Ancelotti deve ter na seleção salário igual a CEO do Itaú – 09/05/2025 – Esporte


A necessidade de contratar um treinador respeitado internacionalmente, com amplo histórico de títulos e capaz de tirar a seleção brasileira da crise técnica que assola a equipe fez Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), autorizar um grande investimento para chegar a um acordo com o italiano Carlo Ancelotti, 65.

Para contar com o atual técnico do Real Madrid na reta final das Eliminatórias e, sobretudo, na disputa da Copa do Mundo de 2026, a entidade topou oferecer um salário de R$ 60 milhões anuais —R$ 5 milhões por mês, bem próximo do que ele ganha atualmente no clube espanhol—, quase do dobro do que recebia Tite, comandante do Brasil nos Mundiais de 2022 e 2018.

Também posicionaria Ancelotti como profissional mais bem pago entre aqueles que comandam seleções. Atualmente, o maior salário pertence ao alemão Thomas Tuchel, que fatura R$ 3,1 milhões por mês para comandar a Inglaterra. O argentino Mauricio Pochettino aparece em segundo na lista, com R$ 2,8 milhões mensais à frente da equipe dos Estados Unidos. Os vencimentos dos dois foram revelados pelos jornais The Sun e The Athletic.

É prevista, ainda, uma cláusula de aumento automático de 20% em sua remuneração caso a seleção seja semifinalista do próximo Mundial.

Além do salário, a proposta da CBF inclui gastos para aluguel de um imóvel no Rio de Janeiro, plano de saúde internacional e seguro de vida.

Como base de comparação, salários tão altos e amplos benefícios podem ser encontrados nas cúpulas de algumas das maiores empresas do Brasil. Há casos de executivos com remuneração na casa das dezenas de milhões por ano.

No topo da lista estão os CEOs do banco Itaú Unibanco, com cerca de R$ 68 milhões anuais, e da empresa de planos de saúde Hapvida, com aproximadamente R$ 67,5 milhões, segundo levantamento realizado pelo consultor em governança corporativa Renato Chaves, com base em dados das companhias registrados na CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

Na produtora de carnes JBS, o valor gira em torno de R$ 58 milhões, e na mineradora Vale, R$ 52,5 milhões. O levantamento abrange as informações mais recentes disponíveis, de 2023, sobre empresas de capital aberto que compõem o Ibovespa, indicador de desempenho de ações negociadas na Bolsa.

A divulgação das remunerações na CVM não expõe o CPF nem qualquer identificação pessoal dos executivos, segundo Chaves, mas é praxe que o maior salário seja o do CEO na hierarquia das empresas.

No alto escalão, os valores reúnem salário fixo, salário variável (bônus e participação nos lucros), plano de ações e benefícios pagos no ano.

Na avaliação do consultor, há uma diferença no grau de responsabilização dos CEOs e dos técnicos, que deveria ser corrigida.

“Quando o time não vai bem, a derrota é atribuída ao treinador, que é penalizado com demissão, enquanto o time continua. Mas no caso dos CEOs, quando algo vai mal e precisa de responsabilização, a defesa costuma dizer que é impossível uma pessoa saber de tudo e que não dá para ser super homem”, afirma Chaves.

Para ele, falta uma regra que obrigue os CEOs a devolverem parte de seus bônus e suas remunerações variáveis caso cometam uma fraude ou falha grave no cargo, como acidentes ambientais por falta de investimento. “Seria interessante ter uma previsão de que os executivos devolvam parte da remuneração adicional que receberam pelo desempenho que se provou frágil e gerou prejuízo”, diz.

Ancelotti reúne qualidades que aproximam seu perfil ao de um CEO de alto desempenho: exerce liderança com discrição e autoridade, sabe gerir talentos com inteligência emocional e promove estabilidade em seu grupo de trabalho mesmo sob alta pressão.

Seu currículo possui feitos como ser o único técnico com quatro títulos da Champions League, duas pelo Milan e duas pelo Real Madrid. Conquistou troféus nacionais nas cinco principais ligas da Europa –Itália (Milan), Inglaterra (Chelsea), França (PSG), Alemanha (Bayern) e Espanha (Real Madrid)– e soma mais de 25 taças, incluindo Copas nacionais e Supercopas.

O italiano é reconhecidamente um profissional capaz de extrair o potencial máximo de seus atletas, com uma abordagem que combina gestão de elenco e adaptações no desenho do time. Ele não é do tipo que tem apego a esquemas táticos. Em vez disso, dá confiança para seus atletas e busca adaptar suas ideias ao estilo de jogo dos comandados.

Sob seu comando, quatro jogadores alcançaram reconhecimento como o melhor do mundo: o ucraniano Shevchenko (2004, Milan), o brasileiro Kaká (2007, Milan), o português Cristiano Ronaldo (2014, Real Madrid) e o francês Benzema (2022, Real Madrid).

O cenário que ele deverá encontrar na CBF, no entanto, é bem diferente do que ele habituou-se ao longo de sua carreira, construída exclusivamente na Europa.

Muito mais do que problemas dentro de campo —com sucessivos fracassos nas últimas Copas do Mundo desde sua já distante última conquista, em 2002, além de uma fraca campanha nas Eliminatórias para o Mundial de 2026 (ocupa a quarta posição, a dez pontos da líder Argentina)—, a seleção sofre com a gestão caótica da CBF.

Ednaldo Rodrigues, presidente da entidade, está na mira do STF (Supremo Tribunal Federal), que vai julgar o processo que o levou a assumir o cargo, em 2022.

O órgão vai se debruçar sobre a legitimidade do Ministério Público para firmar TACs (Termos de Ajustamento de Condutas) com entidades esportivas, como a CBF. O instrumento foi usado por Ednaldo para por fim a uma disputa judicial que questionava a eleição vencida pelo cartola.

Na esteira do processo, a deputada Daniela Carneiro (União Brasil-RJ) protocolou uma petição solicitando o afastamento imediato do cartola. Ela baseia seu pedido em um laudo que questiona a autenticidade da assinatura do Coronel Nunes no TAC firmado no início desse ano.

O ministro Gilmar Mendes rejeitou o pedido da parlamentar, mas determinou a apuração sobre a denúncia da assinatura falsa.

A instabilidade política na CBF é tema que preocupa Ancelotti e pode dificultar a conclusão do acerto com o italiano. Nenhum anúncio deverá ser feito por ele, no entanto, até acertar e tornar pública sua saída do Real Madrid. De acordo com o jornal Marca, da Espanha, isso pode ocorrer no fim de semana, depois do clássico com o Barcelona, pelo Campeonato Espanhol.

Até lá, a seleção brasileira vai continuar à deriva. Nesta quinta-feira (8), completa-se 41 dias que a equipe está sem comandante, desde a demissão de Dorival Júnior.



Folha de S.Paulo