Com Joaquin Phoenix, Ari Aster se afasta do terror, gênero pelo qual ficou conhecido, em fantasia psicológica perturbadora de três horas. Filme estreia no Brasil nesta quinta-feira (20). “Beau tem medo”, novo filme do diretor Ari Aster (“Hereditário”), não é fácil.
Mais fantasia psicológica perturbadora do que terror, gênero pelo qual o cineasta ficou conhecido, a história estrelada por Joaquin Phoenix (“Coringa”) é uma longa viagem ruim (“bad trip”, se preferir) de ácido.
Isso não quer dizer que a produção seja ruim.
Ao ocupar quase totalmente – por mais que em ritmo irregular – suas três horas de duração, o filme que estreia nesta quinta-feira (20) nos cinemas brasileiros tem tudo para ser daqueles que dividem o público entre amor e ódio. Sem muito espaço para meios-termos.
Assista ao trailer de ‘Beau tem medo’
O fantástico mundo de Beau
Expansão da história e dos temas explorados pelo cineasta no curta “Beau” (2011), “Beau tem medo” segue a jornada fantástica de um homem frágil, ansioso e (talvez) gentil (demais) até a casa de sua mãe controladora, que morreu repentinamente.
No caminho, ele é atropelado, sequestrado, abrigado por uma família suspeita suburbana, forçado a usar drogas, perseguido, esfaqueado, se junta a uma trupe de teatro na floresta e delira.
Tanto que é difícil estabelecer o que é verdade nisso tudo e o que é a visão de mundo do protagonista.
Como no começo, em que o muito provavelmente agorafóbico Beau (Phoenix) vê uma sociedade distópica do outro lado de sua porta, com cadáveres abandonados no asfalto, tiros aleatórios e carros em chamas.
Com o tempo, algo que o filme tem de sobra, o desespero gerado pelos exageros gritantes e pela constante humilhação do personagem pode ser percebido como um humor non-sense, por mais que nunca fique muito claro que se sua existência é intencional.
Nathan Lane, Joaquin Phoenix e Amy Ryan em cena de ‘Beau tem medo’
Divulgação
A viagem
O sempre magnético (e conhecido por interpretações na linha entre sanidade e loucura) Phoenix confere credibilidade – com uma atuação sofrida e marcada por excessos certeiros – ao roteiro de Aster, pelo menos por tempo suficiente para que suas provocações surtem efeito.
Uma pena que ele seja a única peça constante do excelente elenco. Os excelentes Amy Ryan, Nathan Lane (ambos de “Only murders in the building”), Parker Posey (da nova versão de “Perdidos no espaço”) e Patti LuPone (uma lenda da Broadway) aparecem apenas o bastante para que o público lamente sua ausência.
A beleza oferecida pela mudança de cenários – o caos urbano, o subúrbio macabro, a floresta sombria, a casa luxuosa – combinada com o poder dos delírios de Beau, que em certo momento tomam forma de lindas ilustrações, também facilita a vida do espectador diante de um ritmo que sofre em diversos momentos.
A discussão sobre durações de filmes pode estar cansada, mas é fato que três horas exigem muito do público e da obra, que deve se desdobrar para se manter atraente por tanto tempo.
Por vezes, um respiro bem utilizado é a maior arma de um contador de histórias. Com tanta agonia e aflição, em especial na sua primeira hora, “Beau tem medo” certamente faz com que quem está assistindo abrace seus primeiros momentos de paz.
O problema é que tudo dura alguns minutos além do que deveria. O caos é muito caótico. O descanso, um tanto tedioso. Lá pela metade, a jornada parece uma viagem ruim de ácido. Os caminhos são inesperados, mas nem sempre os mais bem-vindos.
“Beau tem medo” é certamente o mais interessante dos filmes de um diretor empolgante, que ainda tem “Midsommar: O mal não espera a noite” (2018) no currículo. Só é difícil dizer que seja o melhor.
Fonte: Pop & Arte