O que aprendi com a crise: fortalecimento de marca e conexão com o público | PME


Em uma crise tão grande como a causada pela pandemia do coronavírus, pequenos negócios estão lutando para sobreviver. Mas há também aqueles que estão aproveitando o fluxo de caixa que tinham guardado para investir no fortalecimento da marca e na conexão com seu público.

O G1 ouviu a história de dois negócios, um bar em Salvador e um café em São Paulo, que focaram na relação com a comunidade e com os clientes durante esse período de crise.

Entre os aprendizados, estão:

  • A importância de criar uma relação próxima com os clientes;
  • Investimento na comunidade ao redor do negócio;
  • Fortalecimento da marca com criação de conteúdo digital;
  • Reserva de dinheiro para poder investir em outros formatos em momentos de crise.

O que aprendi com a crise: esta semana, o G1 publica uma série de reportagens sobre as lições aprendidas pelos pequenos empresários durante a crise – e os ensinamentos que podem ser aproveitados por outros empreendedores.

Tempo para consolidar a marca

Ivan Dominguez e Bruno Boscolo são donos do bar Gin, em Salvador, e conseguiram se manter durante a crise, mesmo com as portas fechadas por sete meses. Nesse tempo, focaram em criar conteúdo on-line, se aproximar da comunidade e consolidar a imagem do negócio.

Investir em delivery não foi opção, já que eles só oferecem bebidas e acharam que não valeria a pena financeiramente esse tipo de operação.

Mas como foi possível se manter por tanto tempo de portas fechadas? O motivo principal é a reserva de caixa da empresa. Além disso, o bar tem um custo fixo baixo: o espaço é pequeno, o aluguel é barato e teve o valor renegociado, e eles têm apenas dois funcionários fixos – que foram mantidos por todo esse tempo.

A principal lição que eu tirei dessa crise é a importância de ter reserva de dinheiro. Ninguém esperava que íamos ter uma pandemia. Conseguiu se manter quem tinha uma segurança financeira”, diz Ivan.

Investindo em conteúdo, Ivan e Bruno criaram um programa para contar a história de pessoas notáveis do Rio Vermelho, bairro em que o bar está. Eles ouviram moradores, outros empreendedores e agitadores culturais.

Os vídeos foram feitos em parceria com as donas de outro negócio local, o The Finds, uma loja de roupas femininas, e foram publicados no Youtube e no Instagram.

“A gente teve um retorno muito bom. A ideia era se fortalecer como marca e se apropriar do bairro que estamos. Isso é bom pra nossa marca e pro nosso bairro, pra atrair mais gente pra cá”, conta Ivan.

Ivan Dominguez é dono do bar Gin, em Salvador, e apostou em consolidar a imagem do seu negócio durante a pandemia — Foto: Arquivo pessoal

O bar voltou a abrir as portas só em outubro, com muitas restrições e mudanças. O DJ que tocava nas madrugadas, por exemplo, parou de tocar. O movimento foi bom, mas nada comparado a antes da pandemia, e o faturamento não chegou a 20% do que era antes. Dá para pagar as contas e só.

Ajudar a comunidade também foi prioridade para os empresários. Quando tudo fechou, em março de 2020, eles juntaram toda a cerveja que tinham em estoque – para o bar e para um evento que iriam produzir – e trocaram por alimentos, que foram doados aos trabalhadores do setor de eventos.

O poder da comunidade ficou evidente: 20 toneladas de alimentos foram arrecadadas.

“O pessoal de eventos passou muita necessidade, a maioria está fazendo outras coisas, é muito triste ver essa situação”, conta Ivan.

Atualmente, o bar está aberto, em horário reduzido e seguindo os protocolos para a prevenção da Covid-19.

A importância da comunidade

Em 2014, Camila Romano e Paulo Filho montaram o King Of The Fork, uma cafeteria dedicada a cafés especiais e à cultura do ciclismo, em São Paulo.

A forma como estão lidando com todas as transformações e dificuldades trazidas pela pandemia diz muito sobre o conceito do negócio e à importância que dão à comunidade.

“Nosso negócio nunca foi sobre o produto. A parte do café e da comida é um meio pra gente sustentar o estilo de vida que acreditamos. Sempre foi sobre a experiência, o encontro, a comunidade. São coisas que você não consegue passar pelo delivery”, diz Paulo.

Como os cafés não “viajam bem” até a casa dos clientes e também por serem contra os aplicativos de entrega, que cobram altas taxas e pagam pouco aos motoboys, a solução para os meses que ficaram fechados foi entregar cestas com pães e quitutes, uma vez por semana. Tudo entregue por bike e com todo o valor do frete revertido para o entregador.

Outra ação foi a venda de vouchers para serem consumidos na reabertura. “Quando a gente abriu, muitos clientes preferiram não usar o voucher, porque sabiam que as coisas ainda estavam difíceis pra gente”, conta Camila.

Camila Romano e Paulo Filho, donos do café King of The Fork, contam com a ajuda da comunidade para sobreviver em tempos de crise — Foto: Arquivo pessoal

Muitas outras manifestações de apoio surgiram durante o último ano. Teve cliente mandando email para saber como ajudar, querendo comprar o que mais dá lucro, teve até ajuda de um fotógrafo profissional que estava passando pelo local e se ofereceu para fotografar os produtos para divulgação.

Essa história eles contaram no Instagram da marca, que aliás é usado para manter o contato próximo durante esse período tão difícil. No post, eles dizem que essa ação representa “a comunidade, um dos bens mais valiosos para quem vive numa cidade como a nossa, porque ela é valiosa para os dois lados, ela fortalece nossa noção de ter algo em comum, nossa empatia, nosso sentimento de pertencimento”.

Camila conta que essa humanização no Instagram, essa troca de experiências, faz as pessoas se relacionarem e quererem ajudar mais.

“A gente tem sorte de já estar funcionando há alguns anos e ter essas pessoas que nos apoiam e que são engajadas na nossa rede. Mesmo fechados, por um tempo, pelo menos, a gente consegue viver da memória e das experiências que já causamos nas pessoas”, diz Camila.

Assim como no bar em Salvador, além de todo esse apoio da comunidade, um fator muito importante para o negócio conseguir se manter vivo durante a crise foi ter reserva de dinheiro.

Essas ações representam um valor muito menor no lucro da empresa. Nos momentos em que estiveram fechados, por exemplo, o faturamento da semana era menor do que eles ganhavam apenas em um sábado antes da pandemia. Mesmo abertos, não conseguem chegar ao ganho normal de antes.

“A maior lição dessa crise é criar uma relação forte com nossos clientes e, de forma prática, trabalhar com reserva financeira e com um fluxo de caixa”, afirma Paulo.

Eles também ressaltam uma mudança de comportamento do consumidor durante a pandemia.

“Muitos se tornaram mais conscientes da forma como gastam seu dinheiro e entenderam ainda mais a importância de comprar do pequeno negócio. Esse é um poder que está na nossa mão”, diz Camila.



Fonte: G1