Sistema Cantareira entra em estado de restrição; nível do reservatório já é o menor em pelo menos cinco anos | São Paulo


O Sistema Cantareira entrou em estado de restrição neste sábado (2), operando com 29,9% do volume de sua capacidade. É o menor volume registrado pelo menos desde março de 2016, quando o sistema registrou 30,2%.

O reservatório entra em faixa de restrição quando chega a um volume útil acumulado igual ou maior que 20% e menor que 30%. Para ser considerado normal, o volume do manancial tem de estar com pelo menos 60% de sua capacidade.

A falta de chuvas acelerou a chegada dessa fase. Pela previsão do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), o Cantareira atingiria o patamar de 30% de sua capacidade somente no final deste ano.

Considerado o maior reservatório de água da região metropolitana, o Cantareira abastece cerca de 7,2 milhões de pessoas por dia. Mas não é só o Cantareira que está com pouca água.

Somados, os reservatórios que abastecem a região metropolitana de São Paulo têm neste sábado (2) 37,8% de volume de água. Esse número é 21% menor do que o volume armazenado em 2013, ano que antecedeu a crise hídrica na região metropolitana de São Paulo (leia mais abaixo).

Depois da fase de alerta, a próxima é chamada de fase especial, quando o sistema tem volume útil menor que 20%. Em julho de 2014, quando houve a crise hídrica, o Sistema Cantareira chegou a zero. Abaixo dele, havia o volume morto, que não foi projetado, originalmente, para uso.

Trata-se de uma reserva com 480 bilhões de litros de água situada abaixo das comportas das represas do Cantareira. A Sabesp passou a operar bombeando água do volume morto. Até então, essa água nunca tinha sido usada para atender a população.

Para especialistas sobre o tema, a mudança de faixa é importante para a população se conscientizar de que os riscos de falta de água estão maiores, já que, na prática, isso não deve impactar no trabalho da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), pelo menos por enquanto.

De acordo com a outorga, a mudança de fase de alerta (igual ou maior que 30%) para a fase de restrição (igual ou maior que 20%) diminui a quantidade de água que a Sabesp tem permissão da Agência Nacional de Águas (ANA) para retirar do manancial.

A mudança, entretanto, só acontece se o volume igual ou menor do que 20% for registrado no último dia de cada mês. Se isso acontecer, o limite máximo de retirada do reservatório no mês seguinte passa de 27 m³/s para 23 m³/s.

A Sabesp, porém, informou que já tem retirado os 23 m³/s, o que é possível graças à integração com os demais sistemas. O Cantareira faz parte do chamado Sistema Integrado, composto ainda por outros seis mananciais: Alto Tietê, Cotia, Guarapiranga, Rio Claro, Rio Grande e São Lourenço. Esse sistema permite transferências de água entre regiões, conforme a necessidade operacional.

Porém, isso não garante que haverá água suficiente para abastecimento da população nos próximos meses. Em comparação a 2013, ano pré-crise hídrica na região metropolitana de São Paulo, a Sabesp tem retirado mais água do que entra sistema, como mostram os gráficos a seguir, feitos com dados da Sabesp e análise de Pedro Côrtes, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP):

Em azul, o quanto estava entrando de água (volume afluente) em 2013. Em vermelho, o quanto foi retirado de água (volume defluente) no mesmo ano — Foto: Reprodução

Em azul, o quanto está entrando de água (volume afluente) em 2021. Em vermelho, o quanto foi retirado de água (volume defluente) no mesmo ano — Foto: Reprodução

Os gráficos comparam quanta água entrou e saiu do Sistema Cantareira de janeiro a setembro dos anos de 2013 e 2021. Em azul é o quanto estava entrando de água (volume afluente). Em vermelho, o quanto foi retirado de água (volume defluente). Se compararmos 2013 (primeiro gráfico) com 2021 (segundo gráfico), fica claro que entra muito menos água este ano, apesar da retirada de água se manter parecida nos dois anos.

A comparação com 2013 ajuda a entender a gravidade da situação atual. Se em 2013 tínhamos mais água disponível e houve crise de abastecimento nos dois anos seguintes, a situação atual aponta para uma provável falta de água nas casas da Grande São Paulo no ano que vem, de acordo com Côrtes.

“Comparativamente, hoje temos cerca de 21% menos água armazenada do que na mesma época em 2013, ano que antecedeu a crise hídrica. Em 2020, nesta mesma época, o volume de água armazenada era 32% maior. A situação de crise hídrica já está configurada e caminhamos para uma crise de abastecimento de água”, afirma.

Em nota, a Sabesp disse que “não há risco de desabastecimento neste momento, mas a Companhia reforça a necessidade do uso consciente da água.”

“A projeção para a região metropolitana de São Paulo aponta níveis satisfatórios dos reservatórios com as perspectivas de chuvas do final da primavera e início do verão, quando a situação será reavaliada. Importante destacar que a queda no nível das represas é normal nesta época do ano devido ao período de estiagem e ao volume baixo de chuvas.” (leia a íntegra da nota abaixo)

Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema), a situação atual não surpreende, mas o governo estadual tem deixado de tomar as medidas necessárias.

