Candidato único na eleição que vai definir o novo presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) no próximo domingo (25), Samir Xaud, 41, foi alvo de processos trabalhistas em Boa Vista e chegou a ter os bens bloqueados devido a dívidas trabalhistas de uma empresa da qual era sócio, uma loja de móveis na capital de Roraima.
As ações, às quais a Folha teve acesso, tramitaram principalmente em 2016 e 2017 e resultaram no pagamento por Xaud, mediante acordo, de ao menos R$ 24 mil após a Justiça determinar bloqueio de veículos e imóveis e de buscar saldos bancários em seu nome.
A troca de comando na CBF ocorre após o afastamento de Ednaldo Rodrigues pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. O ex-presidente é suspeito de ter se beneficiado do uso de uma assinatura falsa em um acordo que visava encerrar os litígios internos na entidade. Ele desistiu de recorrer da suspensão.
Nos cinco processos, funcionários da Difratelli Móveis afirmam que os salários e os valores proporcionais de rescisão (como férias e 13º salário) não foram pagos integralmente e relatam também falta de recolhimento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e retenção das carteiras de trabalho.
Em um dos casos, uma ex-funcionária disse que foi recebida com gritos e xingamentos quando foi cobrar da empresa os valores devidos, no ano de 2016, data em que em tese o novo presidente da CBF não era mais sócio da empresa.
Nas ações, Xaud argumentou que já tinha vendido a empresa de móveis quando as ações foram protocoladas, mas a Justiça não acolheu a manifestação argumentando que os empregados foram contratados quando ele ainda era sócio e listando artigos do Código Civil e da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) sobre responsabilidade solidária em relação a débitos trabalhistas.
A lei determina que sócios que estão em processo de saída da empresa respondem pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figuraram como sócios em ações ajuizadas até dois anos depois de registrada a mudança no contrato.
A Justiça tentou em todos os casos notificar e cobrar os débitos dos novos sócios, mas não encontrou bens ou saldos bancários. Com isso, efetuou a cobrança e os bloqueios em relação a Xaud e sua esposa, Natália, também ex-sócia da empresa.
Em nota enviada à Folha, o futuro presidente da CBF disse que “desconhece qualquer processo trabalhista em que tenha descumprido obrigações legais ou decisões judiciais” e que “sempre atuou de forma regular, tanto na esfera pública quanto privada, cumprindo integralmente seus deveres legais, fiscais e trabalhistas”.
No texto, ele também “reafirma seu compromisso com a ética, a legalidade e a transparência em todas as áreas de sua atuação”.
Em um dos casos, um projetista e os três sócios da empresa (incluindo Xaud e sua esposa, Natália) chegaram a um acordo, que então foi homologado pela Justiça do Trabalho.
Dois meses depois, em janeiro de 2017, o profissional disse à Justiça que o acordo não estava sendo cumprido e nenhum pagamento das parcelas acertadas havia sido feito.
O pagamento de R$ 9.400 ao projetista aconteceu a partir da penhora de valores em contas bancárias de Xaud e sua esposa.
Em um dos processos, um dos juízes afirma que os relatos indicam que a empresa foi abandonada pelos sócios, que não respondiam a intimações da Justiça.
Pelos documentos, Xaud e a esposa foram os únicos sócios da empresa de 2013 a 2016.
O futuro presidente CBF é médico. Ele foi eleito para o comando do futebol de Roraima recentemente, para o lugar do próprio pai, Zeca Xaud, presidente da entidade roraimense desde a década de 1980. Seu mandato começaria em 2027.
Ele foi o primeiro a se inscrever para a disputa que acontece no domingo (25), com o apoio de 25 federações e 10 clubes.
Reinaldo Carneiro Bastos, presidente da Federação Paulista de Futebol, tentou lançar candidatura e conseguiu apoio de 32 clubes, mas as regras da CBF exigem o endosso de ao menos oito federações estaduais para inscrição. Como Xaud conseguiu apoio de 25 das 27 federações —apenas as de São Paulo e Mato Grosso ficaram de fora—, tornou-se impossível qualquer outra candidatura.
Desde que o nome de Xaud figurou como favorito à sucessão de Ednaldo, vieram à tona na imprensa diversas reportagens relatando denúncias e irregularidades.
Reportagem do UOL mostrou que Xaud tentou regularizar terreno em Roraima situado em área ambiental. Ele nega ser dono da propriedade.
O jornal Globo, por sua vez, revelou que ele teria sido suspenso por dois anos da função de perito médico do Tribunal de Justiça de seu estado por erro médico. Xaud teria periciado apenas o braço de um motociclista que solicitava indenização de seguro obrigatório (DPVAT) por lesão permanente na perna. Ele nega que a falha tenha acontecido.
Reportagem de O Estado de S. Paulo mostrou que Xaud responde a um processo por improbidade administrativa, relativo à época em que foi diretor-geral do Hospital Geral de Roraima, de 2017 a 2020. Ele e outros seis gestores teriam simulado serviços para justificar pagamentos a uma empresa, causando prejuízo de R$ 1,4 milhão aos cofres públicos. Ele afirma que o processo não mostra qualquer indício de irregularidade de sua parte.
Folha de S.Paulo