Chegou a hora da Maratona do Rio de Janeiro – 17/06/2025 – No Corre


Se você é usuário de rede social, provavelmente já foi bombardeado por postagens da Maratona do Rio, que começa no feriado de Corpus Christi e só termina domingo, com a prova de 42 km, a maratona propriamente dita.

Ter quatro corridas em quatro dias diferentes é uma das novidades desta edição da maior maratona do Brasil em participantes, ainda que a maioria dos corredores alinhe para a prova de 21 km, no sábado.

Além disso, espere por uma ocupação visual do Rio. Nenhum organizador de corridas do Brasil tem a expertise de ativação de marcas (ou “live marketing”, em português fluente) da Dream Factory, empresa proprietária da mara.

Ela é um dos braços da holding Dreamers, da família Medina, criadora do festival Rock in Rio, evento em que o live marketing chegou ao estado da arte.

No começo do ano, a organizadora anunciou ainda provas com a marca MDR, de Maratona do Rio, em todas as regiões do país, exceto a Norte, para atrair mais corredores também para o Rio, uma vez que esse novo circuito culminaria na prova carioca de 2026. A primeira etapa é no Recife.

Outra novidade da Rio 2025 é contar com o patrocínio de uma empresa de jogos de azar, a primeira inserção desse setor nas provas de rua. Houve zum-zum-zum entre os influencers de corrida, algo bastante paradoxal, considerando que investir pesado nessas figuras é uma estratégia corrente do segmento.

O futebol está dominado por esse mercado, e não é o caso, acho, de se incomodar com sua entrada nas provas de rua. Pressupor uma certa pureza na corrida é ir contra a lógica capitalista.

Talvez ficasse um pouco mais difícil justificar o ingresso de uma companhia tabagista, caso isso fosse permitido, embora ambos os produtos, cigarros e bets, assemelham-se ao criar algum tipo de dependência.

Não lamento a entrada dos jogos de azar no evento do Rio, mas manifesto aqui estranhamento ao constatar que a empresa que o organiza é, ao fim e ao cabo, a mesma que se forjou a partir de um festival de música cujo slogan é “Por um mundo melhor”.

É que, no Brasil, Bruno Gualano já o disse aqui, o público majoritário dos jogos de azar tem renda média de cinco salários mínimos e compromete seu ganho principal nas apostas.

Dinheiros significativos do Bolsa Família, como se sabe, foram perdidos para as bets.

O fato de as apostas estarem à mão, no celular, excita, assim como as promessas das empresas, mesmo as mais disparatadas. No domingo passado (15), antes do jogo Palmeiras x Porto, o patrocinador de um canal que transmitia a partida sugeriu que, em vez de apostar na vitória do Palmeiras e ganhar tanto, se apostasse no Palmeiras e no gol de Estêvão. Com isso, à bolada seriam acrescidos dez por cento da importância.

Explicar que indicar e acertar o artilheiro diminuía a possibilidade de êxito em muito mais de dez por cento não lhes pareceu necessário.

Deve haver quem não se incomode com a ocupação dessas brechas, com o uso de expedientes ardilosos e com o fato de que, ao final, quem paga o pato são os mesmos otários de sempre.

Por aqui, legalidade e moralidade nem sempre andam juntas, como bem sabe o empresariado brasileiro, tão eloquente ao falar de propósito, mas que não se peja em fazer lobby por renúncias fiscais intermináveis, com impacto deletério sobre as finanças públicas.

Quando o governo sugere o corte de parte desses privilégios, como fez na semana passada, a resposta é unívoca: tire a mão peluda de cima do meu incentivo.

Que o conserto do “fiscal” se faça nos gatilhos do salário mínimo, na aposentadoria (tirante a dos militares e do Judiciário), que incida sobre quem mal tem para se alimentar.

Ocorre-me aqui um argumento: ao restringir os ganhos de quem muito pouco ou nada tem, sobrará menos para se perder nas bets.

Se forem usá-lo, fineza citar o autor.

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Folha de S.Paulo