“Isso já era esperado pelas previsões meteorológicas que vínhamos acompanhando. Infelizmente o governo continua negando a crise hídrica. As medidas tomadas em 2013 e 2014 deixaram a capital em uma situação mais confortável, mas até por isso o indício agora é de maior gravidade da crise. É importante que o governo e a Sabesp tomem medidas para frear isso, diminuir o consumo e evitar que a gente tenha a necessidade de um racionamento propriamente dito”, afirma.

Para Faggian, as obras que a Sabesp fez desde 2014 são o que garantem que a população ainda esteja sendo abastecida com água de qualidade, apesar do baixo volume dos mananciais.

“Isso em grande medida porque a Sabesp ainda é uma empresa pública, de economia mista, mas ainda de caráter público. Temos acompanhado e acho lamentável que em vez do governador Doria estar trabalhando para encontrar soluções para a crise hídrica, está fomentando e criando condições para privatizar a Sabesp. A situação só está contida por enquanto porque a empresa é pública. Uma empresa privada não teria tido interesse ou condições de fazer o volume de investimento necessário para essas obras. Esses valores, quando não são fundos perdidos, levam décadas para se obter retorno. Privatizar não atende à população paulista.”

O Brasil vive a pior seca dos últimos 91 anos, de acordo com o alerta de emergência hídrica emitido em maio deste ano por um conjunto de órgãos do governo federal. Na capital paulista, o volume de chuvas durante o inverno foi 56% menor do que a média histórica.

Em agosto, um técnico da Sabesp fez uma projeção de que o Sistema Cantareira chegaria a cerca de 20% de seu volume total em julho de 2022. Na ocasião, o analista de sistemas da Sabesp Emerson Martins Moreira foi desmentido pelo presidente da companhia, Benedito Braga, que disse ao g1 que o estudo não representava a visão da empresa e que obras de interligação e infraestrutura dão “tranquilidade de que não vamos ter uma crise”.

Se a seca persistir, inclusive, a projeção do analista Emerson pode se concretizar antes de 2022, de acordo com Côrtes.

“Se o nível do Cantareira continuar abaixando no mesmo ritmo, acredito que em 60 dias ele poderá ficar com 20%. Isso aconteceria no início de dezembro. Teremos alguma chuva neste início da primavera, mas a situação de estiagem volta com intensidade no verão. Para reverter a situação dos nossos reservatórios, precisaríamos de chuvas muito intensas. Porém, os prognósticos climáticos indicam que teremos chuvas abaixo da média.”

No vídeo abaixo, veja quando o governo emitiu alerta de crise hídrica para cinco estados:

Governo emite alerta para crise hídrica em cinco estados

Governo emite alerta para crise hídrica em cinco estados

A Sabesp esclarece que a situação atual não prevê alteração na operação do Sistema Cantareira. Conforme as regras da outorga, válidas exclusivamente para esse sistema, quando o nível registrado no último dia do mês for inferior a 30%, o limite máximo de retirada do reservatório no mês seguinte passa de 27 m³/s para 23 m³/s. Nesta quinta, último dia de setembro, o Cantareira atingiu 30,4%, não havendo alteração no limite máximo de retirada permitido em outubro.

A Sabesp esclarece que a retirada atual tem sido de 23 m³/s, inferior ao limite máximo, o que é possível graças à integração com os demais sistemas. O Cantareira é um dos sistemas que abastecem a RMSP, dentro de um Sistema Integrado composto ainda por outros seis mananciais: Alto Tietê, Cotia, Guarapiranga, Rio Claro, Rio Grande e São Lourenço.

Esse sistema permite transferências de água entre regiões, conforme a necessidade operacional. Nesta quinta (30/9), o Sistema Integrado opera com 38,3% da capacidade, nível similar, por exemplo, aos 40,6% de 2018, quando não houve problemas no abastecimento.

Não há risco de desabastecimento neste momento, mas a Companhia reforça a necessidade do uso consciente da água. A projeção para a RMSP aponta níveis satisfatórios dos reservatórios com as perspectivas de chuvas do final da primavera e início do verão, quando a situação será reavaliada. Importante destacar que a queda no nível das represas é normal nesta época do ano devido ao período de estiagem e ao volume baixo de chuvas.

A Sabesp vem realizando nos últimos anos ações que dão mais segurança hídrica, como a ampliação da infraestrutura, integração e transferência entre sistemas, além de campanhas para o consumo consciente. Destaque para a Interligação Jaguari-Atibainha (que traz água da bacia do Rio Paraíba do Sul para o Cantareira) e o novo Sistema São Lourenço, ambos entregues em 2018.

A capacidade de transferência de água tratada entre os diversos sistemas de abastecimento foi quadruplicada em relação ao período anterior à crise hídrica de 2014/15, passando de 3 mil litros/segundo em 2013 para 12 mil l/s em 2021. Ao mesmo tempo, a capacidade de reservação de água tratada saltou de 1,7 bilhão de litros em 2013 para 2,2 bilhões de litros em 2021.

Toks para Economizar Água:

A Sabesp está realizando mais uma campanha para engajar a população a usar a água de maneira consciente: “Toks para Economizar Água – Abriu, Usou, Fechou”. Veja o vídeo.

Para engajar a sociedade, a Sabesp também criou o hotsite, que reúne informações e dicas em torno do assunto.

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Fonte: G1