Chega o fim de ano, chega com ele o período de festas, que engloba as semanas do Natal e do Ano-Novo.
Período em que as pessoas aproveitam para se reunir com amigos, parentes e vizinhos, a fim de confraternizar, trocar presentes –minha sensação é que a cada ano o Natal se torna mais comercial– e prosear.
Papo vai, papo vem, nas rodinhas formadas por homens, costumeiramente o tema esporte vem à tona. Perto de 100% das vezes, predomina o futebol nas discussões, acaloradas, pois a paixão clubística surge com intensidade.
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Há de surgir um botafoguense a se vangloriar fogosamente, e com toda razão, pois o Glorioso levou no intervalo de nove dias Libertadores (inédito) e Campeonato Brasileiro (quebrando jejum de 29 anos).
Conversar-se-á também de seleção brasileira, atualmente uma triste e decepcionante seleção brasileira, que, com um futebol chinfrim, pena para se manter na zona de classificação para a Copa do Mundo de 2026, isso em um classificatório, o sul-americano, no qual seis dos dez participantes obtêm vaga direta.
As resenhas certamente abordarão a vitória de Vinicius Junior, astro no Real Madrid, no prêmio The Best, da Fifa.
O ex-flamenguista (e os flamenguistas alardearão que Vini foi cria da Gávea) tornou-se o primeiro brasileiro melhor do mundo no futebol desde Kaká (e os são-paulinos lembrarão que ele surgiu no Morumbi), em 2007.
Tudo isso muito válido em uma retrospectiva sucinta do ano, entremeada por petiscos e bebidinhas e por muitos sorrisos e vários abraços entre conhecidos.
Porém antes, durante ou depois da ceia e da esperada sobremesa, quem verdadeiramente enxerga o esporte precisa ir além do futebol praticado pelos homens, que continua a ser predileção nacional, e mesmo ir muito além do próprio futebol.
Em 2024, as mulheres do futebol brasileiro é que chegaram longe.
As Brabas do Corinthians ganharam a Libertadores pela quinta vez e, nos Jogos Olímpicos de Paris, a seleção, com uma base corintiana (incluindo o ex-treinador do clube Artur Elias), calou críticos para chegar à final contra os EUA e obter uma honrosa medalha de prata.
A seleção masculina, com Endrick e companhia, nem pelo Pré-Olímpico passou…
Voltando a Vini Jr., que ainda deve com a “amarelinha” (como dizia o saudoso Zagallo), ele merece elogios não apenas pelo troféu da entidade máxima do futebol, assegurado por votação maciça do público, mas também pela luta persistente contra o racismo –do qual é alvo constante na Europa.
A cor da pele não impediu e não impede Vini, 24, de brilhar.
Ele é negro com orgulho, e nos bate-papos de agora, de final de ano, devemos nos sentir orgulhosos (e expandir esse sentimento a quem nos rodeia), mais que dele, de uma brasileira negra que alçou o Brasil a um patamar de excelência fora do futebol.
Rebeca Andrade. 25 anos. Natural de Guarulhos (Grande SP). Atleta do Flamengo (olha aí outra chance de os rubro-negros se gabarem).
Para quem não lembra, a ginasta de 1,55 m e 45 kg se mostrou gigante e peso-pesado nas Olimpíadas.
Superou a fenomenal americana Simone Biles e ganhou o ouro no solo. Mais: ganhou prata no individual geral e no salto. Mais: liderou a equipe rumo ao bronze. Mais: tornou-se a maior esportista olímpica da história do país: duas medalhas de ouro, três de prata, uma de bronze.
Se Vini Jr. deve receber palmas, Rebeca tem de ser aplaudida incessantemente, até as mãos doerem.
Poderia até ser incluído na língua portuguesa um novo verbo, que acabo de inventar: “rebecar”. Como sinônimo de “arrasar”, “brilhar”, “mandar bem”, “detonar”. Seria uma justa e merecida homenagem.
Essa pequena notável, que tem miopia e astigmatismo, que superou três cirurgias por rompimento de ligamento no mesmo joelho, ganhadora neste mês do Prêmio Brasil Olímpico (do Comitê Olímpico do Brasil), merece ter o nome exposto e enaltecido.
Muito mais, neste ano, que qualquer outra figura do esporte brasileiro.
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Folha de S.Paulo