O placar do Morumbi anunciava, implacável: Santos 0, Vasco 6.
Philippe Coutinho vivera tarde como havia muito tempo não vivia.
E o Cruzmaltino havia feito exibição histórica, como só fazia quando era protagonista.
Então, Neymar se sentou no gramado, pensou na morte da bezerra e chorou.
Um companheiro mais moço veio consolar o capitão caído, e ele o afastou.
Mal sabia o jovem generoso que haveria de sobrar para ele e seus colegas em seguida.
Daí, Fernando Diniz, ao perceber que repórter nenhum o procurava para comentar a exibição primorosa, dirigiu-se para onde as câmeras apontavam e o abraçou, como um pai abriga o filho.
E, de repente, fez-se o pranto incontrolável nos ombros do adversário.
O caminho até o vestiário, mais da metade do campo, foi percorrido solitariamente, em lágrimas. Lágrimas de crocodilo.
Apenas os fotógrafos e cinegrafistas o acompanhavam, silenciosamente, difícil dizer se respeitosamente.
Quando abriu a boca para desabafar, Neymar falou —desculpem a rara leitora e o raro leitor desacostumados a encontrar palavrões neste espaço— merda.
Sim, falou. Falou que foi uma m… e que seus parceiros deveriam pensar no que fizeram porque em caso contrário nem precisariam mais jogar o próximo jogo.
Os companheiros. Ele se excluiu.
Tirou o corpo fora e virou notícia, manchete, pelo Brasil e pelo mundo afora.
A goleada vascaína ficou em segundo plano.
Era exatamente o que Neymar queria e conseguiu.
Como conseguiu ser brilhante campeão da Libertadores apenas dois anos depois de ter estreado como profissional.
Ou como conseguiu ser excepcional coadjuvante de Messi e luzir na Champions de 2015, além de ganhar também o Mundial de Clubes.
Pela seleção brasileira bateu o pênalti que valeu a inédita medalha de ouro olímpica no Maracanã e xingou quem o aplaudia.
Quis sair do papel secundário no Barcelona para ser ator principal no PSG, e a Torre Eiffel se iluminou para recebê-lo na maior transação do futebol.
Conseguiu também ir de cisne a sapo na Cidade Luz e mergulhou no petróleo dourado do mundo árabe para continuar fazendo fortuna, agora sem jogar.
Quase finalmente, obteve a graça de voltar ao Santos para extrair o que o clube não tem, com o objetivo de voltar a vestir a camisa amarela e disputar a última Copa do Mundo, a taça que falta, a 33ª, na carreira.
Há quem aposte que o nome dele estará na lista dos convocados de Carlo Ancelotti nesta segunda-feira (25), como já está na pré-lista do treinador italiano.
Ah, sim, conseguiu ainda não apanhar de enfurecidos torcedores santistas na última terça-feira (19), o que, convenhamos, assumiu ares de façanha nada desprezível, porque nunca se sabem as consequências de enfrentar bestas-feras.
O menino Ney consegue tudo o que quer.
Se ao verdadeiro papai faltou lhe dar um mínimo de educação, ele aprendeu como, com birra e egoísmo, ranger de dentes e chutes no balde, e na bola com certeza, conseguir tudo e mais um montão.
Caso, enfim, consiga também se impor a Ancelotti e, além disso, ajudar a conquistar o hexacampeonato, admitamos, vamos todos ficar felicíssimos, tirar o chapéu para ele e botar a coroa de rei em sua cabeça.
Rei do marketing e, finalmente, do futebol.
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Folha de S.Paulo