Hamilton, LeBron, Carol Solberg e Neymar: manifestações políticas marcaram o esporte em 2020


Com grito de ‘Fora, Bolsonaro’ ou apoio ao Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), atletas consagrados de diversas modalidades se destacaram também fora dos campos, quadras e pistas

ReproduçãoProtestos na NBA contra a violência policial e racismo marcaram 2020

Você certamente já ouviu a frase “futebol e política não se misturam”. Essa sentença caiu por terra neste ano de 2020, não somente no futebol, mas no esporte em geral. Em meio a uma pandemia de Covid-19, polarização política mundo afora e questões raciais efervescentes, os atletas decidiram se posicionar de forma contundente. Tanto é verdade que o Comitê Olímpico dos Estados Unidos anunciou neste mês de dezembro que não irá punir os esportistas que se manifestarem politicamente no pódio dos Jogos Olímpicos de Tóquio, que acontecerão em 2021, no Japão. O único empecilho para essa nova visão é o Comitê Olímpico Internacional (COI). Segundo suas regras, “atletas e envolvidos com a realização dos Jogos estão proibidos de fazer qualquer tipo de manifestação política, incluindo gestos com possíveis significados – como ajoelhar-se ou levantar o punho –, mensagens escritas em faixas, placas, camisetas ou o uso de um símbolo em potencial, como broches ou braçadeiras”. O não cumprimento pode gerar punições individuais e para as delegações. Enquanto a organização de Tóquio-2021 ainda delibera sobre o assunto, vale a pena relembrar as principais manifestações do esporte em 2020.

Antirracismo na NBA
Talvez a mais marcante tenha sido o boicote do Milwaukee Bucks na bolha da NBA, em agosto. Depois da morte de George Floyd, um homem negro sufocado até a morte por um policial branco em Minnesota, vários jogadores participaram dos protestos que tomaram as ruas. Outros casos de violência policial eclodiram. Depois do caso de Jacob Blake, um homem negro que foi alvejado com quatro tiros nas costas ao entrar em seu carro, a equipe liderada por Giannis Antetokounmpo se recusou a entrar em quadra para pedir por justiça. Outros times aderiram e a competição foi paralisada por 24 horas. Os atletas da NBA também foram fundamentais na eleição do democrata Joe Biden como presidente dos EUA após diversas campanhas de incentivo ao voto, que não é orbigatório no país norte-americano e historicamente tem baixa adesão entre a população negra.

“Fora, Bolsonaro” no vôlei de praia
No Brasil, o destaque da dualidade esporte e política foi a jogadora de vôlei Carol Solberg. A atleta de 33 anos gritou “Fora, Bolsonaro” ao final de uma entrevista para o canal SporTV, depois de conquistar a medalha de bronze no Circuito Nacional, em setembro. A manifestação não foi bem vista por patrocinadores e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. O subprocurador-geral do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) de Vôlei, Wagner Dantas, encaminhou uma denúncia contra Carol. Ela foi julgada e condenada a pagar uma multa, que posteriormente virou uma advertência. Em segunda instância, Solberg foi absolvida por 5 votos a 4 porque o Pleno do STJD considerou que ela não “feriu ou desrespeitou” nenhuma lei. O caso ajudou a colocar a liberdade de expressão dos atletas em pauta.

