O que aprendi com a crise: humanização do atendimento | PME


A pandemia do coronavírus acelerou a digitalização das pequenas empresas. Quem não vendia on-line precisou correr para mudar seu negócio e sobreviver. Muitos que já tinham operações digitais tiveram que reestruturar sua forma de atuar para chegar mais perto dos clientes.

O G1 ouviu os donos de 4 negócios que contaram suas trajetórias neste último ano.

Entre as principais lições, estão:

  • Humanizar o negócio para ficar mais perto do cliente, mesmo que de forma on-line;
  • Treinar funcionários para vender pelo WhatsApp;
  • Aumentar o número de clientes no Instagram;
  • Trabalhar o conceito da marca e não só o produto ou serviço, criando conteúdo, independentemente das vendas;
  • Produzir eventos on-line.

O que aprendi com a crise: esta semana, o G1 publica uma série de reportagens sobre as lições aprendidas pelos pequenos empresários durante a crise – e os ensinamentos que podem ser aproveitados por outros empreendedores.

  • Segunda-feira (10/5): humanização do atendimento
  • Terça-feira (11/5): transformar conhecimento em produto
  • Quarta-feira (12/5): mudança de atuação e estrutura enxuta
  • Quinta-feira (13/5): fortalecimento de marca e conexão com o público

O casal Gabriela e Rodrigo Ribeiro morava em São Paulo quando decidiu empreender e abrir uma loja de roupas femininas em Monte Santo de Minas, em Minas Gerais.

Gabriela continuou em seu emprego no mercado varejista de moda e Rodrigo pediu demissão para começar a tocar a RGS Moda & Complemento, que abriu as portas em novembro de 2019.

Mas veio a pandemia, Gabriela foi demitida e o que era plano B virou plano A. A primeira ação deles foi dar atenção especial ao Instagram da marca.

Eles investiram em cursos e contaram com a ajuda de uma consultora do Sebrae. Com estudo, conhecimento e observação, as coisas começaram a dar certo.

“A consultora do Sebrae me mostrou que eu era a cara da loja, a pessoa que estudou moda, que veio para Monte Santo de Minas trazer um estilo diferente, com conceitos que as pessoas ainda não conheciam. Ela me provocou: ‘por que você não começa a aparecer?’”, conta Gabriela.

A empresária tomou coragem e deu as caras. Em uma cidade pequena, com cerca de 20 mil habitantes, isso significa uma grande exposição.

A partir daí, o negócio deslanchou. O número de seguidores no Instagram da empresa dobrou e as vendas aumentaram mais de 60%.

Gabriela e Rodrigo são donos de uma loja de roupas femininas e investiram no Instagram da marca para vender mais — Foto: Arquivo pessoal

“Gabriela e a nossa loja se tornaram referência na região. A cada novidade que a gente posta no Instagram, os concorrentes começam a fazer igual. Ver o comércio digital daqui se reinventar é muito legal”, afirma Rodrigo.

Eles investem em conteúdo para consolidar ainda mais a marca. Entre os posts que fazem sucesso estão dicas de moda, de como misturar as cores e montar combinações com peças que a pessoa já tem em casa.

O casal conseguiu manter o espaço físico e uma funcionária, mas as vendas on-line ainda são maioria. Eles também vendem pelo site da marca e pelo Facebook.

Para quem é da cidade, há a opção de pedir pelo WhatsApp e receber em casa uma sacola com as roupas escolhidas. Se não gostar de tudo, é só devolver.

“Eu sou dona da loja, responsável pelas redes sociais, pelo marketing, faço atendimento, compras. É muito trabalho, mas vale a pena. Acho que o segredo é se reinventar todos os dias, criar coisas novas e sair da zona de conforto”, diz Gabriela.

Atendimento personalizado por WhatsApp

Claudia Rosenthal também passou a interagir mais com seus clientes pelas redes sociais depois que a pandemia chegou. Ela comanda, junto com as irmãs Nidia e Vera Rosenthal, a Eurico, uma loja de calçados de tamanhos grandes, fundada pelos seus avós em 1938.

São duas lojas em São Paulo e o comércio eletrônico, que teve as vendas intensificadas pela pandemia.

“Nosso foco sempre foi humanizar o atendimento ao cliente, tanto no presencial quanto no virtual”, diz Claudia.

Para crescer no digital, o primeiro passo foi aparecer nas redes sociais, coisa que nunca fizeram antes: “A gente percebeu que temos que continuar trabalhando a marca como um todo. Não é só vender o sapato, é cuidar da marca”.

Claudia Rosenthal tenta se aproximar dos clientes durante o isolamento social — Foto: Arquivo pessoal

O e-commerce já existia, mas atendia principalmente clientes que moram em outras cidades. O desafio maior foi passar a atender pelo WhatsApp os clientes que frequentavam as lojas físicas e queriam o atendimento personalizado de sempre.

