Poesia ganhou Copa de 1970, escreveu Pasolini; mundo mudou – 10/06/2025 – Tostão


Após a Copa de 1970, o poeta e músico italiano Pier Paolo Pasolini escreveu que a poesia brasileira, a beleza, a improvisação e a fantasia tinham derrotado a prosa italiana, organizada e previsível. Não foi bem assim. A seleção brasileira, dirigida por Zagallo, era prosa e poesia.

Na mesma época, o poeta, escritor e músico Chico Buarque disse que os europeus eram os donos do campo, pela distribuição e pela ocupação dos espaços, enquanto o Brasil era o dono da bola, pela habilidade e pelo carinho com que a tratava.

O mundo e futebol mudaram, 50 anos, uma eternidade. Após a Segunda Guerra, a Europa, bastante destruída, iniciou a recuperação econômica e social, que se refletiu no futebol. Perceberam que, para melhorar o espetáculo, atrair o público e ganhar dinheiro, precisavam formar mais talentos, melhorar os gramados, o calendário e a arbitragem e diminuir a violência dentro e fora dos estádios. É o que o Brasil ainda não fez.

Com o tempo, além dessa evolução, passaram a contratar os bons jogadores de outros continentes e contar com a ajuda importante dos migrantes, que agora querem diminuir seguindo o modelo hediondo dos Estados Unidos. Hoje, o clichê dos anos 60 e 70 de que se formava um craque a cada semana no Brasil e os europeus eram cintura-dura, sem habilidade, não existe há muito tempo. Os craques estão presentes em todos os continentes.

Os europeus saíram também na frente nas mudanças estratégicas, especialmente nas duas últimas décadas, com o aumento da intensidade do jogo, a compactação entre os setores e a marcação mais de perto por todo o campo, desde a saída de bola do adversário. Apenas recentemente, com o grande aumento de treinadores portugueses e argentinos, os times brasileiros passaram a adotar uma postura mais moderna, embora ainda timidamente.

Outra grande mudança na Europa foi a valorização dos meio-campistas que jogam de uma intermediária à outra. Marcam, constroem e avançam. No Brasil, ocorreu o contrário, ao dividirem o meio-campo entre os volantes que marcam e os meias que atacam. Depois de Falcão e Cerezo, craques da Copa de 1982, o Brasil não teve um único meio-campista de grande prestígio mundial. Enquanto isso, os europeus tiveram Zidane, Kroos, Modric, Xavi, Iniesta e tantos outros que encantaram o mundo. Nenhum era o clássico camisa 10 que o Brasil tanto pede.

Isso precisa mudar. Repito, pela milésima vez, o Brasil não tem um grande craque no meio-campo porque não forma. Os jogadores de meio-campo com grande talento são deslocados desde as categorias de base para atuar mais perto do gol, pelo lado ou pelo centro. É preciso unir o passe especial do meio-campista com o drible espetacular dos meias mais avançados. Assim como o drible é o símbolo da individualidade, da habilidade, o passe representa o jogo coletivo. Os dois são essenciais.

No final de semana, começará a Copa do Mundo de Clubes, pela primeira vez com um enorme número de participantes de vários continentes. É jogo demais, mais uma competição para a Fifa, as federações de cada país e os investidores ganharem muito dinheiro. Os jogadores, especialmente os europeus, no mínimo, deveriam protestar, pois nesta época estariam de férias após uma temporada extremamente cansativa.

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Folha de S.Paulo