Site revela que bilionários se livraram do imposto de renda nos EUA; saiba o que foi divulgado | Economia


A reportagem da organização americana de jornalismo investigativo ProPublica deu vida nova às discussões sobre formas de tributação aos mais ricos nos Estados Unidos. O material publicado evidencia que o recolhimento do imposto de renda tradicional não atinge os bilionários do país da mesma forma que os profissionais assalariados.

Por meio de uma fonte anônima, a ProPublica teve acesso a um extenso banco de dados da Receita Federal americana (IRS) com 15 anos de declarações ao fisco, incluindo a dos principais bilionários do país. Na lista estão Jeff Bezos, fundador da Amazon, Elon Musk, da Tesla, Bill Gates, da Microsoft, Warren Buffett, da Berkshire Hathaway.

Como exemplo, a agência comparou o quanto cresceu a fortuna dos 25 americanos mais ricos segundo a revista Forbes com o total pago de imposto, a “taxa de imposto verdadeira”. O grupo teve aumento de US$ 401 bilhões na fortuna somada entre 2014 e 2018, mas pagou “apenas” US$ 13,6 bilhões de imposto de renda no mesmo período, o equivalente a 3,4% do ganho.

Os dados mostram, inclusive, como alguns deles não pagaram um dólar de imposto em alguns desses anos. Isso acontece porque o imposto de renda é baseado nos rendimentos dentro do período e não no patrimônio acumulado. Como os bilionários são acionistas de grandes empresas, enriquecem pela valorização das ações e só seriam tributados em caso de venda de suas participações.

A ProPublica ainda promete uma série de reportagens detalhando como cada bilionário se beneficiou da elisão fiscal para enriquecer sem ser devidamente tributado.

O que se sabe até o momento, está a seguir.

Jeff Bezos, fundador da Amazon, tem patrimônio de US$ 190 bilhões, segundo a revista Forbes — Foto: REUTERS/Joshua Roberts/File Photo

Na janela de 15 anos acessada pela ProPublica, o homem mais rico dos EUA e que disputa o topo do pódio das maiores fortunas do mundo deixou de pagar os tributos em dois anos. Em 2007 e 2011, Bezos não gastou um dólar sequer em imposto de renda.

Em 2007, inclusive, as ações da Amazon – e consequentemente, sua fortuna estimada – mais que dobrou. Segundo a agência, o salto do patrimônio público de Bezos aumentou quase US$ 4 bilhões naquele ano.

Segundo a ProPublica, Bezos chegou a declarar renda de US$ 46 milhões em 2007 em união com sua então esposa, MacKenzie Scott, mas foi capaz de compensar todos os ganhos com prejuízos em “investimentos colaterais e várias deduções, como despesas com juros sobre dívidas e ‘outras despesas'”, diz a reportagem.

Não bastasse, em 2011, Bezos apresentou uma declaração de imposto de renda em que declarava perda de dinheiro em seus investimentos. “De acordo com a lei tributária, ele ganhou tão pouco que até reivindicou e recebeu um crédito fiscal de US$ 4 mil por seus filhos“, afirma a ProPublica. Nessa época, o patrimônio do empresário era de US$ 18 bilhões.

“Sua elisão fiscal é ainda mais contundente se você examinar 2006 a 2018, período para o qual o ProPublica possui dados completos. A riqueza de Bezos aumentou em US$ 127 bilhões, de acordo com a Forbes, mas ele registrou uma receita total de US$ 6,5 bilhões. Os US$ 1,4 bilhão que ele pagou em impostos federais pessoais é um número enorme – ainda assim, equivale a uma taxa real de 1,1% sobre o aumento de sua fortuna”, diz a ProPublica.

Jeff Bezos não se manifestou sobre a reportagem.

Elon Musk, fundador da Tesla, tem patrimônio de US$ 151 bilhões, segundo a revista Forbes — Foto: Joe Skipper/Reuters

Na janela explorada pela ProPublica, chama atenção o ano de 2018, em que Musk não pagou nada em imposto de renda. A única contribuição relevante foi venda de quase US$ 1 bilhão em sua participação na Tesla.

“As contas dos impostos de Musk não refletem de forma alguma a fortuna que ele tem à sua disposição. Em 2015, ele pagou US$ 68 mil em imposto de renda federal. Em 2017, US$ 65 mil”, mostra a reportagem.

Hoje, Musk é o segundo homem mais rico dos EUA, com patrimônio de mais de US$ 151 bilhões.

No recorte de 2014 a 2018, a ProPublica faz uma relação de ganho de patrimônio de Musk e compara com o imposto pago. Enquanto o patrimônio cresceu US$ 13,9 bilhões, enquanto a renda declarada foi de US$ 1,52 bilhão. O imposto pago, portanto, foi de US$ 455 milhões, o equivalente a 3,27% da fortuna acumulada no período.

Musk chegou a responder os primeiros questionamentos da ProPublica com um “?”. Depois de mais esclarecimentos da equipe de reportagem, ignorou os demais contatos.

Warren Buffett, CEO do Berkshire Hathaway, tem fortuna estimada de US$ 108,7 bilhões, segundo a Forbes. — Foto: Rick Wilking/Reuters

O megainvestidor Warren Buffett é conhecido pelo acúmulo de participação e investimento em empresas. Pelo recorte da ProPublica, entre 2014 e 2018, foi também o bilionário que menos pagou imposto de renda comparado ao acúmulo de capital.

