Neymar consegue tudo o que quer – 20/08/2025 – Juca Kfouri


O placar do Morumbi anunciava, implacável: Santos 0, Vasco 6.

Philippe Coutinho vivera tarde como havia muito tempo não vivia.

E o Cruzmaltino havia feito exibição histórica, como só fazia quando era protagonista.

Então, Neymar se sentou no gramado, pensou na morte da bezerra e chorou.

Um companheiro mais moço veio consolar o capitão caído, e ele o afastou.

Mal sabia o jovem generoso que haveria de sobrar para ele e seus colegas em seguida.

Daí, Fernando Diniz, ao perceber que repórter nenhum o procurava para comentar a exibição primorosa, dirigiu-se para onde as câmeras apontavam e o abraçou, como um pai abriga o filho.

E, de repente, fez-se o pranto incontrolável nos ombros do adversário.

O caminho até o vestiário, mais da metade do campo, foi percorrido solitariamente, em lágrimas. Lágrimas de crocodilo.

Apenas os fotógrafos e cinegrafistas o acompanhavam, silenciosamente, difícil dizer se respeitosamente.

Quando abriu a boca para desabafar, Neymar falou —desculpem a rara leitora e o raro leitor desacostumados a encontrar palavrões neste espaço— merda.

Sim, falou. Falou que foi uma m… e que seus parceiros deveriam pensar no que fizeram porque em caso contrário nem precisariam mais jogar o próximo jogo.

Os companheiros. Ele se excluiu.

Tirou o corpo fora e virou notícia, manchete, pelo Brasil e pelo mundo afora.

A goleada vascaína ficou em segundo plano.

Era exatamente o que Neymar queria e conseguiu.

Como conseguiu ser brilhante campeão da Libertadores apenas dois anos depois de ter estreado como profissional.

Ou como conseguiu ser excepcional coadjuvante de Messi e luzir na Champions de 2015, além de ganhar também o Mundial de Clubes.

Pela seleção brasileira bateu o pênalti que valeu a inédita medalha de ouro olímpica no Maracanã e xingou quem o aplaudia.

Quis sair do papel secundário no Barcelona para ser ator principal no PSG, e a Torre Eiffel se iluminou para recebê-lo na maior transação do futebol.

Conseguiu também ir de cisne a sapo na Cidade Luz e mergulhou no petróleo dourado do mundo árabe para continuar fazendo fortuna, agora sem jogar.

Quase finalmente, obteve a graça de voltar ao Santos para extrair o que o clube não tem, com o objetivo de voltar a vestir a camisa amarela e disputar a última Copa do Mundo, a taça que falta, a 33ª, na carreira.

Há quem aposte que o nome dele estará na lista dos convocados de Carlo Ancelotti nesta segunda-feira (25), como já está na pré-lista do treinador italiano.

Ah, sim, conseguiu ainda não apanhar de enfurecidos torcedores santistas na última terça-feira (19), o que, convenhamos, assumiu ares de façanha nada desprezível, porque nunca se sabem as consequências de enfrentar bestas-feras.

O menino Ney consegue tudo o que quer.

Se ao verdadeiro papai faltou lhe dar um mínimo de educação, ele aprendeu como, com birra e egoísmo, ranger de dentes e chutes no balde, e na bola com certeza, conseguir tudo e mais um montão.

Caso, enfim, consiga também se impor a Ancelotti e, além disso, ajudar a conquistar o hexacampeonato, admitamos, vamos todos ficar felicíssimos, tirar o chapéu para ele e botar a coroa de rei em sua cabeça.

Rei do marketing e, finalmente, do futebol.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.



Folha de S.Paulo