros estados e federações grandes e fizeram uma bandalheira no futebol brasileiro?”, questiona.
“É mais uma questão cultural, o brasileiro não está acostumado a ter alguém do Norte em posição de poder, é muito difícil pra alguém do Rio e de São Paulo entender que aqui pode ter coisa boa. Mas o estado de Roraima inteiro apoia Samir.”
Não é bem assim. Uma rara voz dissonante foi de Cauã Peres, 22, estudante de jornalismo, para quem Samir não assumiu a gestão do futebol local por méritos, “mas por nepotismo, numa cidade muito pequena e com estrutura que não tem a grandeza exigida para o cargo”.
Embora reconheça que o campeonato local “melhorou ligeiramente, até porque não tem como não evoluir”, Peres aponta problemas concretos, como a má qualidade dos gramados, rodadas duplas no mesmo estádio (prejudicando o campo para quem joga depois) e o histórico do próprio Canarinho, principal palco do futebol local. Pertencente ao Governo de Roraima, ficou quase dez anos fechado, sendo reinaugurado em 2020.
Jogadores e dirigentes relevam os problemas e festejam Xaud. O goleiro Athos, do GAS, associou as críticas à falta de informação. “As pessoas de fora não veem o que ele faz aqui no estado. Nos últimos dois anos a diferença no campeonato [Roraimense] foi muito grande”, mencionando a introdução do VAR e árbitros de fora nas finais.
O lateral-direito Zizao disse ter esperança que a gestão de Xaud na CBF consiga garantir a Roraima uma segunda vaga na Série D. O presidente do GAS, Jander Cavalcante, definiu como “revolução” as mudanças introduzidas pelo filho de Zeca Xaud no futebol local, destacando, além do VAR e árbitros Fifa nas finais, a colocação, durante os jogos, de um telão de LED no estádio, que não tem placar eletrônico.
Até nas hostes adversárias o novo presidente da CBF foi celebrado. Supervisor do Manaus, Abraão Rodrigues disse que Xaud será positivo para o futebol do Norte. “O presidente da Federação Amazonense [Ednaílson Rozenha] é amigo do pai dele [Zeca Xaud]. O Manaus está honrado, isso vai fortalecer o Norte, dar uma atenção a mais.”
Em campo, os times mostraram um futebol de nível técnico razoável. O GAS foi melhor no primeiro tempo e abriu o placar, mas foi dominado pelo Manaus na etapa final e levou a virada, 2 a 1. Segue em penúltimo lugar no Grupo A da Série D. O Manaus é o quarto do grupo.
Os ingressos para a partida custavam de R$ 10 (meia) e R$ 20 (inteira). Aparentemente, havia cerca de 300 pessoas no Canarinho, que tem capacidade para 4.500. Até a tarde de domingo, a informação sobre público pagante não estava no site da CBF. A reportagem solicitou à Federação Roraimense os números, mas não teve resposta.
Folha de S.Paulo