Pais pedem liberdade de expressão para alunos e professores de escola com gestão militar no DF | Distrito Federal


No painel, além de homenagear personalidades, os estudantes usaram desenhos, textos e charges que falam sobre racismo e discriminação. Alguns deles traziam críticas à violência policial contra a comunidade negra.

Nesta quinta-feira (2), os pais dos estudantes se reuniram para pedir liberdade de expressão na escola militarizada. Também participaram do ato, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), do Movimento Negro, da União Brasileira de Estudantes e deputados da Câmara Legislativa do DF (saiba mais abaixo).

Grafite de Nelson Mandela feito em 2018, no CED 1 da Estrutural, que foi apagado pela PM em 2019 — Foto: Ana Elisa Santana/Arquivo pessoal

A mesma escola já havia chamado a atenção quando, em 2019, os militares apagaram um grafite com o rosto do ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela – ícone da luta pela igualdade racial – que havia sido pintado em um muro, antes da gestão da PM (veja imagem acima). À época, a direção do Centro Educacional 1 decidiu refazer a imagem.

Desta vez, no dia 22 de novembro passado, o diretor disciplinar da escola, tenente Araújo, teria pedido para que os murais sobre o Dia da Consciência Negra fossem retirados. “Eu respondi que não ia tirar, que a escola não vai censurar o trabalho de alunos”, conta a vice-diretora.

A PM afirma que não houve o pedido para a retirada dos cartazes do mural. “Houve sim, uma consultoria junto a direção da escola sobre o tema abordado, uma vez que não condiz com a realidade e a decisão ter sido tomada de maneira unilateral, sem qualquer diálogo com a coordenação disciplinar que faz parte da gestão compartilhada da escola”, diz a corporação.

Charge de mural feito por alunos do CED 01 da Estrutural, para o Dia da Consciência Negra — Foto: TV Globo/Reprodução

A unidade de ensino público é um dos colégios de Brasília que funcionam com o modelo compartilhado de ensino militarizado. De acordo com a vice-diretora, Luciana Pain, dentro do regimento das escolas cívico-militares, há incisos que “são bem claros” quanto a autonomia didático-pedagógica.

“Não pode existir essa interferência”, diz a vice-diretora da escola.

“Quando o tenente me procurou, eu falei para ele usar isso como uma oportunidade para conversar com os alunos, juntá-los na quadra, debater o tema. Ele disse que iria remeter a questão aos superiores dele”, conta Luciana Pain.

Mural feito por alunos do CED 01 da Estrutural, para o Dia da Consciência Negra — Foto: Arquivo pessoal

Os cartazes não chegaram a ser retirados, mas o caso acabou parando na Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). A comissão denunciou a suposta censura à Secretaria de Segurança Pública, à corregedoria da PM, à Secretaria de Educação, ao comitê de ética da Câmara Federal e ao Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do Ministério Público (MPDFT).

Em nota, a Secretaria de Educação disse que “considera preocupante o fato de um estudante ter a imagem das Forças de Segurança associada ao racismo ou ao nazismo e acha importante que o tema seja debatido durante o processo pedagógico”.

Protesto por liberdade de expressão

Escola militarizada na Estrutural recebe manifestação em favor da liberdade de expressão

Escola militarizada na Estrutural recebe manifestação em favor da liberdade de expressão

Nesta quinta (2), a quadra esportiva da escola foi palco para a manifestação em defesa dos alunos e dos professores, e em favor da liberdade de expressão na escola. De acordo com o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da CLDF, deputado Fábio Félix (Psol), é “absurdo e ilegal”, que policias interfiram na parte pedagógica da escola.

“A liberdade de cátedra é uma garantia constitucional”, diz o deputado distrital.

Para o presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB-DF, Beethoven Andrade, os cartazes expressam a forma como os alunos percebem a realidade – dentro e fora dos muros da escola. “Eles mostraram o que, de fato, acontece ao lado da casa deles, o que acontece com os irmãos, com os pais, e até mesmo com eles. Então, essa é uma verdade que a gente tem que começar a compreender e tentar mudar esse cenário”, diz o advogado.

“Não é porque uma criança fala que o seu familiar, que a sua comunidade sofre uma violência policial, que ela está errada. Simplesmente ela está mostrando uma realidade, e nós devemos reconhecer isso”, diz o representante da OA, Beethoven Andrade.

Como funcionam as escolas militarizadas no DF

O Distrito Federal tem, atualmente, dez escolas com gestão cívico-militar. Nelas, o modelo de ensino é semelhante ao das escolas militares no que diz respeito à disciplina. Policiais e bombeiros integram o quadro de servidores.

Segundo o GDF, as regiões escolhidas para o projeto foram baseadas em quatro critérios:

  1. Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), principal indicador sobre a qualidade do ensino no Brasil
  2. IDH, índice medido anualmente que tem como base indicadores de saúde, educação e renda
  3. Mapa da violência do local
  4. Estrutura das escolas

Os estudantes devem usar uniforme. Os meninos precisam ter cabelos curtos e as meninas prender o cabelo em um coque.

No contraturno do ensino regular, os policiais podem dar aulas de musicalização, ética e cidadania, por exemplo.

Em 2019, a implementação da proposta, feita pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), gerou críticas, principalmente do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro).

O modelo é defendido pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) “para melhorar a qualidade do ensino público”. A adesão das unidades da federação é voluntária.

Quando anunciado, em 2019, o programa previa 200 escolas do tipo até 2023. Em 2020, mais de 50 aderiram ao projeto piloto. A previsão era de que cada escola recebesse R$ 1 milhão para implementar o projeto, de acordo com o Ministério da Educação.

VÍDEO: PM intervém em briga de escola militarizada no DF

Vídeo mostra policial militar derrubando aluno de escola pública em Ceilândia, no DF

Vídeo mostra policial militar derrubando aluno de escola pública em Ceilândia, no DF

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Fonte: Fonte: G1