Venda da Amil gera reclamações por redução da rede sem aviso prévio; conheça os direitos dos clientes | Economia


A esteticista Anne Cássia Paulino teve toxoplasmose durante a gravidez. Por conta da infecção, sua filha Camille, hoje com 15 anos, nasceu com autismo e deficiência intelectual.

Para garantir uma cobertura de saúde mais completa à caçula, Anne fez um plano da Amil com quarto particular — diferente do plano do resto da família e equivalente em preço ao de sua filha primogênita, dez anos mais velha que Camille.

Camille (à direita) e a mãe Anne Cássia — Foto: Arquivo pessoal

Segundo a esteticista, a adolescente foi bem atendida por quase uma década. No final do ano passado, no entanto, quando a jovem descobriu ter uma doença no intestino, os problemas começaram a aparecer.

“O médico disse que ela poderia tomar uma medicação para tratar isso [doença]. Mas, para ela tomar, precisava fazer uma bateria de exames. Foi nesse momento que entornou, porque eu descobri que não poderia agendar os exames nos laboratórios que costumava ir, porque eles estavam descredenciados”, afirmou.

Com as poucas opções de atendimento médico disponibilizadas pela operadora perto da região do Anália Franco, onde moram, Anne está com um carro emprestado para poder levar a filha às consultas médicas e aos exames.

As sessões de fisioterapia, afirmou ela, foram interrompidas, uma vez que os terapeutas que atendiam a jovem também foram descredenciados sem aviso da operadora.

“Como ela tem autismo, para ela deixar alguém encostar nela ou até chegar perto para iniciar um tratamento, demora muito”, disse a esteticista.

A filha mais nova de Anne faz parte de um grupo de 370 mil clientes da Amil que foram transferidos para a APS (Assistência Personalizada à Saúde) em dezembro do ano passado.

A Amil vendeu, em dezembro de 2021, toda a sua carteira de planos de saúde individuais dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná para a APS. Ambas as operadoras pertencem à UnitedHealth.

Segundo a ANS, a decisão de impedir que os atuais sócios da APS se retirem do quadro social da empresa, bem como proibindo que a atual controladora da Amil se retire do quadro social da Amil foi tomada “em razão da ausência de informações à reguladora sobre a suposta aquisição do controle societário da APS”.

Mas os problemas enfrentados pela filha de Anne – e as reclamações – começaram ainda antes que a carteira de planos de saúde individuais da Amil fosse vendida para a APS.

Histórico de reclamações

No primeiro semestre de 2021, foram registradas 1.181 queixas contra a operadora , contra 721 no mesmo período de 2020 e 394 em 2020. É preciso ponderar, neste caso, que em 2021 havia um alto índice de contaminação no país pela Covid-19. Veja no gráfico abaixo:

Reclamações contra Amil — Foto: g1

No segundo semestre do ano passado, com a pandemia mais controlada por conta da vacinação, 788 clientes registraram reclamações contra a Amil — um aumento 9,2% em relação ao mesmo período de 2020 (auge da pandemia da Covid-19) e de 55% em relação a 2019. Até 8 de fevereiro deste ano, já foram registradas 216 reclamações. No primeiro semestre de 2020 inteiro, foram 394 queixas. A principal reclamação dos clientes é sobre a cobertura do plano de saúde.

De acordo com a ANS, responsável por regular o setor, de 2020 a 2021 o número de queixas sobre cobertura da rede conveniada da Amil passou de 1.989 para 2.834 — uma alta de 42%. Apenas em janeiro deste ano, foram registradas 502 reclamações sobre o tema.

Na plataforma Reclame Aqui também houve um aumento de reclamações: em janeiro deste ano houve uma alta de 63,7% na quantidade de queixas em relação ao mesmo mês de 2020. Em dezembro, o aumento foi de 58,3% na comparação anual.

A funcionária pública Elaine Costa Conceição, de 36 anos, registrou sua reclamação sobre a falta de cobertura da Amil para conseguir ser atendida. Em tratamento com quimioterapia desde julho do ano passado após a retirada de um câncer de mama, ela foi surpreendida em agosto ao precisar ir ao hospital onde sempre foi atendida e ser negada por descredenciamento do convênio.

Elaine Costa Conceição e sua mãe, Laura, no hospital, em São Paulo — Foto: Arquivo Pessoal

“Reclamei porque estava fazendo tratamento por causa de um câncer, mas me falaram que o meu convênio havia sido cortado. No meu celular, no entanto, ainda constava o hospital. Ninguém havia me falado nada”, disse ela.