“Essa proximidade é muito importante, principalmente pra gente, que atende pessoas que têm o pé grande, com muitas particularidades. É um desafio oferecer esse atendimento especial pelo celular”, afirma.

A solução encontrada foi treinar os gerentes das lojas e deixar esse atendimento exclusivamente com eles. Parece simples, mas não é. É preciso saber se comunicar por mensagem, escrever corretamente, entender exatamente o que o cliente quer.

O resultado foi um aumento na base de pessoas cadastradas pelo WhatsApp, que hoje tem 44 mil clientes. Quem mora na cidade, também tem a opção de retirar por drive-thru.

Já Gladys Tchoport e Claudia Kievel não vendiam nada de forma on-line antes da pandemia. Elas tocam o projeto Jardim Secreto e desde 2013 ocupam o espaço público de São Paulo com feiras que reúnem pequenos produtores. Eles vendem seus trabalhos feitos à mão, como roupas, acessórios, velas, pinturas, cafés e comidas.

A feira cresceu e se transformou também em dois espaços físicos: uma loja, que fechou em 2020, e um galpão com mais de 130 marcas independentes, que também não resistiu à crise e acaba de fechar.

“Esse abre e fecha do comércio e o avanço da pandemia tem nos assustado muito e nos deixa desestabilizadas financeiramente. Nosso e-commerce segue no ar e queremos no futuro voltar com um espaço menor e em outra proposta”, conta Gladys.

O e-commerce que Gladys se refere foi criado do zero no início da pandemia. Elas digitalizaram o negócio no susto e, em dois meses, criaram uma loja virtual e toda a logística de entrega dos produtos das 130 marcas.

“Nosso negócio sempre foi focado no presencial, sempre falaram pra gente vender on-line, mas a gente era contra porque queríamos mesmo era encontrar as pessoas”, conta Gladys.

Passaram a vender também pelo Instagram e pelo WhatsApp, outros canais de vendas que não eram usados antes da pandemia.

Gladys e Claudia criaram o projeto Jardim Secreto e precisaram digitalizar o negócio durante a pandemia — Foto: Arquivo pessoal

Para melhorar as vendas, algumas ações foram tomadas:

  • Se aproximar ainda mais dos clientes no formato digital, melhorando o atendimento nas conversas pelo WhatsApp e Instagram;
  • Venda de kits para empresas, que passaram a fazer ações para os funcionários durante a pandemia;
  • Edições da feira Jardim Secreto em casa, em forma de lives focadas em conteúdo, rodas de conversa e oficinas.

As vendas on-line representam menos de 50% do rendimento normal da marca, mas elas continuam buscando soluções para manter a marca viva.

“A sensação que eu tenho é que eu estou sempre me afogando, com uma rede enorme de pessoas que dependem do meu negócio. Queremos muito resistir”, diz Gladys.

Flávia Durante também organiza feiras de pequenos produtores em São Paulo. O negócio dela, a Pop Plus, é um evento de moda e cultura plus size, que acontece desde 2012.

O evento reúne dezenas de pequenas e médias marcas que produzem moda para quem veste acima do manequim 46 e chega a receber até 12 mil pessoas por edição. Um negócio totalmente inviável durante uma pandemia.

Produzir conteúdo para divulgar as marcas parceiras foi a primeira solução, mas o retorno financeiro não foi viável, porque as marcas não conseguiam investir em marketing.

Por questões de saúde, a empresária se afastou do negócio por alguns meses. Só em dezembro de 2020 voltou a promover feiras virtuais pelo Facebook.

“Foi pequeno, com poucas marcas, mas foi muito legal. Fiz uma edição virtual da feira, com vendas e também aulas de dança, de yoga, e um show. Começou a dar resultado e passei a fazer mensalmente”, conta.

Em março, a marca foi contemplada pela lei Aldir Blanc, criada em agosto de 2020 para ajudar profissionais do setor cultural durante a pandemia da Covid-19.

Com isso, Flavia conseguiu organizar um festival grande no início de abril, com três dias de programação. Ela reuniu 13 artistas, entre música e performances, nove marcas autorais de roupa plus size e três debates com temas que fazem parte do universo das pessoas gordas. Foram quase 40 horas de programação gratuita.

Agora, a empresária tenta entrar em novos editais, inclusive os privados, para continuar a fazer eventos virtuais.

Flávia Durante em uma de suas feiras de moda plus size, quando elas ainda eram presenciais — Foto: Arquivo pessoal

“Eu sei que ninguém aguenta mais falar em live, mas acho que se a gente chegar num formato legal e divertido dá para continuar”, afirma.

O ponto positivo é que a abrangência da feira aumentou no mundo digital: “Antes, o nosso público era restrito a São Paulo, agora a gente consegue expandir a clientela virtualmente”.

Flávia também acaba lançar um novo produto, uma plataforma que reúne marcas plus size e funciona como uma vitrine de tendências.



Fonte: G1