Buffett teve aumento de patrimônio da ordem de US$ 24,3 bilhões, mas reportou renda acumulada de US$ 125 milhões. A quantia de imposto, portanto, foi de US$ 23,7 milhões – ou 0,1% do ganho patrimonial. O investidor respondeu à ProPublica, dizendo que está em dia com os impostos devidos.

Atualmente, a firma de Buffett, a Berkshire Hathaway, é dona de empresas como a Dairy Queen, Helzberg Diamonds, Geico e Duracell, além de grandes participações na Coca-Cola, American Express e no banco digital brasileiro Nubank. Esse sistema de participação, segundo a ProPublica, é o que possibilita que Buffett “não transforme fortuna em renda”, driblando impostos.

“De 2015 a 2018, ele relatou uma receita anual variando de US$ 11,6 milhões a US$ 25 milhões. Isso pode parecer muito, mas Buffett é a sexta pessoa mais rica do mundo (…). Pelo menos 14 mil contribuintes dos EUA, em 2015, relataram renda maior do que a dele, de acordo com dados do IRS”, diz a reportagem.

O ex-prefeito de Nova York e candidato democrata Mike Bloomberg durante comício em San Antonio, Texas, no domingo (1) — Foto: Joe Raedle/Getty Images/AFP

O empresário Michael Bloomberg usa outra estratégia de elisão fiscal: o acúmulo de deduções e créditos fiscais. Segundo a ProPublica, ele declarou uma renda de US$ 1,9 bilhão em 2018, mas abateu impostos de doações filantrópicas de mais de US$ 968,3 milhões e colheu créditos de pagamentos de tributos fora dos EUA.

“O resultado final foi que ele pagou US$ 70,7 milhões em imposto de renda sobre esses quase US$ 2 bilhões em receitas. Isso equivale a apenas 3,7% da taxa de imposto de renda convencional. Entre 2014 e 2018, a Bloomberg teve uma verdadeira taxa de imposto de 1,30%”, diz o texto.

Um porta-voz da Bloomberg respondeu à agência, dizendo que Bloomberg havia defendido uma variedade de aumentos de impostos sobre os ricos enquanto pré-candidato à Presidência dos EUA nas últimas eleições. Ele perdeu a indicação dos democratas nas primárias que escolheram o atual presidente Joe Biden como nome do partido.

“Mike Bloomberg paga a alíquota máxima de imposto sobre todas as receitas tributáveis federais, estaduais, locais e internacionais conforme prescrito por lei (…). Em conjunto, o que Mike dá para caridade e paga em impostos equivale a aproximadamente 75% de sua renda anual”, diz a nota enviada à ProPublica.

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A ProPublica deu mais atenção aos quatro nomes acima, mas promete mais detalhes dos principais bilionários em futuras reportagens usando a base de dados do IRS.

Apenas citados no rol de super-ricos que deixaram de pagar imposto de renda em algum dos 15 anos em questão, estão presentes também os megainvestidores Carl Icahn e George Soros.

Icahn, que tem patrimônio de mais de US$ 15,1 bilhões, deixou de pagar ao fisco nos anos de 2016 e 2017 apesar de ter declarado mais de US$ 544 milhões de renda obtida. Segundo sua declaração, há mais de US$ 1,2 bilhão em dívida, que a reportagem infere que seja de hipoteca, por ter imóveis como garantia.

“O empréstimo oferece vários benefícios para Icahn: ele obtém grandes parcelas de dinheiro para turbinar seus retornos de investimento. Então ele consegue deduzir os juros de seus impostos”, diz a ProPublica.

Já George Soros não pagou imposto de renda em três anos, de 2016 a 2018. Segundo resposta de seu porta-voz à ProPublica, o empresário perdeu dinheiro com seus investimentos e não ficou devedor de tributos nesse intervalo. Na lista da Forbes, Soros consta com patrimônio de US$ 8,6 bilhões.

Taxa de imposto verdadeira

Para comprovar a tese de descompasso entre o imposto pago por bilionários em comparação aos demais, a agência comparou o quanto cresceu a fortuna dos 25 americanos mais ricos segundo a revista Forbes com o total pago de imposto.

O balanço da agência mostra que, de acordo com a Forbes, os 25 mais ricos tiveram aumento de US$ 401 bilhões na fortuna somada entre 2014 e 2018. O pagamento conjunto de imposto de renda foi de US$ 13,6 bilhões no mesmo período, o equivalente a 3,4% do ganho.

Segundo a ProPublica, o megainvestidor Warren Buffett é quem mais se beneficiou desse sistema. Na janela de 2014 a 2018, ele teve aumento de US$ 24,3 bilhões em patrimônio, mas reportou renda de US$ 125 milhões. A quantia de imposto, portanto, foi de US$ 23,7 milhões – ou 0,1% do ganho patrimonial.

Jeff Bezos teve 0,98% de “taxa de imposto verdadeira”, com US$ 99 bilhões de aumento patrimonial enquanto pagou US$ 973 milhões em impostos. Michael Bloomberg teve taxa de 1,3%. Elon Musk, de 3,27%.

Para mostrar como o imposto de renda pesa nos assalariados, a reportagem aponta que, pelo sistema regressivo, um casal paga uma taxa de imposto que vai de 10% sobre seus primeiros US$ 19,9 mil em renda tributável até 37% para tudo o que ganham acima de US$ 628,3 mil.

Na média, os 25 mais ricos do país pagaram uma taxa de apenas 15,8% da renda reportada nos cinco anos do levantamento.



Fonte: G1