Depois de registrar a reclamação na internet, ela foi informada que poderia voltar ao hospital até o fim do seu tratamento. Os laboratórios perto de sua casa, em Francisco Morato, no entanto, continuaram descredenciados. Agora, ela tem de ir até Santana, a mais de 40 km de distância, para fazer seus exames.

“Graças a Deus tenho meu pai e meu tio para me levarem de carro. Realmente não posso trocar de plano de saúde porque ficaria muito caro para mim”, afirmou ela, que tem o plano há 14 anos e paga aproximadamente R$ 200 por mês.

Diante da insatisfação dos clientes e atendendo à solicitação feita pela ANS, Amil e APS apresentaram na quinta-feira (17) um plano de ação para os benefícios de planos individuais e familiares.

Entre as medidas apresentadas pela Amil estão a redução do tempo para autorização de cirurgias eletivas e a retirada temporária da exigência de autorização prévia para liberação dos exames laboratoriais.

Também foi acordado que as empresas reforçarão sua comunicação por meio de e-mail marketing e do portal da Amil e que haverá uma atualização da base de prestadores não hospitalares da APS no portal, dimensionada em aproximadamente 25 mil prestadores.

A ANS reforçou também que a transferência da carteira da Amil foi autorizada para os beneficiários de planos individuais e familiares residentes de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná. Ou seja, os clientes de outros estados e de planos coletivos não foram transferidos e permanecem na Amil.

De acordo com a Ana Carolina Navarrete, advogada e coordenadora do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), o plano de ação da ANS é tardio e revela exigências que deveriam ter sido feitas antes da autorização de venda da carteira de planos individuais da Amil.

“Como uma empresa pequena (APS) de 11 mil beneficiários compra uma carteira de 370 mil clientes da Amil desta forma?”, questiona a advogada.

Em nota, a UnitedHealth respondeu que “a Amil e a APS compartilharam com o órgão as medidas implementadas para a melhoria da experiência dos beneficiários de planos individuais transferidos, incluindo o aperfeiçoamento das plataformas de serviço e a intensificação da comunicação com os clientes”.

As empresas afirmaram também “que seus canais de atendimento estão à disposição de seus beneficiários, de modo a trazer mais tranquilidade neste processo de mudança, objetivo comum a todos”.

Direitos dos beneficiários

  • Para quem foi prejudicado pelo descredenciamento de médicos, hospitais e laboratórios, a primeira ação é realizar uma reclamação na ANS.
  • Se houver urgência no atendimento médico, Ana Carolina aconselha ajuizar uma ação judicial. Para isso, é necessário coletar todos os documentos que comprovam a negativa do tratamento e exames, se tiver.
  • Tratamentos em curso, como o de Elaine, não podem ser interrompidos. Se o consumidor tiver problemas para manter internações, quimioterapias, entre outros procimentos, deve reclamar na ANS. interrupção é considerada uma prática abusiva pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
  • Embora não seja o ideal para todos os casos, o consumidor sempre tem o direito de efetuar a portabilidade do plano. Para ter direito à portabilidade, o usuário deve estar em dia com as mensalidades e ter permanecido no plano por um período mínimo de dois anos.
  • Portabilidade de plano de saúde: saiba como fazer e conheça as regras da ANS
  • Tanto a Amil, quanto a APS têm a obrigação de informar os usuários sobre as mudanças resultantes da transferência da carteira. Se precisar de informações da rede credenciada, por exemplo, entre em contato com a central de atendimento ao usuário de uma das operadoras.

ANS:
Telefone: 0800 701-9656;
Formulário eletrônico no portal: www.gov.br/ans/pt-br
Central de atendimento para deficientes auditivos: 0800 021 2105.

Amil:
Capitais e Regiões Metropolitanas: 3004-1000
Demais localidades: 0800-706-2363
Ouvidoria: 3004-1094 (Capitais e Regiões Metropolitanas) ou 0800-721-1094 (demais cidades), de 2ª a 6ª Feira, das 8:00 às 18:00 horas.
Site: https://www.amil.com.br

Idec
Site: https://idec.org.br/
Telefone: (11) 3874-2150, de segunda à sexta-feira, das 9h às 13h e das 14h às 18h.



Fonte:G1