O processo de organização e aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2021 está transcorrendo sem os serviços de uma empresa terceirizada de monitoramento de riscos, que teria como objetivo:
- prevenir ataques de hackers a dados pessoais dos candidatos,
- monitorar a determinação dos locais de prova de cada estudante;
- cuidar dos processos de contratação;
- validar a publicações de editais;
- garantir a segurança da divulgação dos resultados e das vistas pedagógicas da redação.
O contrato entre o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e a Módulo Security Solutions, firmado em 2016, expirou em 26 de julho de 2021 e não foi renovado.
Quando os servidores emitiram um ofício para saber como proceder diante dessa mudança de protocolo, o Inep respondeu em “tom de ameaça”, segundo os funcionários (leia mais abaixo).
“Era uma empresa espetacular, que monitorava tudo e apoiava os servidores do Inep. Não ter esse serviço é espantoso”, afirma Maria Inês Fini, ex-presidente da autarquia.
“Esse monitoramento acontece principalmente semanas antes do exame, quando começam os ataques de hackers. A empresa terceirizada preserva o banco de inscritos e as mudanças de local de prova, por exemplo”, diz Fini.
Ela deixa claro que essas possíveis invasões a sistemas de dados do Inep não colocam em risco o sigilo das questões ou o tema da redação, porque são informações mantidas em um ambiente seguro e blindado.
O g1 entrou em contato com o Inep e com a Módulo Security para obter esclarecimentos, mas não recebeu resposta até a última atualização desta reportagem.
Segundo servidores ouvidos em condição de anonimato, esse encerramento do contrato pode ter sobrecarregado a equipe de logística.
Dos 37 funcionários que pediram demissão no início de novembro, pelo menos 7 eram responsáveis por promover as atividades de gestão de riscos e avaliar os meios tecnológicos necessários à aplicação de avaliações, exames e pré-testes de itens.
Documentos obtidos pelo g1 mostram que, diante da ausência dos serviços de uma empresa de gestão de riscos, o coordenador de exames e certificação substituto, André Augusto Fernandes Pedro, enviou um ofício à diretoria do Inep em 19 de novembro.
Ele pede orientações (como nomeação de uma equipe de servidores e forma correta de salvar os arquivos) sobre como proceder para garantir a correta divulgação dos gabaritos oficiais do Enem, prevista para ocorrer entre 29 de novembro e 1º de dezembro:
“Considerando a etapa de validação pela empresa de gestão de riscos contratada pelo Inep, e considerando também o fim do contrato com a empresa que participou dessa etapa em anos anteriores, solicito que sejam prestadas orientações quanto ao procedimento de validação do gabarito deste ano.”
Outros ofícios com o mesmo teor, pedindo orientações, foram emitidos em 23 e 24 de novembro, “dada a aproximação da data de divulgação dos gabaritos”.
“A gente ficou receoso diante da mudança de protocolo e perguntou o que fazer, já que não teria essa empresa de gestão de risco. Era o caso de fazer uma reunião com as áreas envolvidas”, afirma um servidor que preferiu não ser identificado.
“O risco agora é de o gabarito ser divulgado com algum tipo de erro e a gente precisar correr atrás das correções, porque é um processo manual [de publicação das respostas no site do Inep].”
A resposta do Inep foi encaminhada internamente nesta quarta-feira (24), por meio de ofício assinado pelo chefe da assessoria de governança e gestão estratégica, Eduardo Nepomuceno Alencar. O texto foi visto como “ameaça” pelos servidores.
- um trecho do artigo 16 da Lei 8.112/90, que estabelece que os servidores devem “cumprir as ordens superiores, exceto quando manifestamente ilegais”;
- um excerto do artigo 17 dessa mesma Lei, que afirma que é proibido ao servidor “opor resistência injustificada ao andamento de documento e processo ou execução de serviço”.
Esse mesmo ofício diz que:
- não existe nenhuma obrigação de haver uma empresa de gestão de riscos do Enem;
- as responsabilidades são da Diretoria de Avaliação da Educação Básica (Daeb) e da Coordenação-Geral de Exames para Certificação (CGEC), inclusive a divulgação de resultados.
“Nunca vi uma resposta a um pedido de orientação com ameaças explícitas”, afirma um servidor do Inep.
A autarquia também não comentou essa acusação.
Na sexta-feira (19), funcionários do Inep reuniram em um documento uma série de denúncias de assédio moral e tentativas de interferência no Enem.
O documento de 36 páginas foi compilado pela Associação dos Servidores do Inep (Assinep) e entregue ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Controladoria-Geral da União (CGU).
O primeiro domingo de Enem, em 21 de novembro, ocorreu sem grandes problemas logísticos. Houve perguntas sobre temas sociais como erotização do corpo da mulher, racismo e saberes indígenas. Saiba mais aqui.
Em 28 de novembro, será aplicada a segunda parte da prova, com 45 questões de ciências da natureza e 45 de matemática.
O g1 transmitirá um programa ao vivo, a partir das 18h, com comentários e resoluções feitos pelos professores do Curso Anglo (SP).
Os gabaritos oficiais devem ser publicados pelo Inep, como dito nesta reportagem, até a próxima quarta-feira (1º). Você já pode conferir as resoluções extraoficiais, divulgadas pelo g1, neste link.
Ex-diretora do Inep sobre Enem: ‘Prova foi um sucesso graças à resistência dos servidores’
“Perguntamos como deveria ser sem a empresa, mas vieram com ameaça. Esse é o tipo de comportamento que assusta os servidores”, diz uma fonte do Inep que não quis ser identificada.
O risco é de o gabarito ser divulgado com algum tipo de erro e a gente correr atrás das correções. A questão que simboliza o tipo de efeito que a gente tem quando não segue os protoclos e desliga alguns processos. Não segue aquilo que huistoricamente o Enem tinha em termos de processos e sigilos de seguranças. O maior risco é um erro na divulgação do gabarito, porque é um processo manual.
essa empresa é espectatular. monitora tudo. é terceirizada, apoia o servidor do inep.
Fonte: Fonte: G1