O maratonista Paulo de Paula – 06/05/2025 – No Corre


Aos quase 46 anos, o maratonista paulista Paulo Roberto de Paula, três Olimpíadas nas costas, exemplifica como poucos o surrado slogan ufanista “sou brasileiro, não desisto nunca”.

Numa idade em que a absoluta maioria de seus pares já pendurou o supertênis, ele segue alcançando marcas auspiciosas, como o 2h13min07s de Sevilha, em fevereiro, tempo que lhe valeu o primeiro lugar em sua categoria (a partir de 45 anos).

Mas manter-se no alto rendimento com tempos notáveis não é seu único feito. É que Paula o faz sem patrocínio, sem patente nem salário das Forças Armadas, sem clube, sem permuta de marcas esportivas e com uma Bolsa Atleta que deve minguar em breve.

Paula é treinado pelo irmão, examinado por médico recrutado entre os amadores a quem orienta, obtém suplementação de uma modelo e maratonista que lhe repassa algumas “vitaminas” e corre com tênis doados por camaradas de seu círculo.

Não tem nutricionista, porque “mal dá para comprar pacote de arroz, imagina um queijinho”. Podia ser pior: ele não tem filhos. Nem sempre consegue convites para participar das provas que elege correr. Os organizadores da maratona de Berlim, uma possibilidade para o segundo semestre, ainda não lhe responderam.

A outra alternativa para este 2025 é novamente estar com a delegação brasileira no Mundial de Atletismo. Em Tóquio, em setembro, seria sua quinta participação.

O Brasil não teve atletas na maratona nos Jogos de Paris do ano passado: Danielzinho, o único a obter índice olímpico, sucumbiu ao doping e a seus monstros internos, inviabilizando convites para quem não havia atingido a marca exigida, caso de Paula.

Nos outros Jogos, Paula ficou com o oitavo lugar em Londres, em 2012, com 2h12min17s; e foi o primeiro brasileiro no Rio, quatro anos depois, mas com tempo pior. Esteve ainda em Tóquio. Em mundiais, sua melhor marca foi um sétimo lugar em Moscou, em 2013, com 2h11min40s, quando terminou de mãos dadas com o compatriota Solonei Silva.

Mas o dado que espanta é este: seu recorde pessoal na maratona é mais recente, de 2022, quando cravou em Sevilha 2h09min51s. Tinha 42 anos na ocasião.

No último domingo de abril, ao participar da maratona NB, de Porto Alegre, corrida vencida pelo ex-coletor de lixo Johnatas Cruz, Paula sentiu a região posterior da coxa esquerda ainda no quilômetro 4, motivo suficiente para fazê-lo desistir da prova. Logo cedo, ainda no hotel, sofreu uma inusitada queda de pressão que o deixou alerta.

“Não iria colocar meu corpo em risco. O desmaio, a queda de pressão, é como um infarto, desliga o corpo, que vai se recuperando aos poucos”, disse à coluna.

Paula é crítico de quem “entope” seu calendário com provas longas em tão pouco tempo, como ele mesmo, atipicamente, fez este ano. A receita da longevidade, para ele, está em desviar dessas “armadilhas” e fazer uma cuidadosa preparação para uma ou duas provas anuais, descansar e “não saber de corrida” fora dos ciclos de preparação.

Por isso ele não repetiria o que fez Johnatas, que, mal saído de Porto Alegre, já tomava um avião para Tóquio, envolvido com compromissos de sua patrocinadora, a Asics.

Resta para Paula agora decidir seu destino: ele flerta com a ultramaratona, os 100km, uma transição que poderia vir já no próximo ano. Pode ainda se dedicar a melhorar seu tempo dos 42 km para pessoas com 45 anos ou mais.

Se o Brasil seguir batendo na trave nessa distância, talvez ele tenha motivos para se manter nela por mais algum tempo.

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Folha de S.Paulo