El Niño reduz chuvas no Cerrado e impacta produtividade da soja, aponta pesquisa


Pesquisadores da Embrapa identificaram e quantificaram, pela primeira vez, como o El Niño – que aquece a superfície do mar no Oceano Pacífico – reduz o volume de chuvas e, impacta a produtividade da soja em uma região do Cerrado brasileiro. O fenômeno climático El Niño atuou no Brasil pela última vez entre julho de 2020 a fevereiro de 2023.

A influência do fenômeno El Niño Oscilação Sul (ENOS) sobre o clima no Brasil, incluem condições de seca no Norte e no Nordeste e fortes chuvas no Sul. No Centro-Oeste do Brasil, que é completamente Cerrado, o clima fica caracterizado pela falta de chuva e altas temperaturas.

Impactos do El Niño na produtividade de soja safra 2023/2024

Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), no 12º e último Levantamento da Safra de Grãos 2023/2024, divulgado em setembro, o volume colhido de soja no ciclo foi estimado em 147,38 milhões de toneladas, redução de 7,23 milhões de toneladas ou quase 5% em relação ao período 2022/2023.

A queda aconteceu principalmente pelo atraso do início das chuvas, às baixas precipitações e às altas temperaturas nas áreas semeadas entre setembro e novembro, nas Regiões Centro-Oeste, Sudeste e na região do Matopiba, situações que causaram replantios e perdas de produtividade.

Pesquisa

Sistema mostrou que chuva foi 40% menor em anos de El Niño do que em anos de La Niña durante desenvolvimento da soja. Sistema mostrou que chuva foi 40% menor em anos de El Niño do que em anos de La Niña durante desenvolvimento da soja.
Sistema mostrou que chuva foi 40% menor em anos de El Niño do que em anos de La Niña durante desenvolvimento da soja. Foto: Fernando Macena

Os pesquisadores Alfredo Luiz, da Embrapa Meio Ambiente (SP), e Fernando Macena, da Embrapa Cerrados (DF), encontraram uma relação entre os anos de El Niño com a redução na precipitação acumulada nos meses de outubro, novembro e dezembro, na região de Planaltina, no Distrito Federal.

Os pesquisadores – que publicaram o trabalho na Revista Agrometeoros – analisaram registros da série histórica de 1974 a 2022, com observações diárias na estação meteorológica localizada na área experimental da Embrapa no DF.

“Foi impressionante constatar que a mudança na temperatura da superfície de um oceano distante milhares de quilômetros do Planalto Central brasileiro altera de forma tão impactante a chuva nessa região”, diz Luiz, ao comentar que os resultados mostram uma média nos anos de El Niño (372 mm) 40% inferior à média dos anos de La Niña (623 mm).

Como o estudo foi feito

Os cientistas utilizaram os valores mensais do Indicador Oceânico Niño (ION), um índice fornecido pela Agência Espacial Norte-americana (Nasa), desde 1950, que traz uma média da temperatura da superfície do mar no Oceano Pacífico. Eles consideraram os 12 valores de ION de cada ano, desde 1974 até 2022 (período com dados disponíveis da estação meteorológica da Embrapa), para classificar os anos em cinco grupos.

O grupo em que os valores mensais do ION foram maiores que +0,5 °C foi considerado como de anos de El Niño. Já o grupo em que predominaram variações menores que -0,5 °C foi anos de La Niña. Grupos sem predominância dos valores maiores ou menores acima ou com uma mistura deles foram chamados de: Fim de El Niño; Neutro; e Início de La Niña.

A partir disso, foi calculada a média da quantidade de chuva acumulada nos meses de outubro, novembro e dezembro, principal período do ciclo vegetativo da soja na região.

Os pesquisadores usaram um simulador de desenvolvimento de plantas, chamado STICS, alimentado com dados de clima, solo e planta, considerando o plantio de duas variedades de soja, das lavouras da Embrapa Cerrados. Os dados de solo e das plantas são os mesmos, mas para os dados de clima foram utilizados os valores de chuva, temperatura e radiação solar observados diariamente para cada ano, de 1974 até 2022.

Resultados

A produtividade da soja foi muito inferior no grupo de anos de El Niño em comparação com os demais grupos, diferença que foi ainda mais evidente quando o plantio simulado se deu nos meses de setembro e outubro.

No pior caso, quando semeada no início de setembro, a cultivar de soja BRS 8383IPRO produziu, em média, 2.418 kg por hectare nos anos de La Niña e apenas 493 kg por hectare nos anos de El Niño, diferença que diminuiu muito quando a semeadura simulada nos meses de novembro e dezembro.

“O estudo comprovou que os efeitos das fases do ENOS variaram de acordo com a data de semeadura na região de Planaltina, quando as fases do El Niño tiveram impacto negativo na produtividade da soja nas primeiras datas de semeadura e resultados opostos foram encontrados para anos de La Niña”, destaca Macena.

Sistemas de antecipação da previsão do tempo

Sistema de alerta precoce com ações antecipadas podem ajudar a reduzir perdas e otimizar ganhos. Foto: Fernando MacenaSistema de alerta precoce com ações antecipadas podem ajudar a reduzir perdas e otimizar ganhos. Foto: Fernando Macena
Sistema de alerta precoce com ações antecipadas podem ajudar a reduzir perdas e otimizar ganhos.

Para os pesquisadores, sistemas de alerta e ações antecipadas podem ajudar a reduzir os impactos negativos do clima extremo, causado pelo El Niño ou ainda aproveitar os benefícios de condições favoráveis.

Os pesquisadores agora irão identificar períodos-chave, anteriores ao plantio da soja, que são relacionados com a produtividade da cultura, para que seja possível prever maior probabilidade de aumento ou redução da chuva durante a fase crítica do ciclo da cultura.

Além disso, a ferramenta pode auxiliar os produtores a planejarem alternativas de manejo, data de plantio, mudança de cultura ou ciclo de cultivar para reduzir os prejuízos com possíveis efeitos adversos ou obter vantagem quando as condições climáticas mais favoráveis.



Portal Agro2