Voz ativa na seleção brasileira
Quem também soltou a voz foi o atacante Richarlison, que atua no Everton, da Inglaterra, e na seleção brasileira. Por meio de suas redes sociais, o jogador se posicionou sobre diversos temas como as queimadas no Pantanal, o caso de estupro contra a influenciadora Mariana Ferrer, a prisão do motorista Robson na Rússia, casos de violência policial no Rio de Janeiro e a morte de um homem negro no Carrefour. Em seu discurso mais incisivo, o Pombo usou os microfones após a vitória do Brasil contra o Uruguai, pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2022, para cobrar o governo federal sobre o apagão que atingiu o Amapá. “Queria dedicar esse gol a todas as pessoas do Amapá, que estão sofrendo muito durante esses dias. Como cidadão brasileiro, eu peço que as autoridades se pronunciem, tomem uma decisão logo, o povo está sofrendo. Que eles [os governantes] possam olhar com carinho o povo de lá, são cidadãos de bem, estão querendo o melhor para eles, para os filhos deles. Imposto está caro, pagando a comida cara, e o povo sofrendo, Espero que possam tomar as providências logo”, disse. No último dia 20, Richarlison se solidarizou a Gerson após o jogador do Flamengo acusar Índio Ramirez, do Bahia, de racismo.

 

Black Lives Matter na Fórmula 1
Quem também se manifestou após as mortes de pessoas negras nos Estados Unidos foi o britânico Lewis Hamilton. Único negro na categoria mais famosa do automobilismo, o piloto da Mercedes foi às ruas de Londres em protestos, se ajoelhou durante o hino em alguns GPs (protesto notabilizado pelo jogador de futebol americano Colin Kaepernick) e ficou incomodado com os companheiros que não o seguiram. Hamilton chegou a ganhar o apoio do diretor da Fórmula 1 Ross Brawn. “O Lewis é um grande embaixador do esporte. Os comentários deles são válidos e o apoiamos completamente. O que aconteceu [com George Floyd] foi horrível. Acontece demais e acho que já sabemos qual a reação do público. Foi a gota d’água e nós o apoiamos completamente”, disse à Sky Sports. O recordista de títulos (sete, ao lado de Michel Schumacher) e vitórias (95) na F-1 também se mostrou “devastado” após a morte de João Alberto Silveira Freitas em uma unidade do Carrefour em Porto Alegre.

Jogadores saem de campo após racismo
No último mês do ano, foi a vez do futebol entrar nos atos políticos contra o racismo. A partida entre Paris Saint-Germain e Ístanbul Basaksehir, no dia 8 de dezembro, pela última rodada da fase de grupos da Liga dos Campeões da UEFA, foi interrompida durante o primeiro tempo por causa de ofensa racista do quarto árbitro contra o assistente técnico do time turco, Pierre Webó. Os jogadores de ambas as equipes – entre eles o brasileiro Neymar – e as comissões técnicas deixaram o gramado em protesto. Foi a primeira vez que algo do tipo aconteceu no esporte mais popular do mundo. O jogo foi retomado no dia seguinte com outra equipe de arbitragem. A atitude foi celebrada por autoridades de muitos países. O racismo não parece estar perto de acabar, mas é necessário que vozes influentes contestem esses males. Quem melhor do que ídolos para lutar contra isso?

Clubes se solidarizam a Gerson
O meio-campista Gerson, do Flamengo, acusou o jogador Índio Ramírez, do Bahia, de tê-lo ofendido durante um jogo entre as duas equipes no último dia 20, no Maracanã. “O Bruno Henrique fingiu que ia chutar uma bola. Ele reclamou com o Bruno, e eu fui falar com ele. E ele disse bem assim para mim: ‘Cala a boca, negro’. Isso eu não aceito”, contou o flamenguista. Ramírez nega, mas foi afastado previamente. “É indispensável, imprescindível e fundamental que a voz da vítima seja preponderante em casos desta natureza”, anunciou o clube baiano. Guilherme Bellintani, presidente do Bahia, ligou para Gerson para manifestar solidariedade. Outros clubes, entre eles os quatro grandes de São Paulo, usaram as redes sociais para apoiar o jogador rubro-negro. O Corinthians deu voz a referências negras de sua equipe como Gil e Cazares nesta luta contra o preconceito. “Quando eu era criança, fui preparado pela minha mãe para. Não é isso que tem que acontecer. O racismo não tem que acontecer”, definiu, de forma eloquente, o jovem volante corintiano Xavier.

 





Fonte: Jovem Pan